Ser brasileiro não é fácil. Não gostamos de ser quem somos. Nos imaginamos orgulhosos como descendentes de uma Europa imaginária. E nos mantemos submissos e bajuladores mesmo com a Europa de verdade nos querendo só como turistas e olhe lá! Tal como escravos voluntários pela falta de vontade de ser quem se é.

Admiramos os americanos e achamos que tudo que vem de longe é melhor que o que vem daqui. American é mais cool e mais pop e mais tech até que o nosso agro. Damos nomes em inglês para as lojas e eventos parecerem chiques – em outros tempos, eram nomes franceses – e achamos terrivelmente bregas e até ridículas palavras mais nossas mesmo. Escravos da vergonha de ser quem se é.

A economia daqui é um suplício! Tem inflação. Igual quando eu era criança. Quando a gente tinha dinheiro, corria para comprar com medo do preço subir no dia seguinte. E sempre subia. Você trabalha do mesmo jeito, no mesmo lugar, com as mesmas pessoas, ganha a mesma coisa, mas dia após dia não consegue comprar o mesmo. Sente o empobrecimento aos poucos. Escravos da miséria.

Mas isso só vale para brasileiros, que são a maioria, não para os brazilians. Aquele 1% dos que vivem aqui, são donos de 28,3% de toda riqueza e lamentam não serem donos de mais. Os 99%, brasileiros, disputam o que sobra. E sobra cada vez menos. Escravos da escassez.

Brasileiro não é que nem seu ministro da economia que tem dólar em paraíso fiscal. Brasileiro não tem dólar. Nem dinheiro. Tem dívidas. Além de comida e imposto, paga juros por causa de empréstimo que fez para pagar imposto, comida e outros juros.

Brasileiros querem dinheiro, sim. Mas também e mais e muito, querem liberdade. Presos a uma vida sem outra perspectiva que não a do lento empobrecimento. À raiva de ver gente picareta posando de santa. Ao ressentimento de uma gente violenta que não gosta de quem pensa diferente. A um futuro que quer ser como o passado, só que piorado. Cativos da miopia de uma elite que para resolver os problemas brasileiros do século XXI, só encontra respostas vindas da Europa do século XIX.

Ser livre não é fazer o que se quer. É andar na rua sem medo de tomar uma porrada do guarda. É dormir tranquilo, sabendo que há uma justiça capaz de garantir justiça e não apenas bons salários para quem diz fazer justiça. É poder entrar em um ônibus sem medo de ser adoecido por quem acha que suas fantasias o autorizam a colocar a vida dos outros em perigo. É viver em uma terra onde lei é a lei e não a vontade do sujeito poderoso, popular ou rico, a quem falta quem lhe aplique as leis.

Sem respeito pela lei, por si mesmo e pelos outros, não há liberdade. Só há servidão pela cultura, contrato ou tiro. E morte. Lenta. De fome, de sede e de raiva. E não falta quem prefira morrer a viver sem liberdade nesta terra em que uma gente ressentida confunde a liberdade de viver com a liberdade de matar.

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Os artigos representam a opinião dos autores e não necessariamente do Conselho Editorial do Terapia Política. 

Ilustração: Mihai Cauli  

 

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