EAD para alunos com necessidades especiais
Alunos com necessidades especiais no ensino a distância: quais as melhores práticas?
A mudança do ensino presencial para o ensino a distância (EAD) vem se mostrando um desafio enorme para gestores, professores e pais de alunos neste momento de isolamento social. Além daqueles de ordem pessoal, enfrentam também desafios de natureza financeira, administrativa e, claro, inúmeros outros relacionados ao setor educacional.
Como será que as famílias com crianças e jovens com necessidades especiais estão fazendo a migração para o EAD?
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O exemplo do Colégio Kinder Kampus
Fernanda Nyari, diretora da escola bilíngue paulista Kinder Kampus School, conta que a escola já faz há bastante tempo um trabalho importante com alunos de inclusão. O colégio tem 280 alunos, sendo cerca de 20 com necessidades especiais. Para ela, o grande diferencial da Kinder Kampus é a parceria da escola com a equipe multidisciplinar que atende as crianças, inclusive neste momento de isolamento social:
“Nós temos uma conexão muito grande com psicólogas, psicopedagogas, neurologistas, fonoaudiólogas, e temos profissionais que atuam dentro da escola, os atendentes terapêuticos (ATs), que são pessoas contratadas pelas famílias para observar seus filhos dentro da escola e atuar com eles. Esse triângulo – escola, equipe multidisciplinar e família – é fundamental para um bom resultado do trabalho com crianças com necessidades especiais.”
Fernanda conta que, neste período de isolamento social, a escola continua em contato com todos esses profissionais e que muitos deles estão atendendo remotamente. Algumas fonoaudiólogas fazem atendimento residencial, com todos os protocolos de segurança.
“Uma grande diferença do trabalho presencial no dia a dia é que nós posicionamos fisicamente o aluno na sala de aula de forma que ele tenha o melhor aproveitamento possível. Agora estão todos no ambiente virtual e, para contornar isso, a gente faz atendimentos individuais remotos. É a maneira de dar conta das necessidades especiais de cada um. Nosso olhar é muito particular. Existem as aulas em grupo, mas sempre que há necessidade a gente faz o individual, e isso vale também para alunos sem diagnósticos especiais, mas que podem estar tendo dificuldades acadêmicas ou emocionais”, diz Fernanda Nyari.
Escola Nova e experiências com alunos do espectro autista na quarentena
A Escola Nova, localizada na zona sul do Rio de Janeiro, tem 44 alunos em situação de inclusão em suas duas unidades de ensino. Durante a quarentena, a escola vem buscando dar continuidade ao plano educacional individualizado, respeitando as possibilidades de cada aluno e de cada família.
“Nosso intuito foi ajustar, de forma personalizada, a estratégia on-line mais adequada para cada contexto familiar. Como acreditamos na parceira escola, família e equipe multidisciplinar, em muitos casos o ajuste fino foi feito em equipe”, diz Marcela Mourão, coordenadora de inclusão da Escola Nova.
Segundo Marcela, a escola procura incentivar – com a maioria dos alunos – o acompanhamento integral ou parcial das aulas on-line com o resto da turma. A coordenadora diz que, quando necessário, os exercícios, o material e as avaliações são adequados.
Quando aulas fora do script se mostram transformadoras na quarentena
A advogada Ana Luiza Flexa Ribeiro tem um filho autista de 18 anos, no segundo grau da Escola Nova. Ela conta que o trabalho multidisciplinar vem se mostrando essencial no aprendizado do Dudu.
“O mundo mudou muito desde que o Dudu era pequeno. Quando ele tinha 3 anos, as terapeutas trabalhavam todas individualmente, sem unidade de comunicação e linha de pensamento e trabalho. Hoje, ele tem o acompanhamento de 3 terapeutas: psicopedagoga, terapeuta educacional, que trabalha a parte sensorial, e fonoaudióloga. As 3 trabalham juntas e também com a escola. As terapeutas, a coordenação de inclusão e o coordenador do segundo ano da Escola Nova montam o currículo dele, antes de começar o ano. Agora eles montaram um novo esquema para o EAD, também de forma interdisciplinar”, explica Ana Luiza.
Dentro do esquema combinado, a família recebe os trabalhos por e–mail, os pais imprimem e a monitora estuda com o aluno via Facetime. São duas aulas por dia.
A advogada conta que entre as atividades desenvolvidas pela equipe estão aulas de culinária: “O Dudu está adorando. Ele tem algumas questões alimentares e com isso está ampliando o paladar, provando alimentos que não comia”, completa.
A quarentena como grande aliada no estudo
A carioca Christie Bulhões Pedreira tem 2 filhos, de 12 e 8 anos. Joaquim, o mais velho, está no Espectro Autista Leve e estuda também na Escola Nova.
“A gente vive há muitos anos neste mundo das adaptações e a experiência com o Joaquim na quarentena está sendo bem positiva. Eu sei que não retrata a realidade da maioria das crianças, mas ele está lidando muito bem com isso, até progredindo mais. Um dos motivos é a distância de toda a distração externa, que tira muito a atenção dele”, diz Christie.
Joaquim tem uma mediadora que fica na sala de aula com ele e agora faz todo o acompanhamento on-line com ele pela plataforma Zoom. A mediadora também tem todos os acessos dele dentro do Google Classroom, por onde o aluno vem estudando na parte da manhã. Christie ajuda nas atividades e diz que a autonomia do filho melhorou na quarentena com as aulas por computador:
“Essa rotina foi muito boa para ele, que está mais calmo. É como se o mundo todo estivesse parado e a gente estivesse avançando em algumas questões. Ele também está se sentindo seguro em casa, com a pandemia; a volta as aulas pode ser até mais complicada do que o ensino a distância.”
A escola coloca as provas disponíveis durante 24 horas para que o aluno responda as questões, que podem ser feitas com consultas. No caso do Joaquim, algumas são adaptadas. “Ele está em dia com todo o material e recentemente tirou uma nota 10, que o deixou super feliz“, diz Christie.
Outro exemplo de sucesso, segundo a coordenadora Marcela, é de um aluno do segundo ano do Ensino Médio, diagnosticado também com TEA (Transtorno do Espectro Autista), com um grande desafio de socialização.
“Na semana passada nos deparamos com uma cena inusitada. Ele conseguiu apresentar um trabalho em grupo pela primeira vez na sua vida, perante toda a turma. Pelo seu relato, isso só foi possível porque a apresentação era on-line. Assim, ele se sentiu menos exposto e conseguiu ultrapassar barreiras que antes seriam impossíveis de se imaginar. Isso nos mostra que, para alguns, a quarentena está dando bons frutos!”, finaliza Marcela.