Fechamento de turmas do Ensino Fundamental

Fechamento de turmas do Ensino Fundamental

Entenda o fechamento de turmas do Ensino Fundamental em escolas de Porto Alegre

Em 2026, 12 escolas municipais deixarão de ofertar turmas de 6º ano, enquanto 21 escolas estaduais extinguirão as turmas de 1º ano do Fundamental

Marihá Maria -  marihamaria@sul21.com.br 

Foto: Isabelle Rieger/Sul21
Foto: Isabelle Rieger/Sul21

 

Em 2026, escolas públicas de Porto Alegre passarão por um processo de reorganização na distribuição de turmas. Na rede municipal, 12 escolas deixarão de oferecer o 6º ano do Ensino Fundamental, enquanto 21 escolas estaduais extinguirão as turmas de 1º ano. A decisão, tomada em conjunto pelas Secretarias de Educação da Capital e do Rio Grande do Sul, tem gerado críticas de entidades da educação e de comunidades escolares afetadas.

Conforme reportagem do Sul21, a mudança foi percebida com a abertura do período de matrículas na rede estadual. Algumas escolas não conseguiram efetuar matrículas para o 1º ano em 2026. No mesmo dia, direções de 21 instituições foram chamadas para uma reunião com o coordenador da 1ª Coordenadoria Regional de Educação, Rodrigo França Gomes, quando foi comunicado o fechamento das turmas de 1º ano.

Alteração semelhante ocorrerá na rede municipal, em que as escolas deixarão de oferecer o 6º ano do Ensino Fundamental. Segundo a Associação dos Trabalhadores/as em Educação do Município de Porto Alegre (Atempa), 12 escolas foram informadas do processo. A medida integra um acordo entre a Secretaria Municipal de Educação (Smed) e a Secretaria Estadual de Educação (Seduc).

Com essas decisões, as turmas de 6º ano que hoje são municipais passarão a ser ofertadas por escolas estaduais. Já as turmas de 1º ano sob responsabilidade de instituições do Estado serão transferidas para as escolas da rede municipal.

De acordo com a Smed, no caso dos estudantes das instituições municipais que estão no 5º ano do Fundamental, eles serão designados para a respectiva escola estadual, garantindo a sua vaga na instituição indicada. Caso a família não queira a escola indicada, poderá fazer o pedido de transferência para qualquer outra escola disponível, mesmo que municipal.

Conforme a Seduc, a decisão foi tomada após a identificação da possibilidade de melhorias da oferta dos primeiros e sextos anos do Ensino Fundamental em algumas instituições da Capital, de forma que o município amplie o atendimento dos anos iniciais e o Estado amplie o atendimento dos anos finais.

 

Ato organizado pela comunidade escolar das instituições Mariano Beck e
Nossa Senhora de Fátima. Foto: Divulgação/Atempa

 

As alterações para o ano letivo de 2026 não foram bem recebidas por entidades que representam os profissionais de educação. Rosele Cozza Bruno de Souza, diretora da Associação dos Trabalhadores/as em Educação do Município de Porto Alegre (Atempa), aponta que o município enfrenta uma demanda de vagas no 1º ano do Fundamental, mas que a solução encontrada pela Prefeitura não é a ideal.

“Nos últimos cinco, dez anos, a gente vem alertando haver uma demanda da educação infantil que não foi atendida”, diz. “Eles estão desassistindo os 6ºs anos do município para poder dar conta da demanda dos 1ºs anos. É isso que eles estão fazendo. Eles estão trocando os 6ºs por 1ºs”, acredita Rosele.

Ela avalia a medida como um retrocesso e um ataque à classe trabalhadora e às famílias mais vulneráveis, que dependem da rede municipal. “Se fizer um levantamento de todas as escolas que existem em Porto Alegre, as escolas estaduais não estão nas vilas, no ponto mais difícil. Quem está nessas localidades são exatamente as escolas municipais. Porque depois da década de 70, 80 e 90, se viu que não tinha escola para esses alunos nas comunidades vulneráveis. Essas escolas, elas foram conquistas da comunidade”, explica.

Outro ponto de preocupação é o possível aumento da evasão escolar entre estudantes do 5º ano. Souza defende que o aluno deva cursar integralmente o Ensino Fundamental em uma única escola, garantindo continuidade pedagógica e maior segurança na rematrícula. Impor a necessidade de uma troca de escola no meio da formação de um estudante seria adicionar uma dificuldade em garantir a sua continuação.

Conforme levantamento da Atempa, o fechamento de turmas das instituições municipais deve impactar 877 alunos. Desse número, observa-se que aproximadamente 300 possuem irmãos na mesma escola, afetando assim toda a família que enfrentará novos desafios de tempo e deslocamento para que todos possam ir às aulas.

 

Escolas Mariano Beck e Nossa Senhora de Fátima. Foto: Divulgação/Atempa

 

 

A diretora também ressalta que, ao não oferecer o 6º ano em escolas municipais, a Prefeitura não cumpre com o dever que possui de disponibilizar integralmente o acesso ao ensino fundamental. “O município é o responsável pelo Ensino Fundamental. Essa coisa que eles estão dizendo que ‘é prioritariamente’ é só para lugares que tu não tem escolas municipais. Mas se você for pegar a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), se você for pegar a Constituição Federal, quem dá conta do Ensino Fundamental é o município. O Estado pode compartilhar, mas a obrigação é do município”, afirma.

A tendência, a longo prazo, é a separação total entre os anos iniciais e finais do Fundamental. Assim, o município será responsável pelas turmas do 1º ao 5º ano e o Estado do 6º ao 9º.

Rosane Zan, presidente do Cpers Sindicato, que representa os professores da rede estadual, afirma que a municipalização das escolas é uma estratégia antiga, combatida pela entidade, mas que agora avança na Capital. “Nós lutamos contra a municipalização, não somente pela questão mais propriamente do local de trabalho dos professores, funcionários de escola, mas também por aquilo que pode acarretar futuramente com a municipalização”, diz Rosane.

A presidente do Cpers alerta que a ação pode impactar diretamente os postos de trabalhos dos professores da rede estadual com a perda de locais de trabalho, pois 60% dos profissionais possuem contratos emergenciais. “Quando ofertam para a rede municipal existe um período de manutenção de dois anos. E nesse período, os professores que são efetivos, os funcionários de escola ficam, mas e depois? Porque já vai estar com a rede municipal. Como é que ficam esses postos de trabalho? Então, são inúmeras questões que a gente precisa discutir”, aponta.

Ela também ressalta que a decisão não considera a localização das escolas, a distância para os alunos, e as consequências no aumento da evasão escolar. Rosane aponta que isso é consequência de uma medida tomada sem o diálogo com a comunidade escolar. “É um debate que muitas vezes não é feito com as comunidades. Às vezes, é de cima para baixo, sem ouvir as comunidades, que é o caso dessas escolas”, diz.

– CE Carlos Fagundes de Melo
– CE Rubem Berta
– EEEB Gomes Carneiro
– EEEF Araújo Viana
– EEEF Baependi
– EEEF Coelho Neto
– EEEF Décio Martins Costa
– EEEF Dr. Martins Costa Junior
– EEEF José Garibaldi
– EEEF Luiz Azambuja Soares
– EEEF Machado de Assis
– EEEF Ministro Poty de Medeiros
– EEEF Osório Duque Estrada
– EEEF Piauí
– EEEF Profa. Lea Rosa Cecchini Brum
– EEEF Rafael Pinto Bandeira
– EEEF Toyama
– EEEM Alberto Torres
– EEEM Antão de Faria
– EEEM Itália
– EEEM Maria Cristina Chiká

Instituições municipais que terão turmas de 6º fechadas, conforme informações da Atempa:

– EMEF Jean Piaget
– EMEF Ver. Antônio Giudice
– EMEF José Mariano Beck
– EMEF Presidente João Belchior Marques Goulart
– EMEF Profª Judith Macedo de Araújo
– EMEF Joao Antonio Satte
– EMEF Lauro Rodrigues
– EMEF Aramy Silva
– EMEF Gabriel Obino
– EMEF Nossa Senhora de Fátima
– EMEF Ver. Martim Aranha
– EMEF América

A Seduc, também em nota, esclarece que as ações de reordenamento são realizadas rotineiramente na gestão da rede estadual, estando previstas no Marco Legal da Educação Gaúcha (Lei Complementar nº 16.031/2024). Conforme o governo do Estado, as medidas “buscam aprimorar a qualidade do ensino e otimizar a estrutura escolar, respeitando o princípio de garantia de acesso a todas as etapas da Educação Básica, ao reafirmar a cooperação e colaboração entre Estado e municípios”.

De acordo com o Estado, na reorganização do ano letivo de 2026, todas as vagas dos estudantes continuam asseguradas dentro do zoneamento escolar, em instituições de ensino próximas, preservando o direito à educação. 

A Smed esclarece que após a escolha das escolas, foi realizada uma reunião com os diretores das instituições municipais impactadas para orientar quanto a transição. No encontro, os diretores foram informados para qual escola os estudantes de 5º ano serão encaminhados no ano seguinte (6º ano), em 2026. A Secretaria também assegura o “atendimento à totalidade dos estudantes e a continuidade de suas trajetórias escolares”.

Além disso, o município ressalta que na escolas municipais em processo de transformação, as turmas dos Anos Finais do Ensino Fundamental, 6º ao 9º ano, atualmente em funcionamento serão mantidas até a conclusão do 9º ano, garantindo que os alunos “concluam o ciclo na própria unidade escolar, sem prejuízo pedagógico ou de vínculo com a comunidade”.

Desde que foi comunicada a reorganização das turmas para o ano letivo de 2026, escolas estaduais e municipais de Porto Alegre vêm realizando mobilizações e pedindo que a decisão seja revista. A vereadora Juliana de Souza (PT), vice-presidente da Comissão de Educação (CECE) da Câmara Municipal, tem acompanhado a situação junto às instituições do município e afirma que a comunidade escolar recebeu a proposta com “medo e indignação”.

“Medo de vermos nossos estudantes não conseguindo se adaptar à rotina escolar da rede estadual, não conseguindo percorrer longas distâncias até uma escola fora da comunidade, de terem violado o seu direito à educação inclusiva, e de como esses fatores podem fazer nossos estudantes evadirem da escola”, diz a vereadora. “Indignação pelo impacto que tem na vida de milhares de famílias e por ver o desrespeito deste governo com a população mais pobre e vulnerabilizada da cidade”, completa.

Na avaliação de Juliana de Souza, o projeto restringe o acesso à educação das crianças de famílias trabalhadoras e representa uma política que pode estimular a evasão escolar.

“No que se refere ao fechamento dos anos finais na rede municipal eu destaco, por exemplo, os estudantes com deficiência e autismo, que terão seus vínculos interrompidos e perderão os serviços da Sala de Inclusão e Recursos e de profissional de apoio à inclusão porque a rede estadual não tem a mesma estruturação da política de educação especial”, diz a vereadora.

A Comissão de Educação da Câmara Municipal realizará na próxima terça-feira (28), às 14h, uma audiência pública para discutir o tema. A reunião deve contar com a presença de representantes de escolas estaduais e municipais afetadas pela reorganização.

 

Manifestação das escolas Judith de Macedo e América. Foto: Divulgação/Atempa

 


A deputada estadual Sofia Cavedon (PT), vice-presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul (AL-RS), avalia que o projeto da Prefeitura de Porto Alegre e do Governo do Estado é um retrocesso e que fragmenta o Ensino Fundamental. “É antipedagógico e antivisão de sistema, de um sistema que garanta a continuidade do estudante para depois chegar no Ensino Médio. Então, é uma questão em que são vários os aspectos que são contrários”, observa.

Cavedon, junto da Atempa, Cpers, Conselho Tutelar e de mais parlamentares estaduais e municipais, levou o caso ao Ministério Público e à Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, solicitando providências sobre a situação. Na ALRS, a Comissão de Educação debaterá o tema em uma audiência pública no dia 4 de novembro, a partir das 10 horas.

“Há uma ação já coordenada, tanto de luta pelos movimentos quanto das duas Comissões de Educação, Assembleia e Câmara, e no Ministério Público e Defensoria, é força máxima. Ainda não temos a reversão total, mas nós acreditamos muito que o governo vai ter que ouvir a sociedade, ouvir as famílias, ouvir os órgãos que zelam pelo direito à educação”, aponta a deputada.

 

Representantes estiveram no Ministério Público na quarta-feira (22).
Foto: Reprodução/CPERS Sindicato

 

 

Além disso, na última quinta-feira (23), a Atempa realizou uma plenária com mais de 80 educadoras e educadores, que aprovaram mobilizações contra o fechamento dos anos finais do ensino fundamental nas escolas municipais. O encontro também definiu um ato unificado das comunidades escolares, indicado para o dia 30 de outubro, e a realização de abaixo-assinados contra a medida.

 

FONTE:

https://sul21.com.br/noticias/educacao/2025/10/entenda-o-fechamento-de-turmas-do-ensino-fundamental-em-escolas-de-porto-alegre/




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