Habilidade Sócio-Emocional
Aprendizagem de Habilidade Sócio-Emocional
Escola precisa desenvolver habilidade socioemocional _ Brasil _ Valor Econômico (02/10/23)
O desenvolvimento de habilidades socioemocionais dos estudantes nas escolas é uma questão cada vez mais consensual entre especialistas de educação no Brasil e no mundo e um dos principais entusiastas da ideia é o belga Filip De Fruyt. Professor
de psicologia diferencial e personalidade na Universidade de Ghent, na Bélgica, conduz estudos há décadas mostrando as vantagens de um ensino que contemple aprendizados de comportamento para crianças, adolescentes e também adultos.
As dinâmicas sociais e econômicas do século XXI, segundo ele, fazem com que ensinamentos relacionados à empatia, foco e responsabilidade, capacidade de lidar com frustrações e liderança sejam tão importantes quanto aulas de matemática, português e ciências.
“O objetivo principal de treinar e desenvolver essas habilidades é para que as pessoas tenham uma vida melhor. E uma parte importante para se ter uma vida melhor passa por ter um bom emprego; isso no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. E diante das transformações que vivemos, é um momento muito crítico”, disse De Fruyt em entrevista exclusiva ao Valor durante viagem recente ao Brasil.
Membro do conselho científico do eduLab 21, laboratório de ciências para pesquisas e estudos em educação do Instituto Ayrton Senna, De Fruyt acredita que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), instituída a partir de 2017 pelo Ministério da Educação, colocou o Brasil no caminho certo ao inserir no documento que norteia as redes de ensino no país a obrigação de ensinar cinco competências socioemocionais: autoconhecimento, autocontrole, consciência social, habilidades de relacionamento e tomada de decisão responsável.
“Não é que no passado não tenhamos aprendido a essas habilidades nas escolas, mas era de uma maneira muito mais informal com os colegas de classe, no recreio. O que é novo é pensar nesses aprendizados formalmente desenhando um sistema
de ensino para que todos estudantes trabalhem isso de maneira consciente, pois essas características serão úteis no mercado de trabalho e para a vida pessoal das pessoas”, explica.
O objetivo principal de treinar e desenvolver essas habilidades é as pessoas terem uma vida melhor”
De Fruyt pondera que ensinar habilidades socioemocionais para crianças e adolescentes nas escolas tem sido uma missão mais difícil do que se deseja em todo o mundo, inclusive em países desenvolvidos como a Bélgica. Ele aponta que um dos obstáculos é o desafio de preparar os professores para que saibam valorizar o desenvolvimento das habilidades socioemocionais nas salas de aula.
Um dos desafios a serem superados, segundo o especialista, é que boa parte dos professores costumam entender o ensinamento das habilidades socioemocionais como uma tarefa extra e muitos já se sentem sobrecarregados. No Brasil, por exemplo, esse cenário se agrava já que é comum nas escolas públicas do país que as salas de aula tenham aproximadamente 40 alunos, o dobro do que acontece em país europeus. Porém, ele explica que alunos que aprendem a ser mais centrados desde os primeiros anos na escola acabam justamente facilitando o trabalho dos educadores.
“O melhor argumento para convencer os professores é que, ao desenvolver habilidades socioemocionais nos alunos, ajuda os estudantes a entenderem melhor matérias. Se você pode ajudar os alunos a serem mais focados ou mais organizados, facilitará o processo de aprendizagem como um todo”, afirma De Fruyt.
No Brasil, de acordo com pesquisa recente feita pela ONG Nova Escola em parceria com o Instituto Ame Sua Mente que ouviu 2.752 professores e profissionais de instituições de ensino públicas no Brasil, apenas 26,5% dizem ter recebido treinamento para ensinar habilidades socioemocionais aos estudantes.
Apesar do número ainda baixo, De Fruyt, que desenvolve trabalhos no Brasil junto com o Instituto Ayrton Senna, mostra otimismo e acredita que é questão de tempo para que haja uma evolução do tema entre os educadores brasileiros. Ele cita que
experimentos em Sobral, cidade onde o instituto faz laboratórios práticos de políticas públicas para a educação desde a década de 1990, os resultados são positivos e notados na melhoria de perspectivas dos estudantes e ex-estudantes impactados pelas iniciativas. “Se dermos os elementos, os alunos começam a olhar de um jeito diferente para os problemas e se sentem mais aptos a resolvê-los”, diz.
No longo prazo, de acordo com de Fruyt, a tendência é ter pessoas e profissionais mais equilibrados e capazes de utilizar diferentes ferramentas do mundo moderno na solução de questões de suas vidas profissionais e pessoais. No contexto do mercado de trabalho, a perspectiva é de que a pessoa que teve a oportunidade de treinar as ditas habilidades socioemocionais seja mais produtiva. “É um investimento realmente válido para o longo prazo”, defende.
Em relação ao entendimento da classe política sobre o tema, fator essencial para que os investimentos públicos e as ações sejam direcionadas para o objetivo, De Fruyt defende uma aproximação maior de acadêmicos com os representantes eleitos pela população para ajudar no processo.
“A política é sempre uma coisa difícil e tudo depende de como um país está politicamente organizado. No Brasil, por exemplo, o Estado de São Paulo é muito diferente do Ceará e fazer com que todos tenham o foco adequado na educação é sempre um grande desafio. Mas não sou pessimista em relação a isso”, diz o professor belga. “Temos que aceitar que eles [os políticos] são escolhidos para fazerem as escolas e o que podemos fazer é contribuir o máximo possível para que isso seja feito com base evidências”, conclui.
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