Ferramenta de IA corrige redações

Ferramenta de IA corrige redações

Ferramenta de IA que corrige redações escritas à mão é adotada por municípios gaúchos; veja como funciona

Treze prefeituras do RS começaram a implantar a plataforma Pontue nas suas redes de ensino. Entenda os potenciais benefícios e os desafios da automatização em processos de avaliação 

Isabella Sander -  Repórter

Divulgação / FTD Educação
Recurso cria relatórios de alunos e turmas e os disponibiliza para os professores. Divulgação / FTD Educação

 

 

Cada vez mais presente em sala de aula, a inteligência artificial (IA) passará a corrigir até mesmo redações escritas à mão em 13 municípios do Rio Grande do Sul. A funcionalidade está em processo de implementação, desde abril, junto a turmas do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e apresenta aos professores, ainda, relatórios de evolução das turmas.

A plataforma Pontue foi desenvolvida pela FTD Educação em parceria com a Google Cloud e oferecida gratuitamente a prefeituras que já contratavam o SIM, sistema de ensino da FTD voltado para a rede pública municipal. A tecnologia permite a correção automática de redações manuscritas, que gera comentário personalizado para cada aluno, inclusive com trechos do texto. 

Se preferir, o professor pode validar as correções antes de fazer a devolutiva. Entre o segundo semestre de 2025 e o primeiro de 2026 serão incluídos recursos de detecção de plágio.

— A IA consegue identificar a letrinha da criança, do adolescente, e trazer toda essa devolutiva. E aí entra a parte da FTD e da Pontue, que é preencher o prompt da inteligência artificial com toda a análise pedagógica de uma grade de redações de Enem, ou Saeb. A ideia principal é ajudar o educador a ter menos trabalho de correção e ter dados estruturados de onde ele precisa melhorar naquela turma — descreve Alexandre de Olim Cardoso, diretor de inovação e novos negócios da FTD Educação.

Segundo Olim, a segurança dos dados envolvidos é “padrão Google”, que considera alta, algo importante, uma vez que a ferramenta trabalha com dados produzidos por crianças e adolescentes. A ferramenta começou a ser ensinada a partir da inserção de redações corrigidas por seres humanos. Depois, passaram a ser feitos testes cegos, nos quais um ser humano analisa correções feitas por outros seres humanos e pela IA, sem saber qual é qual. O diretor diz que, com frequência, a correção apontada com a melhor é a realizada pela ferramenta.

Implementação no RS

No RS, a ferramenta é utilizada nas redes municipais de Água Santa, Arroio do Tigre, Butiá, Capão Bonito do Sul, Caseiros, Ibiaçá, Novo Cabrais, Lavras do Sul, Morro Redondo, Muitos Capões, Selbach, Tupanci do Sul e Viamão. Por enquanto, as prefeituras realizam a formação de docentes.

A plataforma oferece a correção automática de quatro redações por aluno ao longo do ano. Em Butiá, na Região Carbonífera, um simulado será feito utilizando a primeira correção.

— As redações são disponibilizadas através da Pontue conforme ciclos. Geralmente são quatro ciclos acompanhando os módulos. Na primeira semana de junho, os alunos farão essas redações e os professores farão as correções automatizadas. Sabemos que a tecnologia, às vezes, tem um viés um pouco excludente, por conta da infraestrutura, e no âmbito da rede pública ainda está engatinhando, mas estamos bem otimistas, porque o SIM é voltado para a rede pública — analisa Luana Batisti, secretária de Educação de Butiá.

O que motivou o município a aderir à iniciativa é a expectativa de que ela traga mais qualidade nas devolutivas, incentivo à escrita e agilidade no trabalho dos professores, que, na visão de Luana, terão mais tempo para atender dúvidas depois.

Coordenadora de Anos Finais do Ensino Fundamental (entre o 6º e o 9º ano) de Butiá, Vanderlete Neves afirma que não há receios, por parte dos docentes, no uso da ferramenta.

— A dúvida é no entendimento de como ela (a plataforma) funciona. Por isso temos formações, que dão mais segurança. É um processo um pouquinho lento no início, mas acho que, depois, vai ser bem legal — avalia a coordenadora.

Em Ibiaçá, no norte do RS, a secretária de Educação, Glaucia Slongo, destaca que há um certo problema dos alunos com relação à interpretação e redação de textos. Apesar de trabalharem com produção textual, a gestora diz que os professores tinham dificuldade para entender onde estavam as falhas:

— Quando nos foi ofertado o Pontue, o que mais nos chamou a atenção é que a correção vai gerar relatórios pedagógicos com análises do desempenho dos estudantes. Para nós será um norte pegar esses relatórios e dizer “bah, essa habilidade aqui eu acho que não está legal, temos que focar mais nisso, e essa outra está boa, então dá para diminuir o foco”. Acho que é um diferencial para as nossas escolas, que vem para somar — analisa.

A esperança é de que o reforço na produção textual qualifique o desempenho dos estudantes, que será medido, no final deste ano, pelas provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande do Sul (Saers), nas áreas de Matemática e Língua Portuguesa.

Um dos desafios, para a secretária, é a sensibilização para os docentes utilizarem a ferramenta – contratada desde 2023, a plataforma da FTD Educação é muito acessada por alguns, mas outros nunca entraram nela. No seu entendimento, a resistência se deve à insegurança quanto à tecnologia, que vai sendo vencida aos poucos.

Em Viamão, na Região Metropolitana, a Pontue foi implementada em todas as 37 escolas que atendem estudantes de anos finais. Após essa primeira experiência com o uso da ferramenta, o município estuda a possibilidade de estender a funcionalidade às demais séries do Ensino Fundamental.

— Sabemos que o trabalho do professor é complexo e demanda bastante tempo: além das aulas propriamente ditas, o professor precisa realizar vários registros, como chamadas, registro de notas, planejamentos, produção de atividades e de avaliações, além da correção e devolução desses instrumentos avaliativos. Ao trazermos a ferramenta de correção automática, buscamos otimizar o tempo dos professores, permitindo que eles se concentrem mais na interação com os estudantes e no desenvolvimento de estratégias pedagógicas eficazes — pontua Márcia Culau, secretária de Educação de Viamão.

A gestora salienta, entretanto, que a avaliação do profissional sobre a correção realizada pela ferramenta “é essencial e não deve ser substituída”, uma vez que “a correção automática, por si só, pode gerar uma falta de personalização ou até mesmo limitações de interpretação sobre o trabalho dos estudantes”.

Cuidados com a IA na educação

Assim como em outros setores, o uso da IA na educação traz uma série de dilemas éticos que, na visão de Ricardo Madeira, gerente de Desenvolvimento da Gestão em Educação no Instituto Unibanco, dizem respeito à falta de conhecimento que ainda existe sobre como essas tecnologias funcionam.

— Acaba funcionando como uma caixa obscura, em que a gente não consegue enxergar quais são os critérios pelos quais o algoritmo trabalha. Então, acho que existe, aqui, uma chamada por regulação, para que esses algoritmos sejam transparentes. Precisamos entender quais os critérios por trás dos algoritmos de avaliação das tarefas dos alunos, sejam elas redações, exercícios ou instrumentos avaliativos em geral — defende Madeira.

Tomado o cuidado de proporcionar critérios “auditáveis”, o gerente do Instituto Unibanco avalia que há muitos benefícios potenciais no emprego da IA na educação. O principal, na sua opinião, é diminuir a sobrecarga dos professores com tarefas braçais – definição, por si só, subjetiva.

— Acho que tem uma discussão relevante sobre quais processos são formativos e importantes para a relação ensino-aprendizagem e que não devem ser automatizadas e em quais processos você tem ganho de eficiência se você automatizar. 

Madeira ressalta que o professor, enquanto conduz uma aula, faz sondagens orgânicas com a turma, faz perguntas aos alunos e interage a partir outras feitas por eles. Esse tipo de interação professor-aluno é importante e não pode ser automatizada, mas outras mais mecânicas, podem. Ainda assim, ele pontua que é fundamental que os docentes intermedeiem a relação dos alunos com a IA.

O gerente reconhece que há risco, diante do aumento da automatização de processos, que um professor sobrecarregado acabe conhecendo menos seus alunos, por não precisar mais ler as suas redações – e é por esse motivo que entende que há ações e participações do professor que não podem ser automatizadas.

— Esse cuidado é o tipo de coisa que precisa ser avaliada nos experimentos pilotos, se de fato a IA está contribuindo para que o aluno aprenda mais e levando em consideração questões de equidade. Temos que sempre olhar para esses dois resultados: que a qualidade do ensino melhore e que seja diverso, funcione para todos, e não só para alguns alunos — conclui Madeira.

Sob a ótica do especialista, conseguir dar uma nota para o aluno em uma avaliação dependerá do quanto a ferramenta de IA foi calibrada com critérios que o professor elegeu como pedagogicamente relevantes. Exatamente nesse motivo reside a importância de que os algoritmos usados pela ferramenta sejam transparentes e auditáveis, sinaliza.

FONTE:

https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao/educacao-basica/noticia/2025/05/ferramenta-de-ia-que-corrige-redacoes-escritas-a-mao-e-adotada-por-municipios-gauchos-veja-como-funciona-cmb17xz5v00xa013b0nb60lwa.html?fbclid=IwY2xjawKkbjhleHRuA2FlbQIxMQBicmlkETE2SlhSUlhmSGJnV0x5N1cyAR6D3TP7eZQRM6XJxDqOOUU_-PyweFkONEyX_bphqZ2MXOC4tVPHOUqijD7xXA_aem__bXdhfSZAQahw0UkoUgf2A 




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