Evasão escolar: déficit educativo
Evasão escolar: Brasil pode levar três anos para recuperar déficit no processo educativo
Pesquisa aponta que 4 milhões de estudantes abandonaram a escola em 2020. Falta de planejamento do ensino remoto e aprovação automática podem aumentar as chance de abandono, advertem especialistas
Publicado 18/02/2021 - Marcelo Camargo/EBC
São Paulo – O ano de 2020, marcado pela pandemia de covid-19, escancarou a desigualdade social no Brasil e trouxe à tona outra questão: a enorme defasagem em todos os níveis de educação. O problema é antigo, mas se agravou durante o ano passado, principalmente por conta da evasão escolar. Uma pesquisa encomendada pelo banco digital C6 Bank, realizada pelo Instituto Datafolha, aponta que cerca de 4 milhões de estudantes brasileiros, com idade entre 6 e 34 anos, abandonaram os estudos em 2020, o que representa uma taxa de 8,4% de evasão escolar.
Ainda segundo o levantamento, os estudantes de classes sociais mais baixas também lideraram os índices de abandono. A taxa foi 54% maior entre os alunos das classes D e E.
Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Manoel Gomes Filho, avalia que esses números mostram, contudo, “que a qualidade inadequada de ensino, que era ofertada nas escolas públicas do país por falta de investimentos” não é suficiente para justificar o alto índice de abandono. De acordo com o presidente da CNTE, o atual método de educação remota e as dificuldades financeiras, e até familiares, dos estudantes, também pesam sobre a queda na participação escolar.
Déficit escolar
“Os estudantes não tiveram equipamentos apropriados, conexão, ambiente adequado para estudar, autonomia para desenvolver seus estudos e nem tinham um adulto para ajudar nessa interação do processo remoto emergencial que foi novidade para a gente em 2020. E claro que, consequentemente, muitos desses alunos, por falta de condições e estímulo para continuar seus trabalhos, desistiram”, observa Heleno.
As consequências da evasão escolar, no entanto, são diversas, como adverte a professora da Universidade de Brasília (UNB) e dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Catarina de Almeida Santos.
“Eu sempre digo que tenho medo da geração covid, que não é a geração que foi excluída durante a pandemia, ela vai ser pior porque pode continuar sendo excluída pós-pandemia de 2020, inclusive com as decisões do sistema de ensino. Então podemos ter uma quantidade de pessoas que não deram continuidade nos seus estudos e isso gera uma demanda para o sistema de ensino, o que vai aumentar a distorção entre idade e série e vai fazer com que todo o processo educativo se atrase em geral mais do que já é.” A especialista ainda calcula que serão necessários pelo menos três anos para recuperar esse déficit no processo educativo.
Cadê o Ministério da Educação?
Catarina também contesta a aprovação automática realizada por instituições do país no ano passado. As escolas municipais e estaduais de São Paulo, por exemplo, optaram por passar os alunos de série mesmo não havendo certeza sobre a assimilação de conteúdo. Para a professora da UNB, ao aprovar o aluno sem que ele tenha adquirido o conhecimento do ano letivo, as escolas estão ignorando a defasagem, aumentando também as chances desse estudante deixar a escola.
Para o presidente da CNTE, a evasão escolar coloca como urgente a necessidade de maiores recursos por parte do Ministério da Educação. Assim como a de criação de projetos elaborados por profissionais da área, pais, alunos, e governos municipais, estaduais e federal para impedir a continuidade da defasagem escolar.
Confira a entrevista