Insônia

Insônia

Insônia

Tatiana Lebedeff

Hoje tive insônia. Há horas não tinha. Minha insônia não é a de não conseguir dormir, é aquela chata em que acordas no meio da madrugada com o cérebro funcionando à mil enquanto o corpo ainda está em outra dimensão... Entrei no Feicibuque e encontrei vários insones ali. Uma amiga escreveu sobre o medo de morrer, falou sobre todas as coisas que ela ainda tem para fazer.

O cérebro deu o clique: sim, o medo está batendo em nossas portas. Lembrei dos ocorridos durante o dia: Saúde à deriva com decisões tomadas sem consulta ao Ministro. Educação dando braçadas na lama do negacionismo, com Enem mantendo as datas previstas. Corrupção nos saques dos R$ 600,00 que seriam para proteger os mais vulneráveis. Dia agitado, no mal sentido.

Aqui chove uma chuvinha miúda, quietinha, tímida. Às vezes olho pela janela para me certificar que ela segue lá. A cidade vive uma seca assustadora, a chuvinha é um alento, ainda que tristinha, sem viço.

Ontem e hoje meu filho falou de saudades, de falta de gente. Lendo a minha amiga sinto que, de certa forma, fomos abandonados. É uma sensação que assola crianças e adultos, cada um na sua maneira de interpretar. Uma nau que parece não enxergar porto amigo, abandonados na Saúde, abandonados na Educação, e, economicamente.

Assisti os discursos do Primeiro Ministro de Singapura falando sobre os protocolos de restrição. Sorry Sinistro Terraplana, Cingapura teve e tem restrições de circulação e isolamento social (https://www.channelnewsasia.com/news/singapore/covid-19-pm-lee-full-speech-circuit-breaker-extended-june-1-12662056 e https://youtu.be/KaoVg6ejgRQ).

O Primeiro Ministro é um senhor muito digno, calmo, educado. Parece um professor falando para seus alunos sobre a pandemia: quais são os procedimentos, o porquê deles e, busca acalmar os ânimos de todos! Divide o discurso em três importantes eixos: médico, econômico e, PSICOLÓGICO! Sua fala é firme e afetuosa, um farol na tempestade, pena que não somos os destinatários da luz e segurança...

Os ânimos aqui andam melancólicos. O estado começa a falar sobre o retorno as aulas, nas portas do inverno, sem um protocolo que norteie um retorno com segurança. Professores da rede estadual seguem tendo seus salários parcelados e descontados pelos dias parados em greve, apesar das aulas terem sido recuperadas. É um castigo? Um cruel castigo em tempos de pandemia. Professores estão pagando suas internets e utilizando seus computadores para preparar e postar aulas, para atender alunos e pais. Não há uma orientação, muitos se sentem perdidos, sem bússola.

Sem orientação também está a rede federal. O Sinistro Weintrouble anuncia que premiará as Universidades que derem aulas (https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/weintraub-quer-premiar-universidades-que-mantiveram-atividades/). Esquece que a grande maioria dos estudantes não possui internet em casa, não possui computador. Que a grande maioria depende da estrutura da Universidade Pública para estudar, pesquisar, se alimentar.... Ele não elogia o grande esforço que está em andamento, nas Universidades, para a produção de produtos de segurança (álcool gel, máscaras, entre outros) para atender as demandas comunitárias, bem como as pesquisas sobre o próprio vírus e o desenvolvimento da doença.

O Enem não trocou a data e a versão digital já avisou que não terá acessibilidade (http://download.inep.gov.br/educacao_basica/enem/edital/2020/edital_enem2020_digital.pdf). Falar em exclusão digital é um eufemismo que engloba muitas exclusões prévias. Fico pensando na reinvenção da roda. Sempre falo com meus orientandos sobre a replicação em pesquisa. Não precisamos reinventar a roda, podemos replicar pesquisas e, mesmo assim, ter um ótimo resultado, avançar cientificamente utilizando o que já foi construído. Weintrouble não conseguiu inventar a roda, o Enem já estava ali. Bolou o Enem digital, mas, não contava com a pandemia. Ele não suportaria não ter o destaque que havia desejado, quer mostrar sua “roda reinventada”, mostrar sua competência para as “zebras gordas”. Assim, segue o cronograma, a despeito de tudo e todos. A despeito dos 12.400 óbitos anunciados hoje.

Não chove mais, infelizmente... Está tudo cinza. Aqui a criança não quer entrar no computador para a atividade remota. Eu me faço de sonsa. No almoço ele disse que estava com saudades dos amigos, nomeou vários. Ele está fazendo origami. Pode seguir.... Temos que nos agarrar em alguma boia, para dar conta desse anúncio de naufrágio. Eu me agarro nas minhas escritas, consigo não submergir, posso incomodar alguém, provocar reflexões... assim me sinto um pouco mais útil no meio do barco, ajudando a encontrar um porto, mesmo que em teoria.

Abraços virtuais,

Tatiana Lebedeff          https://www.facebook.com/tatiana.lebedeff




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