Matrícula de aluno sem vacina
Escolas podem barrar matrícula de aluno sem vacina contra covid-19? Veja o que diz a lei
Imunizante contra o coronavírus passou a integrar o calendário nacional de vacinação em 2024
08/02/2024 - SOFIA LUNGUI
A partir de 2024, o imunizante contra covid-19 passa a fazer parte das vacinas obrigatórias
do calendário vacinal, bem como a proteção contra sarampo, caxumba, rubéola e
poliomielite, por exemplo. tong2530 / stock.adobe.com
Pelo menos três municípios gaúchos anunciaram, nesta semana, que não será necessário comprovar vacina contra a covid-19 para a matrícula nas escolas. O debate surgiu após a inclusão da dose no cronograma do Programa Nacional de Imunizações (PNI). A partir de 2024, o imunizante passa a fazer parte das vacinas obrigatórias do calendário vacinal, bem como a proteção contra sarampo, caxumba, rubéola e poliomielite, por exemplo.
A decisão foi divulgada pelas prefeituras de Caxias do Sul, Farroupilha e São Marcos, que assinaram decretos dispensando a apresentação do comprovante de vacinação contra a doença. “Fica dispensada a obrigatoriedade de apresentação de atestado de vacinação com a indicação da aplicação da vacina contra a Covid-19, dentre as vacinas obrigatórias à criança ou adolescente, no ato da matrícula ou rematrícula”, diz o texto assinado pelo prefeito Fabiano Feltrin (PP), de Farroupilha, na segunda-feira (5).
O Sindicato dos Enfermeiros no Rio Grande do Sul (Sergs) publicou nota de repúdio a respeito. “É um movimento contrário à ciência, contrário aos dados epidemiológicos e contrário à determinação Federal e Estadual de manter os calendários vacinais de nossa população atualizados”, diz a nota.
Em comunicado, a prefeitura de Farroupilha diz que a decisão tem como base "o direito de decisão dos pais em vacinar, ou não, seus filhos". A nota ressalta que a norma é exclusiva para a vacina da covid-19, não entrando no mérito dos demais imunizantes que compõem o "quadro vacinal estipulado".
Em entrevista ao ao Gaúcha Atualidade nesta quinta-feira (8), o governador Eduardo Leite foi questionado sobre a obrigatoriedade de apresentação da carteira de vacinação das crianças na hora da matrícula. Leite respondeu que não tem nenhuma razão para deixar de seguir a orientação do Ministério da Saúde, que prevê a vacinação obrigatória das crianças.
Os governadores Jorginho Mello, de Santa Catarina (PL) e Romeu Zema, de Minas Gerais (Novo) tomaram medidas semelhantes. O governador mineiro compartilhou nas redes sociais, no último domingo (4), um vídeo anunciando que instituições de ensino de MG não exigirão a carteira de vacinação no ato de matrícula. Jorginho Mello também divulgou a decisão pelas redes sociais, afirmando que "nenhuma criança ficará fora da escola por não ter se vacinado contra covid-19".
O que diz a lei
A obrigatoriedade de apresentação do comprovante vacinal nunca foi um impeditivo para as matrículas e rematrículas, já que não é compulsório. O mesmo vale para a vacina contra o coronavírus. Conforme informou a Secretaria da Educação do RS, no Estado, há uma lei que dispõe sobre a obrigatoriedade da apresentação da carteira de vacinação no ato de matrícula ou rematrícula de alunos nas escolas das redes de ensino público e privado do Estado.
Sancionada pelo governador Eduardo Leite (PSDB), a Lei 15.409/2019 estabelece que pais e responsáveis que não apresentarem a carteira ou se estiver desatualizada, devem ser alertados pelas escolas para regularizar a situação em prazo de até 60 dias. A legislação entende como carteira atualizada "aquela que contar com todos os registros prescritos, conforme a idade, no Calendário Nacional de Vacinação emitido pelo Ministério da Saúde."
Caso não o façam, o estabelecimento de ensino poderá denunciar ao Conselho Tutelar para as devidas providências, "sem quaisquer prejuízos à efetivação da matrícula”, diz a lei. Fica a critério da instituição de ensino o controle da entrega desta documentação, conforme a Seduc.
— Nenhuma criança deixou de estudar por não estar com a carteira de vacinação em dia. Não podemos deixar as crianças sem saúde e sem educação. A exigência desse documento na matrícula não é para limitar o acesso, mas sim uma maneira de conscientizar, uma oportunidade de atualização para quem não está com a vacinação em dia — explica o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também conta com um dispositivo que trata sobre o tema. “É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”, diz o artigo 14 da Lei 8.069/1990, que dispõe sobre o ECA.
A Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre informou, em nota, que “não há exigência de vacinação no momento da matrícula”. No texto, a pasta diz que orienta que todas as vacinas obrigatórias sejam realizadas. "Em parceria com a Secretaria de Saúde, atuamos para promoção de campanhas que estimulem a vacinação”, completa.
De acordo com a Secretaria de Saúde do RS, a pasta “tem atuado com Ministério Público e demais órgãos com a assinatura do Pacto Nacional de Consciência Vacinal demonstrando evidências científicas da importância, resultados tanto no aspecto individual como no da coletividade”, em relação à vacina contra a covid-19.
Importância da vacinação infantil
Em 1º de janeiro de 2024, a vacinação contra a covid-19 de crianças a partir dos seis meses até os cinco anos entrou no Calendário Nacional de Vacinação. O Ministério da Saúde classificou a doença como importante causa de infecção respiratória grave e morte nesta faixa etária.
Conforme dados da pasta, até novembro de 2023, foram registrados no Brasil 5.310 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por covid-19 e 135 óbitos neste grupo. Entre as crianças, as menores de um ano apresentaram maior incidência e mortalidade de SRAG pela doença.
Renato Kfouri diz que, independentemente de a criança estar ou não na escola, as vacinas do PNI são obrigatórias, e o mesmo vale para o imunizante contra covid-19. Os governos que estão dispensando a obrigatoriedade do comprovante de imunização estão fazendo “uso político” dessa questão, avalia o médico pediatra infectologista.
— É um uso político desse fato em um momento de polarização no nosso país. Estes governos estão fomentando uma discussão desnecessária e absolutamente inócua. As crianças só perdem para os maiores de 80 anos no número de hospitalizações por covid a cada 100 mil habitantes. Não temos que discutir se precisa ou não de vacina, as vacinas são obrigatórias, não tem dúvidas sobre essa indicação — diz o especialista.
Questionado a respeito das decisões pontuais de prefeituras no RS sobre a exigência da carteira de vacinação, o Ministério da Saúde decidiu não se pronunciar. O Ministério Público, em nota, afirma que "não apenas a imunização contra a Covid-19, mas todas as demais incluídas no PNI, sob os mesmos fundamentos, devem ser exigidas pelas autoridades competentes, ainda que contra a vontade dos pais ou responsáveis, considerando o dever de proteção da criança e do adolescente pela Sociedade e pelo Estado, previsto no art. 227 da Constituição. O descumprimento da lei deve ensejar, por parte das escolas, notificação aos órgãos competentes, em especial ao Conselho Tutelar. Mas, em nenhuma hipótese, pode significar a negativa da matrícula ou a proibição de frequência à escola, em razão do caráter fundamental do direito à educação".
FONTE:
Prefeituras da Serra desobrigam vacinação contra covid para matrícula em escolas
Por lei estadual, pais e responsáveis devem apresentar caderneta de vacina atualizada no ato da matrícula
09/02/2024 Por Bettina Gehm
Prefeituras de Caxias do Sul e de Farroupilha, na serra, publicaram decretos que dispensam a obrigatoriedade de apresentação do atestado de vacinação no ato da matrícula ou rematrícula.
Às vésperas de iniciar o ano letivo, a vacina contra covid-19, que faz parte do Plano Nacional de Imunização (PNI), deixou de ser obrigatória para a matrícula em escolas de algumas cidades do RS. Nesta terça-feira, as prefeituras de Caxias do Sul e de Farroupilha, na serra, publicaram decretos que dispensam a obrigatoriedade de apresentação do atestado de vacinação no ato da matrícula ou rematrícula. Uma lei estadual, no entanto, diz que é obrigatório apresentar a carteira de vacinas na hora de matricular alunos em escolas públicas e privadas.
A lei 15.409/2019 estabelece que os pais ou responsáveis que não apresentarem a carteira de vacinação ou apresentarem a carteira desatualizada serão notificados no ato da matrícula ou rematrícula dos alunos. O texto também dá o prazo de 60 dias para apresentação da carteira atualizada, contando com “todos os registros prescritos, conforme a idade, no Calendário Nacional de Vacinação emitido pelo Ministério da Saúde”.
A prefeitura de Caxias do Sul alega que, como o imunizante contra a covid passou a integrar o PNI em janeiro deste ano, a secretaria de saúde local ainda não dispõe de doses para todas as crianças até 4 anos, 11 meses e 29 dias. A nota do município diz ainda que “cumprir com o calendário vacinal é responsabilidade de pais e responsáveis” e que cabe à escola orientar, acompanhar e divulgar as ações de vacinação do município.
A nota publicada pela prefeitura de Farroupilha ressalta que o decreto emitido na cidade desobriga a apresentação do comprovante de vacinação referente exclusivamente à vacina da covid-19. Continua necessária a apresentação da caderneta de vacinação com os demais imunizantes no ato da matrícula ou rematrícula escolar.
A Secretaria de Educação do RS informou que tem atuado com o Ministério Público e demais órgãos para demonstrar evidências científicas da importância e resultados individuais e coletivos da vacinação. Já a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre disse que, até o momento, não há exigência de vacinação para realizar a matrícula. “De qualquer modo, orientamos que todas as vacinas sejam realizadas”, diz a nota enviada pela pasta. Questionada sobre por que não exige a caderneta de vacinação mesmo com a existência da lei federal, a pasta ainda não se manifestou.
Para a Associação Mães e Pais pela Democracia, os decretos municipais que deixam de exigir a vacina das crianças contra a covid-19 para a matrícula na rede de ensino contrariam a ciência e prestarem um desserviço à saúde, além de serem ilegais. O advogado Júlio Sá, presidente da entidade, salienta que em 2020 o STF já definiu que é constitucional a obrigatoriedade de imunização através de vacinas que tenham sido incluídas no PNI. A Associação estuda as medidas cabíveis para buscar a nulidade dos decretos e garantir o direito de vacinação das crianças.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) diz que é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. “Mas a não vacinação não pode ser motivo para negar a matrícula”, ressalta Sá. “Pois, neste caso, a criança ou adolescente estaria sendo duplamente penalizado: primeiro, por não ser vacinado e ficar com sua saúde em risco. Depois, por ter seu acesso à escola negado”. O advogado diz que é preciso garantir a matrícula da criança e que sejam tomadas medidas, inclusive junto ao Conselho Tutelar, para exigir dos pais a vacinação dos seus filhos.
Em Santa Catarina, duas prefeituras que haviam emitido decretos desobrigando a vacina para matrícula em escolas voltaram atrás. A prefeitura de Joinville revogou o decreto uma semana depois de emiti-lo, após a abertura de um inquérito pelo Ministério Público de SC para apurar a legitimidade da norma.
A prefeitura de Criciúma também revogou um decreto da mesma natureza. No entendimento do juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública do município, dispensar a exigência de vacina contra a covid-19 para matrícula e rematrícula escolar viola decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o ECA, já que o Ministério da Saúde decidiu pela inclusão da vacina no PNI.
O Sindicato dos Enfermeiros no RS (SERGS) manifestou repúdio ao decreto emitido em Farroupilha. A categoria considera a norma um movimento contrário à ciência, aos dados epidemiológicos e a determinação federal e estadual de manter atualizados os calendários vacinais da população. A nota ressalta que as crianças e jovens passam 4 horas ou mais em ambientes nem sempre ventilados. “Os 700 mil óbitos pela Covid 19 no país parecem não ter sido suficientes para alertar aos gestores municipais da importância da vacina. […] Desestimular uma vacina enfraquece a cobertura vacinal de todo o calendário. Isso é crime”, conclui o texto.
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