Além de ser o período da vida de total dependência dos cuidadores, é na primeira infância que surgem as primeiras formas de apego. De acordo com o psicólogo, psiquiatra e psicanalista Edward John Mostyn Bowlby, que é o responsável pela conceitualização da Teoria do Apego, as crianças desenvolvem uma ligação afetiva com seus cuidadores de maneira instintiva, como uma necessidade biológica para sua sobrevivência.

Com o passar do tempo, aumentam as demandas infantis e a busca por outras pessoas para estabelecer novos laços. E é aqui que entram as professoras e a importância do vínculo afetivo nas escolas.

De acordo com a pedagoga, psicopedagoga e acompanhante terapêutica Ludmilla Guimarães Martins Abrão, que administra a conta @psicopedagoga.ludmillamartins no instagram, os processos de aprendizagem são mais efetivos e significativos à medida que é proporcionado para a criança um ambiente seguro, estimulante e saudável, onde ela se sente respeitada, acolhida e amada. “Quando isso acontece, o indivíduo percebe que há espaço para exercitar sua autonomia e a consequência é o fortalecimento dos vínculos de afeto e empatia entre os atores que fazem parte da cena educacional, seja no âmbito formal de aprendizagem ou não”, explica.

Para a professora e psicopedagoga Gabrieli Fernanda Mota Macedo Pimenta, o afeto está completamente ligado à aprendizagem. A profissional ainda defende que não há como construir uma aprendizagem significativa sem a presença do afeto. “É muito comum as pessoas confundirem ser um professor ‘carinhoso’ com ser um professor ‘bonzinho’. Um professor carinhoso, que coloca o afeto em primeiro lugar em sua sala de aula, é aquele que pensa em cada aluno como um ser único, que o corrige quando necessário, mas nunca de forma vexatória e sempre com amor; é aquele que quando vai elaborar uma atividade não pensa no ‘conteúdo’ e sim onde quer que seu aluno chegue através dela”, afirma. 

Gabrieli ainda acredita que quando uma criança estabelece uma relação afetiva com seu professor, metade do processo de aprendizagem está garantido. Nesse sentido, quando o vínculo afetivo está presente na escola, os alunos se sentem seguros. “Quando a criança consegue aprender e criar vínculo com quem a ensina, ela se torna um indivíduo mais seguro de si e de suas atitudes. Ela dificilmente terá medo do novo, porque ela estará segura do que a espera e caso ela ‘erre’ será compreendida. Além de conseguir atingir com mais facilidade um desenvolvimento pleno, tanto cognitivo, quanto emocional”, pontua.

Por sua vez, a pedagoga Ludmilla destaca ainda que a afetividade deve ser construída ao longo do processo educacional. “Quando o vínculo afetivo se estabelece nas relações de aprendizagem a criança se beneficia, pois tem suas potencialidades reconhecidas e suas capacidades estimuladas. A criança então percebe ( e isso acontece de forma natural ) que tem espaço para manifestar-se sem expectativas de perfeição e isso decorre na formação de seres humanos mais seguros, autônomos e empáticos”, completa.

Exemplos de práticas que promovem vínculo afetivo na escola

Há inúmeras alternativas para as escolas que desejam construir um vínculo afetivo no processo de aprendizagem. Segundo a pedagoga, psicopedagoga e acompanhante terapêutica Ludmilla Guimarães Martins Abrão, as instituições de ensino podem apostar em atividades que envolvam as famílias, como oficinas e rodas de conversa, por exemplo. “Para além das estratégias de aproximação e envolvimento da família, a escola precisa refinar seu olhar para as especificidades de cada criança, ou seja, dentro de um projeto pedagógico maior é necessário que o educador ofereça alternativas para a construção do conhecimento reconhecendo as características individuais da criança”, recomenda.

Já a professora e psicopedagoga Gabrieli Fernanda Mota Macedo Pimenta comenta sobre a importância de planejar e estruturar o espaço físico escolar, como abolir a forma tradicional da disposição das carteiras. “Sair do tradicional ‘um atrás do outro’ e permitir o contato olho a olho. Respeitar as realidades de cada aluno, estabelecer diálogos constantes não somente sobre aprendizagem escolar, mas também sobre as emoções, entender quais são os medos destas crianças, suas vontades, seus sonhos”, orienta. 

Como manter o vínculo afetivo durante a pandemia?

Falar de vínculo afetivo já era um desafio para muitas escolas antes mesmo da pandemia. Agora, como o ambiente do ensino remoto ou mesmo das aulas híbridas, parece ainda mais complicado estabelecer relações afetivas com os alunos, certo? Porém, justamente neste cenário, o vínculo afetivo nas escolas tornou-se ainda mais imprescindível. 

Para a especialista, a psicóloga Thauane Rocha, que é consultora pedagógica do LIV (Laboratório Inteligência de Vida), um programa de educação socioemocional, as aulas online também precisam ser pensadas como uma oportunidade de momento de acolhimento. “Esse pode ser o único momento que o estudante entra em contato com outras pessoas, por isso, vale pensar nas atividades também como uma forma de integração e construção de um sentimento acolhedor ao espaço, mesmo que virtual”, afirma.

Nesse sentido, a profissional acredita que é importante pensar em estratégias em que os alunos e alunas possam participar ativamente das aulas e se sintam pertencentes ao espaço, mesmo que virtualmente. “Propor jogos, dinâmicas, brincadeiras, participação com a câmera ligada, ou pelo chat, o uso de ferramentas digitais, realização de exposições ou feiras culturais por meio de apresentação audiovisual para que os alunos de todas as séries consigam interagir uns com os outros, tornar as aulas mais atrativas com imagens, e debates que fazem parte do cotidiano dos alunos, questioná-los para uma maior participação em aula ou até mesmo chamar o aluno para criar uma aula junto com o professor”, propôs.

Para a professora e psicopedagoga Gabrieli Fernanda Mota Macedo Pimenta, deve-se considerar também a necessidade de o professor ou professora estabelecer vínculo de afeto com as famílias. Segundo a profissional, manter um relacionamento próximo com mães e pais influencia nos resultados dos objetivos que se deseja atingir com os alunos. “As famílias são responsáveis por realizarem as atividades com as crianças na prática. Por isso, eu sempre digo: ‘É importante estreitar os laços entre família e escola, porque sem este laço a corda se solta e o aluno fica sem destino’”, acrescenta. 

Ainda neste contexto, Thauane afirma que a família também pode mobilizar recursos e desenvolver algumas práticas na construção ou na manutenção do vínculo afetivo da escola com os filhos com e os colegas, como buscar fazer atividades juntos remotamente, incentivar que liguem as câmeras para que ocorra um contato visual nas aulas, questionar algo que aconteceu ou o que o filho aprendeu no dia. “O mais importante é que a gente tenha em mente que não é porque estamos em distanciamento físico que precisamos nos isolar”, pontua.