EAD e seu ABCD

EAD e seu ABCD

Educação a Distância e seu ABCD 

Por Marcos Kammer Publicado em 7 de janeiro de 2022

 

É de conhecimento quase geral no meio acadêmico que a precariedade do trabalho docente no ensino superior privado acomete o fazer docente no ensino a distância.

Para quem exerce a profissão, para quem a entende ainda como profere, não em seu sentido religioso,

Em seus passos, uma programação de um roteiro com pequenos vídeos, um material didático a ser seguido, alguns destaques que sintetizam os tópicos, algumas chamadas para reforço ou curiosidades relacionadas ao tema, talvez um questionário ou pequenos exercícios autômatos que supostamente fixem as questões abordadas. Aula concluída.

Siga-se a trilha, siga-se o baile, o caminho predefinido do conhecimento

Talvez, no meio do caminho, o aluno encontre um Fórum que debata aquela suposta produção do conhecimento.

Encontre, ainda, uma prática, um encontro que já foi presencial, para uma produção prática, “transversal”, em que os alunos experimentem os conteúdos, em um cotidiano qualquer, aquela especificidade teórico-prática do que é o processo de uma graduação. Assim mesmo, graduação sem catarse.

Não é incomum que esses encontros sejam tudo que o aluno possa ter porque, a princípio, ele não é feito para rever ou significar o estudo teórico. Ele é o que chamam a dimensão integradora daqueles módulos de ensino na “prática”.

Se não é esse o modelo que todas instituições seguem, ela é quase um padrão na EaD, o padrão que o mercado vende.

Sem sair de casa, o tempo virtual auto administrado é o tempo da organização possível e autônoma do aluno, pressuposto insidioso de que o jovem já opera, com a familiaridade que o celular lhe permite ter na palma da mão o mundo à sua volta.

O fato é que este processo implantado aos poucos, devagarinho e desavergonhado, forma quase tudo hoje, ou assim o pretende.

Fora os médicos e talvez por pouco tempo, o resto parece ser periférico, professores em suas mais variadas áreas (nossa, professores! Quem diria?), engenharias, psicologias e humanidades diversas.

As mais diversas áreas do conhecimento podem, em suas supostas trilhas, ser compartimentalizadas em etapas de produção de conteúdo, em design, em padronizações de linguagem, em didáticas de concisão, em tutorias de operação e consultorias pragmáticas de dúvidas frequentes.

Enfim, o todo daquele profere se esfacelou em suas partes, que são geridas muito mais em função de um modelo de apresentação do que propriamente uma metodologia.

O conto da simples inovação

Certamente, uma resposta a essa sujeição não se basta naquela síntese que sucede todo simples tópico da boa trilha de EaD.

Tampouco seja suficiente um resumo ou um estudo dirigido como operava a antiga positividade da velha escola behaviorista oriunda da positividade clássica.

Embora ali pagassem melhor seu trabalho e quem o produziu não tenha embarcado assim, tão rapidinho, no conto da simples inovação nem do empreendedorismo banal, esses que o produziram consagraram seus mestres como referência intelectual e empreenderam outros comandos e estratégias para vencer suas guerras.

Do lado de cá, isso, certamente, é bobagem para quem precise apenas formar mão de obra barata e sujeição na ordem da divisão do trabalho.
Afinal, os filhos de parte de nossas elites podem viajar até os inventores da Escola Nova e se descolar de quem é apenas periférico da tecnologia e do conhecimento.

Disso tudo, não é absurdo dizer que o Consenso de Washington nestas bandas continua firme.

Estruturalmente, a ciência transformada em ideologia convenceu quase todos que a literalidade das palavras continua fundamentalista, como os fundamentalistas bíblicos.

Agora, em outro mantra, a do conhecimento como algo pronto e acabado que podemos reduzir a repetição de palavras mortas, de ritos e mitos, atrasadas como aquele da produção fordista e seus impérios da imposição e da separação do trabalho intelectual versus o trabalho manual. É assim, genericamente, que nosso EaD se apresenta.

Trabalho da palavra? Conotação e simbolismo da linguagem?

Que aberração! Faça apenas o rito! Rito de mercado. Não é à toa que seu valor é tão minguado quanto o conhecimento dado. Nessa redução, o trabalho pode agora ser-lhe expropriado intelectualmente.

E, sendo essa a lógica, aquilo que a escuridão produz também a impõe sobre o ex-professor. Vai-se a primeira lei da dialética negada agora pelo positivismo de uma ordem sem progresso.

Ou seja, professor sucumbido à segunda dimensão do trabalho alienado em plena instituição da universidade. Será que foi mesmo isso que fizemos?

 

Marcos Kammer é professor do Instituto Superior de Formação Humanística da Universidade Católica de Pelotas (UCPel)

 

https://www.extraclasse.org.br/opiniao/2022/01/educacao-a-distancia-e-seu-abcd/ 




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