Dois cristãos em rota de colisão

Dois cristãos em rota de colisão

Dois cristãos da Educação em rota de colisão!

Quando achamos que estamos voltando para 1964, descobrimos que estamos voltando para o século XIV!!!

Pode ser uma imagem de 2 pessoas e texto que diz "Reverendo Milton Ribeiro, Ministro da Educação e Bispo Jan Amos Comenius, Pai da Didática moderna, dois cristãos em rota de colisão"

Texto de João Saldanha Filho:

"Dois cristãos da Educação em rota de colisão!

Dois cristãos com muitos pontos em comuns, separados por quase 400 anos, estão em rota de colisão com suas teses sobre quem deve receber educação, de qual qualidade e até qual nível. Uma discussão que já deveria ter sido superada, frente a óbvia constatação de que é obrigação do Estado levar educação de qualidade a todos.

De um lado está Jan Amos Komenský, ou simplesmente Comenius, bispo moraviano, cientista da educação e escritor, nascido em 1592 no lugar em que é hoje a Tchecoslováquia; e do outro lado está o reverendo Milton Ribeiro, Ministro da Educação do Brasil no século 21.

A diferença básica entre eles está no compromisso com a educação e os valores do reino de Deus, ambos leram a mesma bíblia, mas decidiram seguir lições diametralmente opostas.

Comenius, lá no século 17, leu, se inspirou e escreveu que a educação deve ser inclusiva e para todos, inclusive para mulheres e pessoas com deficiências, excluídas da educação desde a antiguidade.

Essas ideias ainda desafiadoras deram ao bispo o título de Pai da Didática Moderna e, tirando alguns poucos conceitos sobre infância, seus ensinos e teses se mantêm inalterados, respeitados e buscados por educadores do mundo todo. Comenius é tão atual que um grande amigo, em seu TCC, na sua formação em Pedagogia, usou o livro “A Didática Magna” como referencial teórico para tratar sobre bullying, um comportamento infanto- juvenil de violência que somente começou a ser estudado a partir dos anos 80, ele recebeu nota máxima e a admiração dos professores da banca por escolher Comenius. Talvez para eles um autor do século 17 não teria o que ensinar sobre um assunto contemporâneo, entretanto, mostrou que Comenius continua atual.

Na contra mão dessa modernidade secular de Comenius, discípulo do pré reformador Jan Huss, queimado pela igreja católica em 1415, o atual Ministro da Educação do Brasil, pastor presbiteriano, o "terrivelmente evangélico" Milton Ribeiro, primeiro desdenha da profissão que forma todas as outras profissões, o professor.

Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, recentemente, o ministro pastor disse: "Hoje, ser professor é ter quase uma declaração de que a pessoa não conseguiu fazer outra coisa". Ou seja, são pessoas que fracassaram! Em seguida, percebendo a "gafe", tentou consertar: "É preciso a gente olhar com carinho maior para os professores".

Enquanto Milton Ribeiro desdenha da vocação quase - sacerdotal - de ensinar, ignorando completamente que os fundamentos de uma nação está no investimento na educação do seu povo, na valorização dos professores, Comenius percorria as aldeias da Moravia formando professores e incentivando a abertura de escolas inclusivas dizendo: “As escolas, fazendo que os homens se tornem verdadeiramente humanos, são sem dúvida as oficinas da humanidade.“

Não bastasse essa falta de empatia com a classe, Milton Ribeiro defende duas teses ultrapassadas, antibíblicas, anticiência pedagógica e absolutamente fascistas.

A saber: "Alunos com deficiência atrapalham os demais" e que "Universidade deveria ser para poucos".

O que fazemos com as crianças com deficiência? Matamos como fez Hitler, ou escondemos em casa como se fazia até bem pouco tempo?

Existe alguma coisa mais anticristã, antibíblica e cruel, sob todos os pontos de vista que essa discriminação defendida pelo ministro ou o certo mesmo é condenar pobres a serem eternamente cidadãos de segunda categoria e trabalhadores de segunda classe negando lhes o direito a formação universitária?

Essas duas teses do reverendo "terrivelmente evangélico" tem alguma base no amor que todo cristão deve expressar ao mundo, ou no compromisso que um ministro de Estado deve ter com a educação inclusão de deficientes e pobres à educação do país?

Como pode dois cristãos lêem a mesma bíblia, um no século 17 e tornar-se referência em Pedagogia no mundo todo, o outro no século atual, com todos os avanços das ciências humanas defender teses pedagógicas esdrúxulas, ultrapassadas, discriminatórias, inumanas e ser candidato à lata do lixo da história?

Comenius lutou para tirar as verdades impostas pelo ensino medieval, acreditava que todos poderiam vir a enxergar a harmonia do universo sob o caos aparente, serem cidadãos íntegros; queria mudar a escola com uma didática com base em conceitos cristãos e a sociedade com a educação, defendia que a educação e o evangelho preparavam o cidadão para o reino do céu.

Num contra ponto, em pleno século 21, o ministro pastor está fazendo exatamente o contrário, luta para levar o ensino de volta a era medieval e o evangelho às trevas da inquisição.

Sob o seu comando no Ministério da Educação, este ano o ENEM terá o menor número de participantes da história do concurso e mais de 89 mil jovens pobres não vão participar o por não terem dinheiro para pagar o valor da inscrição.

Como a igreja evangélica terá respeito no meio acadêmico contemporâneo e na sociedade, quando o ministro da pasta mais importante do governo para a transformação da sociedade defende ideias refutadas por outro cristão a quase 400 anos e ainda se põe contra a inclusão de alunos com deficiências e universidade para todos?

É sobre isto minha indignação e não com direta ou esquerda, é sobre sermos a diferença construtiva no, sermos referencia na educação ou em qualquer segmento da sociedade.

Lamentavelmente o referencial da igreja no Brasil, no que se refere ao seu papel político na sociedade não tem sido a bíblia, nem mesmo Comenius. A bancada evangélica é tudo menos evangélica, o ministro da educação é tudo menos um educador comprometido com a ciência, a educação e a justiça, pois todos somos iguais perante a lei; e os valores do reino de Deus, dado que é essencialmente inclusivo.

Em Cristo não há acepção de pessoas e diferença alguma entre gênero, raça, etnia, cor da pele, condição econômica, intelectual, social física e outras.

No dia em que Comenius for um referencial para os cristãos como pedagogo e a educação da sociedade for uma prioridade à igreja no Brasil como foi aos primeiros missionários que aqui chegaram e fundaram escolas com Colégio Batista, Mackenzie muitas e outras com a mesma excelência; seremos novamente sal da terra, luz do mundo, relevantes à educação e mudaremos o mundo.

Educação é a melhor ferramenta da graça para transformar o mundo com as verdades e a justiça do reino de Deus.

O Ministro Milton Ribeiro se esqueceu do maravilhoso legado do Mackenzie para e educação no Brasil e que a primeira universidade do mundo também é fruto do compromisso do cristianismo com a educação na história da humanidade!

O bispo Comenius combateu o sistema medieval, defendeu o ensino de "tudo para todos" e foi o primeiro teórico a respeitar a inteligência e os sentimentos da criança; e o que defende o pastor "terrivelmente evangélico" Milton Ribeiro?

Não há frase melhor para encerrar essa breve reflexão que está de Comenius “Não somente os filhos dos ricos ou dos poderosos, mas todos meninos e meninas, nobres ou ignóbeis, ricos ou pobres, em todas as cidades, vilas e aldeias, devem ser enviados para a escola”.

Fontes: O Estado de São Paulo 28/set/2020 – Folha de S.Paulo 19/Ago/2021




ONLINE
73