MEC barra novos cursos de EaD
MEC barra novos cursos de EaD, sinaliza mais rigor com a qualidade e frustra setor mercantilista da Educação
Pasta ainda não permitiu credenciamento de instituições que pretendiam abrir cursos superiores em EaD sem conceito 4 no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes)
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 1 de dezembro de 2023
O congelamento do Ministério da Educação (MEC) em processos de autorização para novos cursos a distância em 17 áreas e em todos os cursos de licenciatura é comemorado por defensores de uma formação de qualidade para futuros professores no Brasil.
“Batalhamos muito por isso e finalmente o MEC dá um passo firme para combater a farra do EaD na formação de professores”, diz Priscila Cruz, presidente-executiva do Todos pela Educação.
A medida do MEC tem validade de 90 dias e se deu após consulta pública realizada no dia 20 de novembro pela pasta.
O prazo de suspensão está indefinido. Vai até a apresentação de uma proposta de nova regulação para cursos a distância no país pelo MEC. A medida não atinge graduações que já estão em funcionamento.
Gabriel Corrêa, diretor de Políticas Públicas do Todos Pela Educação, vê ainda uma importante sinalização do MEC.
“Que a coragem de fazer isso seja o início de uma grande mudança na forma com que o Brasil avalia, regula e apoia os cursos de formação de professores no país. A formação inicial precisa ser levada muito mais a sério do que foi nas últimas décadas”, recomenda.
Elevar a qualidade e atratividade
As licenciaturas, cursos de ensino superior que oferecem conteúdos direcionados à docência em determinada área do conhecimento, nos últimos anos estão com baixa procura no país.
Dados recentes do Instituto Semesp dão conta que na última década a procura por licenciaturas ficaram em 29,7%, enquanto em outros cursos superiores chegou próximo aos 50%.
“Limitar EaD, regular e avaliar qualidade nos cursos é um passo importante, mas não suficiente. Atratividade para a carreira é fundamental”, defende Priscila Cruz.
A dirigente do Todos pela Educação e integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico, Social e Sustentável do governo Lula, o Conselhão, sugere que o ministro da Educação institua um Fies Licenciaturas específico para formação de professores e mais agressivo, direcionado aos cursos com nota alta na avaliação, presenciais, com estágio e maior carga horária. “Precisamos elevar a barra na formação de professores”, alerta.
A decisão do MEC desagradou empresários de setores mercantilistas da educação que faturam com a expansão desordenada da EaD. O setor cresceu vendendo a ilusão de que o ensino remoto seria mais barato e possibilitaria o acesso à educação superior sem prejuízo do mercado de trabalho.
Ligado à Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), Associação Nacional de Universidades Particulares e Associação Brasileira dos Estudantes (ABE), o movimento EaD Inclui fez forte campanha pré-audiência pública do MEC pela a manutenção de cursos sob ameaça.
As mesmas entidades agora pedem que o MEC reavalie a sua determinação e abra um diálogo “amplo com as instituições”.
O entendimento é que a portaria “suscita incertezas” e deixa “em alerta mais de 2 milhões de estudantes das áreas afetadas”.
Para as entidades que atuam com EaD, a inclusão das licenciaturas na suspensão sugere uma decisão unilateral do MEC. As licenciaturas, segundo as associações, não integravam a consulta pública.
Em nota assinada por sua presidente, Elizabeth Guedes, que é irmã do ex-ministro da Economia Paulo Guedes, a Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup) afirma que a suspensão impactará quase 50% de estudantes de EaD, ou cerca de 2 milhões de alunos, dos quais 870 mil são das licenciaturas.
“Ao analisarmos os resultados da consulta, vemos que a sociedade demonstrou apoio à EAD de qualidade como meio de garantir o acesso ao ensino superior. O MEC, ao contrário disso, demonstra a intenção de proibir não apenas os 16 cursos em questão, mas potencialmente todos os cursos de EAD em nível superior”, afirma Elizabeth.
Para a dirigente da Anup, a medida gera “uma insegurança que se estende para as instituições que estavam planejando abrir novos cursos, deixando-as em um dilema sobre a viabilidade de seguir adiante, considerando a possibilidade de proibições futuras”.
Os cursos a distância em análise que foram suspensos são Biomedicina, Ciências da Religião, Direito, Educação, Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Geologia/Engenharia Geológica, Medicina, Nutrição, Oceanografia, Odontologia, Psicologia, Saúde Coletiva, Terapia Ocupacional, Licenciaturas em qualquer área.
Precarização e excesso de trabalho
Os problemas gerados pela expansão sem critérios da EaD no país foram abordados no V Seminário Nacional Profissão Professor, realizado pelo Sinpro/RS e demais sindicatos de professores do estado no final de outubro. O encontro aprovou uma resolução que alerta o MEC sobre a precarização da qualidade do ensino e das relações de trabalho, bem como o trabalho extraclasse gerado pelo crescimento desordenado desse setor.
As representações dos professores do ensino privado registram que a realidade de expansão da oferta da Educação a Distância no Brasil “constitui um fato sem paralelo dentre os países referência em Educação no mundo” e alertam que “tamanha proliferação” atendeu prioritariamente aos interesses econômicos e financeiros dos grandes grupos empresariais do ensino.
“As evidências colhidas junto ao mercado de trabalho atestam a formação precária e deficiente dos egressos dos cursos em EaD”, aponta o Sinpro/RS e demais sindicatos, que lamentam “que todo esse processo de expansão das ofertas educacionais em EaD tenha se alicerçado na precarização das condições de trabalho, de saúde e do empobrecimento dos professores”.
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