Falta papel higiênico, sobra corrupção
Falta papel higiênico em escola, mas sobram casos de corrupção na Educação
Novo capítulo da política de terra arrasada do governo Bolsonaro na área de Educação, o bloqueio de R$ 2,4 bilhões para o ensino superior levará a cortes na água, luz, comida para estudantes e até na manutenção de banheiros, segundo reitores. Ao final de quatro anos de gestão, o pessoal não vai encontrar papel higiênico na escola, mas denúncia de corrupção é o que não vai faltar.
Como esquecer o icônico áudio do então ministro da Educação Milton "Tiro Acidental" Ribeiro afirmando que "foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim" a demanda por acolher as necessidades do pastor Gilmar Santos e de seus "amigos" prefeitos, interessados em recursos públicos.
Santos e o pastor Arilton Moura integravam o "gabinete paralelo" montado no MEC, segundo revelou o jornal O Estado de S.Paulo. Para tanto, cobravam propina em dinheiro, bíblias e até barras de ouro. Ironicamente, parte do autointitulado povo de Deus continua recolhendo ouro para seus bezerros e falsos ídolos (Êxodo, capítulo 32), milhares de anos depois do episódio no monte Sinai.
Descoberto o esquema, o ministro caiu. Mas gravações de conversas telefônicas apontam que ele continuou sendo ajudado pelo presidente, que o avisou de que a Polícia Federal estava em sua cola, atrapalhando uma investigação. O presidente não combateu a corrupção, mas o combate à corrupção, como alertou o próprio ex-juiz Sergio Moro, antes de fazer as pazes com o antigo chefe para se eleger senador.
Não só Jair, mas a chapa inteira do PL tem suas digitais nesse escândalo. A Casa Civil da Presidência da República, então comandada pelo general Braga Netto, hoje candidato a vice de Bolsonaro, pediu para que o Ministério da Educação atendesse o pastor Arilton Moura, em janeiro de 2021, conforme e-mail revelado pela Folha de S.Paulo.
A relação do pastor com a família Bolsonaro, vale lembrar, é anterior à chegada de Milton Ribeiro ao ministério, em julho de 2020, como pode se constatar por declarações de gratidão do próprio senador Flávio Bolsonaro.
E os dois religiosos visitaram dezenas de vezes o Palácio do Planalto desde que Jair assumiu o cargo, como ficamos sabendo pelo pedido do jornal O Globo, via Lei de Acesso à Informação. Eram figurinhas fáceis na Vice-Presidência, na Secretaria de Governo, no Gabinete de Segurança Institucional, na Casa Civil. Uma festa da fruta.
Se você é professor, funcionário ou estudante e quer conseguir a atenção do Ministério da Educação para uma demanda justa (mais professores, reformas nas escolas, currículo decente, merenda, água, luz, papel higiênico), precisa juntar-se a outros milhares e irem protestar na rua sob o risco de levar borrachada da polícia, respirar gás lacrimogênio ou ser chamado de "massa de manobra" e de "vagabundo" pelo governo
(Leia a íntegra do texto no post)
Leonardo Sakamoto 07/10/2022
É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em países como Timor Leste e Angola e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). Diretor da ONG Repórter Brasil, foi conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão (2014-2020) e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos (2018-2019). É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), ?Escravidão Contemporânea? (2020), entre outros livros.