Imersão em culturas étnico-raciais
Escola do DF recebe prêmio por instituir festival afro-indígena
CEI 01 de São Sebastião venceu na categoria Gestão de Escola, com projeto que, há dez anos promove imersão em culturas étnico-raciais com intuito de aumentar a valorização e a autoestima das crianças
DA Diogo Albuquerque* postado em 20/10/2022
O Distrito Federal foi destaque no prêmio de Educar 2022. Entre as 36 escolas que concorreram, o Centro de Educação Infantil 01 de São Sebastião, do Distrito Federal, ficou entre os 8 vencedores na categoria Gestão de Escola, pela realização, desde 2013, do projeto Festival de Valorização da Cultura Afro-Brasileira e Indígena. A escola receberá R$ 10 mil, incentivo que será convertido em materiais para manutenção e desenvolvimento do projeto. A premiação ocorreu nesta quarta-feira (19), em São Paulo.
Realizado anualmente no “Centrinho”, como é, carinhosamente, conhecida a escola, o festival afro se tornou referência pela profunda pesquisa e informação que realiza junto a classe de professores e também pela facilitação do acesso a crianças das culturas de povos de matriz africana e indígena no Brasil. Para Francineia Alves, 47 anos, coordenadora pedagógica da escola, o projeto é imprescindível na difusão do conhecimento e do respeito entre os alunos da educação infantil, pois garante a eles uma imersão em culturas étnico-raciais, que visa promover a valorização e a autoestima das crianças negras.
A coordenadora conta que a ideia de criar o projeto surgiu após a escola receber uma aluna nigeriana, como forma de incluir e integrar as crianças. “Iniciamos o projeto em 2013. Com as formações que promovemos aos professores fomos aprofundando nossos debates. Usamos mapas, músicas, contamos com um acervo de tecidos, uma biblioteca antirracista com livros de autores negros que tratam sobre essa temática, história com representatividade de pessoas negras e autores indígenas para diminuir essa questão do eurocentrismo”, explica Francineia. O projeto também mantém parceria com o povo Fulni-ô, de Pernambuco, cujos integrantes vão à escola e expõem pinturas, instrumentos musicais e promovem eventos com oferta de comidas típicas.
Francineia reforça, ainda, que o projeto é importante para as famílias conseguirem abertura para dialogar com os filhos a questão do racismo. “As famílias começam a pensar e repensar várias atitudes racistas que são reproduzidas e naturalizadas no dia a dia”, pondera. “É a primeira vez que concorremos. Para uma escolinha da educação infantil, receber um prêmio desses de nível nacional é entender que o nosso processo dentro da comunidade de São Sebastião é revolucionário, transgressor. Então, estar aqui nos faz acreditar que trabalhar por uma educação antirracista é possível", afirma.
Professores recebem premiação
A professora da educação infantil Lediane Costa, 35, é mais uma a comemorar a vitória da escola. Ela considera que o prêmio é uma forma bastante especial de valorização do trabalho desenvolvido por toda a equipe. “Fico feliz pela dimensão e pela oportunidade que tivemos de compartilhar a produção dos alunos”, afirma a professora, que ficou entre os finalistas na categoria docentes. “Buscamos reforçar a representatividade e fazer as crianças refletirem sobre suas raízes e ancestralidade, por meio das atividades e do contato com os elementos culturais, principalmente entre as negras, que se sentem bonitas com seu cabelo e seus traços”, destacou.
A diretora da escola, Cleyde Cunha Sousa, 43, frisa que um dos pontos fundamentais do projeto é a formação dos docentes. “A rotatividade de professores na escola é muito grande. Então, o primeiro investimento é na formação dos professores. Levar a eles conceitos, desconstruir alguns estereótipos e reescrever e elaborar práticas antirracistas. No dia do índio, por exemplo, apresentamos um exemplo de povo indígena de forma aprofundada, em vez de fazer aquelas tradicionais pinturas de rosto”, disse.
Cleyde reafirma que a escola é o canal mais fácil de trabalhar o racismo com os alunos, e que é por meio dela que a mudança chega até as famílias e à comunidade. “É uma demanda urgente e muito necessária na sociedade, porque os casos de racismo, preconceito e ódio ainda estão muito presentes”, concluiu.
Trabalho feito por alunos do CEI 01 de São Sebastião Sinpro-DF/Deva Garcia
O festival, que ocorre no último semestre, em novembro, é aberto aos familiares e convidados e conta com apresentações dos trabalhos feitos pelos alunos ao longo do ano, além de comidas típicas, como tapioca e feijoada. Conforme o previsto nas leis 10.639/03 e 11.645/08, as escolas de educação pública e privadas devem desenvolver os conhecimentos da história do povo africano e indígena no ensino.
Instituído há 20 anos, o prêmio Educar tem como objetivos identificar, apoiar e difundir boas práticas pedagógicas e de gestão escolar que promovam a equidade racial e de gênero, como forma de concretizar com qualidade o direito ao pleno desenvolvimento escolar de crianças, adolescentes e jovens negros, brancos, indígenas e de outros grupos étnico-raciais. O projeto é realizado pelo Centro de Estudos de Relações de Trabalho e Desigualdade (Ceert). Neste ano, em sua 8ª edição, 700 projetos foram analisados e 36 indicados. A premiação contou com apoio do Sesc Vila Mariana, na capital paulista.
*Estagiário sob a supervisão de Jáder Rezende
Atividades do Festival Afro brasileira e indígena