Maior inimigo da educação

Maior inimigo da educação

O maior inimigo da educação

Cortes de verbas maquinados pelo presidente Jair Bolsonaro asfixia universidades federais e deixa o ensino público à beira do caos.

Crédito: Divulgação

MANIFESTAÇÃO À MODA DO ALUNO Universitários da UFRJ fazem protestos contra os cortes promovidos pelo governo Bolsonaro à universidade. (Crédito: Divulgação)

Jaqueline Mendes             21/05/21 

Os esquerdistas, os comunistas, a mídia, os togados do Supremo Tribunal Federal, os índios, os naturebas, os chineses… De todos os inimigos imaginários do presidente Jair Bolsonaro – muitos dos quais se tornam reais pela insistência dele –, nenhum tem sofrido mais do que a educação. Algumas das maiores e mais tradicionais universidades federais do País estão na iminência de fechar as portas por falta de dinheiro. A situação mais complicada é a da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Sem recursos para pagar sequer água, luz e limpeza, a instituição deve encerrar suas atividades nos próximos dias. O já apertado orçamento de R$ 374 milhões em 2020 caiu para R$ 258 milhões neste ano, uma subtração de R$ 116 milhões entre redução permanente e bloqueios de repasses. A medida inviabiliza a continuidade das aulas a partir de julho, segundo a universidade. “A decisão comprova que a educação e as universidades públicas não são prioridades desse governo”, afirmou o pró-reitor da UFRJ, Eduardo Raupp. “Ao mesmo tempo em que reduz as verbas da educação, libera R$ 16 bilhões em emendas parlamentares.” O estopim do colapso da UFRJ é o bloqueio de 18,4% do dinheiro que a União repassa todos os anos para as instituições públicas, previsto na Lei Orçamentária Anual de 2021, sob o argumento de necessidade de contingenciamento na crise.

O estrangulamento financeiro da UFRJ reflete a realidade geral das universidades públicas brasileiras, entre elas a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Universidade Federal de Goiás (UFG) e a Universidade Federal de Brasília (UnB). Atualmente, as 69 instituições têm a mesma verba que as 51 existentes em 2004. Com um adendo: há 17 anos havia 574 mil estudantes nessas salas de aula. Atualmente, são 1,3 milhão. “A educação pública do Brasil vive a maior dificuldade de sua história, com danos que incalculáveis e de efeitos imprevisíveis”, disse um membro da direção da Universidade Federal do ABC. O Ministério da Educação alega que não tem medido esforços “nas tentativas de recomposição ou mitigação das reduções orçamentárias” e promover ações com o Ministério da Economia para desbloquear verbas. Na expectativa de “evolução do cenário fiscal” no seguindo semestre, as dotações poderão ser desbloqueadas e executadas.

A balbúrdia fiscal do governo Bolsonaro representa um corte de mais de 18% no orçamento das 69 universidades federais em 2021, uma redução de R$ 1 bilhão, segundo cálculo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) afirmou que, se não houver liberação dos recursos, a instituição não terá como arcar com o funcionamento básico no segundo semestre, mesmo alerta disparado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). “Tais esforços incluem, além das imprescindíveis medidas administrativas, expor à sociedade o projeto de destruição do ensino público”, afirmou a universidade, em nota. A Universidade Federal de Goiás (UFG) também ameaça paralisar. Segundo o reitor Edward Madureira, além do corte de recursos há atrasos no envio dos a repasses. Pelas contas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o corte causa um retrocesso de mais de uma década. “Naquela época, as despesas eram menores, com 20 mil estudantes de graduação. Hoje temos 32 mil estudantes”, disse a reitora Regina Goulart Almeida.

RETROCESSO A decadência estrutural do ensino superior é incontestável sob qualquer ângulo ou cálculo – e tendem a ampliar o abismo econômico e social no País. Em 2001, 21,9% dos alunos em universidades eram pretos e pardos, número que aumentou para 43,5% em 2015 com as políticas de inclusão. O investimento no ensino público subiu de R$ 16 bilhões, em 2002, para R$ 105 bilhões, em 2017. Segundo o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Ildeu Moreira, o corte do orçamento para pesquisa, em órgãos como o CNPq e o Capes, além do contingenciamento do Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia, vai paralisar estudos. “Junto ao cortes de recursos, estamos batalhando também pela liberdade acadêmica e de pesquisas porque há restrições aos trabalhos da Inpe, no Inep, no Ipea, no IBGE.”

Se educação e a pesquisa agonizam na atual gestão, a clima anti-Bolsonaro cresce como nunca no meio acadêmico. Inspirada nas dificuldades dos estudantes, professores e de tantos brasileiros que estão em apuros, a Casa Porto, reduto político-gastronômico do Largo do São Francisco da Prainha, no Rio de Janeiro, passou a oferecer um brinde inusitado: um boneco com agulhas de vodu para, simbolicamente, retribuir ao presidente o tratamento dado à educação. Pode faltar dinheiro, mas não vai faltar criatividade.

 

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