Exaustão orçamentária
Gestores falam em exaustão orçamentária de municípios
Decisão do governo de retirar a prioridade das metas do PNE do orçamento 2018, deve sobrecarregar ainda mais as contas municipais
O anúncio do governo de vetar a prioridade para as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) em 2018 foi feito no momento em que os dirigentes municipais de todo o País discutiam os desafios para o cumprimento do PNE.
Parte das secretarias municipais e suas equipes técnicas estiveram reunidas no 16º Fórum Nacional dos Dirigentes Nacionais de Educação, realizado pela Undime, até a sexta 11, para pautar, sobretudo, as dificuldades que têm em materializar os planos municipais de educação, conforme previsto na Lei nº 13.005/2014, que institui o PNE.
– Governo veta prioridade para as metas do Plano Nacional de Educação
A decisão pegou os participantes de surpresa. Sem contar com a presença do Ministro da Educação, Mendonça Filho, os dirigentes contaram apenas com uma explanação da secretária executiva do Ministério da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, que, segundo os participantes, não fez menção ao veto.
O presidente da Undime, Alessio Costa Lima, alega que o anúncio veio em um momento inoportuno. “Estamos em dificuldade, em um contexto de crise e temos como desafio fazer acontecer as metas dos planos municipais de educação. Como resolver a questão das matrículas, contratações e promover melhorias na área educacional com menos recursos?”, questionou.
Desafios reais
O secretário municipal do município de Morrinhos, no Ceará, Francisco Elicio Abreu se diz atônito com a situação de crise orçamentária. “A decisão tomada é um balde de água fria, porque tira a possibilidade de dar luz ao financiamento em um momento de forte demanda. Temos metas a cumprir relativas a acesso, qualidade e garantia de direitos que pedem recursos; e já estamos sendo cobrados pela sociedade e Ministério Público”, relata.
O gestor fala em um decréscimo de receita no município da ordem de 1,4 milhão em relação a 2016, e que isso vem fazendo com que se acumule esforços na gestão da folha de pagamento. “Investir mais do que o mínimo obrigatório de 25% na educação pode parecer pouco, mas para os municípios pobres significa tirar recursos de outras áreas, como saúde, infraestrutura e assistência social”, alega Abreu, afirmando que Morrinhos deve direcionar cerca de 30% para o cumprimento de sua folha.
Ele também comenta que a situação deve fazer com que muitos municípios cumpram as metas educacionais parcialmente, sem as adequações necessárias. “No ano passado, por exemplo, garantimos o acesso às crianças de 4 e 5 anos na pré-escola, como prevê a meta 1 do Plano Nacional de Educação (PNE), mas sem os investimentos necessários em infraestrutura, formação e equipamentos pedagógicos”, assume.
Segundo o gestor, o mesmo deve acontecer com as metas referentes ao atendimento em creche, que prevê atendimento de 50% das crianças ate o fim da vigência do PNE, e à qualidade do ensino fundamental.
“É preciso haver uma parceria maior de financiamento entre a União, Estados e municípios. Se em um contexto mundial de países mais avançados as nossas metas educacionais podem parecer tímidas, para nós é um passo muito grande. E como garantir isso sem financiamento e no contexto de judicialização que vivemos? Como vamos responder isso?”, reflete.
Compartilha das preocupações o presidente da Undime SP e dirigente municipal de educação de Sud Mennucci (SP), Luiz Miguel Martins. O gestor fala sobre uma queda de receita da ordem de 25% desde a descontinuidade do Programa Mais Educação em 2016, que fazia repasse a escolas estaduais e municipais para induzir a oferta da educação integral com ampliação da jornada escolar.
“Fomos obrigados a replanejar muitas ações e descontinuar outras complementares como oficinas culturais e esportivas. Aderimos ao Novo Mais Educação e temos contrapartidas para o município, mas esperamos que o ano que vem tenhamos uma melhor receita via Fundeb”, avalia.
CAQi: ainda há esperanças
A decisão do governo de retirar a prioridade das metas do Plano Nacional de Educação do orçamento de 2018 também fragiliza a tentativa de implementar o Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi), dispositivo que tem como objetivo mensurar o financiamento necessário, por estudante, para a melhoria da qualidade da educação no Brasil. Segundo a lei do PNE, o CAQi já deveria ter sido implementado desde o ano passado.
Segundo o coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito a Educação, Daniel Cara, de acordo com o CAQi, faltam 50 bilhões para o Brasil garantir uma educação pública de qualidade. Desse total, 35 bilhões devem ser transferidos pela União aos municípios. “O governo federal teme essa reivindicação”, atesta.
Na última semana, no entanto, a implementação do CAQi voltou a entrar na pauta. A Justiça do Maranhão determinou em caráter de imposição que a União, por intermédio do Ministério da Educação, homologue e implemente o dispositivo.
“Essa decisão faz uma reparação histórica: há 7 anos o MEC evita garantir o financiamento da educação pública de qualidade por meio do CAQi, mecanismo criado pela Campanha e normatizado pelo CNE. Além de ser um instrumento imprescindível para a garantia da aprendizagem do alunos e de condições adequadas de trabalho para as educadoras e para os educadores, o CAQi corrige distorções federativas”, afirma Cara em apoio à decisão do Maranhão.
Os parâmetros e valores do CAQi devem ser adotados até a conclusão dos trabalhos da Comissão Interinstitucional de Acompanhamento da Implementação do CAQi-CAQ, instituída pela Portaria MEC 142/2016.
Para Daniel Cara, a decisão da justiça maranhense evita que o MEC não reúna o colegiado, o que vem sendo corriqueiro desde a mudança do governo. Segundo a decisão, o CAQi da Campanha, normatizado pelo Conselho Nacional de Educação deve valer em 60 dias.
“Depois disso, apenas um CAQi mais robusto substituirá o que aprovamos, garantindo as condições necessárias para a consagração do direito à educação pública de qualidade a todas e a todos os estudantes brasileiros”, finaliza Daniel.
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