Médias do Enem no RS

Médias do Enem no RS

Por que os colégios Tiradentes têm as maiores médias do Enem no RS?

Especialistas apontam processo seletivo e maior renda familiar, enquanto coordenador das escolas destaca disciplina, meritocracia e maior carga horária

09/07/2020  MARCEL HARTMANN

Colégio Tiradentes de Ijuí / Divulgação

No pátio, alunos se dividem em pelotões, marcham e hasteiam a bandeira Colégio Tiradentes de Ijuí / Divulgação

A exigência de um minivestibular para entrar e a melhor condição financeira das famílias são as causas apontadas por educadores para explicar por que os colégios Tiradentes da Brigada Militar têm as maiores médias entre todas as escolas estaduais do Rio Grande do Sul no último Exame Nacional de Ensino Médio (Enem). Para o coordenador das sete instituições espalhadas pelo Estado, disciplina, meritocracia e maior carga horária explicam a conquista.

Seis das 10 maiores médias da rede estadual gaúcha na prova objetiva e na redação no Enem 2019 são de unidades do Tiradentes, segundo cálculo da startup de educação Evolucional, com base em dados do Ministério da Educação (MEC). Em primeiro lugar está o Colégio Tiradentes de Ijuí, que também tem a maior média entre todas as escolas estaduais do Brasil.

Se olharmos somente para a média da prova objetiva, os colégios Tiradentes estão em sete dos 10 desempenhos mais altos, mostra levantamento do jornal Folha de S.Paulo.

 

As unidades do Tiradentes no Estado estão espalhadas por Porto Alegre, Ijuí, Santa Maria, Santo Ângelo, Passo Fundo, Pelotas e São Gabriel. Atendem apenas ao Ensino Médio, com turno integral desde o primeiro ano – algumas unidades oferecem o dobro de horas-aula do que o exigido por lei ao longo do ano. Reforço e atividades extracurriculares esportivas e culturais marcam o turno inverso.

Todas as instituições são coordenadas pela Brigada Militar – portanto, mantidas pelo orçamento estadual, com professores alocados pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc). Não confundir com os colégios militares, que ensinam desde o sexto ano do Fundamental, são organizados pelo Exército e pagos pelo governo federal.

O dia a dia

Às 7h15min, todos os alunos dos Tiradentes se dirigem ao pátio, dividem-se em pelotões, marcham e hasteiam a bandeira. Meninas usam unhas cortadas e cabelo preso em trança, enquanto garotos devem aparar os fios.

Boas notas e ótimo comportamento são premiados trimestralmente com medalha ou alamar (espécie de corda pendurada no uniforme), o que institui um ambiente no qual estudantes competem em busca de alto desempenho.

A maior carga horária, a disciplina interna e o ensino da meritocracia explicam o bom desempenho dos jovens no Enem, afirma o tenente-coronel Carlos Augusto Gomes Rodrigues, subdiretor de Ensino da Brigada Militar e coordenador dos colégios Tiradentes.

A disciplina é fundamental e é um fator diferencial: a gente vê na rede pública alunos desrespeitando professores em sala de aula e de os próprios pais procurarem com agressão os professores. Isso não ocorre nos colégios Tiradentes: nossos alunos têm comportamento exemplar

TENENTE-CORONEL CARLOS AUGUSTO GOMES RODRIGUES - Coordenador dos colégios Tiradentes

— Temos uma série de procedimentos aplicados no dia a dia que nos leva a ter um desempenho diferenciado. O regulamento disciplinar é focado na meritocracia, então buscamos reconhecer os méritos dos alunos, tanto no campo intelectual quanto disciplinar. A disciplina é fundamental e é um fator diferencial: a gente vê na rede pública alunos desrespeitando professores em sala de aula e de os próprios pais procurarem com agressão os professores. Isso não ocorre nos colégios Tiradentes: nossos alunos têm comportamento exemplar. E, claro, com mais aulas, conseguimos aprofundar os conhecimentos — afirma.

Como é o acesso

Por ano, 90 vagas são abertas nos Tiradentes de Porto Alegre e Passo Fundo, e 60 nas outras unidades – 60% delas são destinados a filhos de profissionais da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros e outros 40%, para filhos de civis. É preciso realizar uma prova teórica com 25 questões de matemática e 25 de português, exame médico e exame físico (corrida, flexões e abdominais) para ser aceito. 

O tenente-coronel Rodrigues reconhece que, dos civis, a maior parte dos estudantes é de classe média ou média alta, que tem condições de pagar curso preparatório para o filho passar na seleção. Não há cotas, mas a Brigada Militar montou um comitê para implementá-las, no futuro, durante o processo seletivo, segundo o oficial. 

O processo é apertado a ponto de haver cursinhos focados no mercado. É o caso do Cursos Azambuja, de Porto Alegre, que deu aulas, no ano passado, para cerca de 400 alunos interessados em entrar em um Tiradentes.

 

Daniele Mascarenhas, coordenadora pedagógica da instituição, afirma que a concorrência do ano passado para entrar na unidade da capital gaúcha era de 16 candidatos por vaga – mais do que a densidade no vestibular para Direito, Relações Internacionais e Ciência da Computação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ela diz que os alunos precisam ter uma boa base teórica, empenho e dedicação, e que uma preparação de seis a oito meses é o ideal para ser aceito.

— O Colégio Tiradentes tem foco nos vestibulares e grande preocupação com a formação intelectual. Há preparação desde o primeiro bimestre do primeiro ano para aprovar os alunos no fim do Ensino Médio. Consequentemente, o Enem e o Ideb têm bom resultado. Há ainda a questão da disciplina e dos valores morais que são trabalhados, assim como o Colégio Militar — diz Daniele.

Professor de políticas educacionais da UFRGS, Juca Gil ressalta que, diferentemente de outras escolas estaduais, em que entram alunos de famílias pobres, nos Tiradentes e nos colégios militares se matriculam jovens com mais condições – por consequência, afirma, o bom desempenho da rede é fruto do corte feito na seleção.

Quando eles abolirem os exames de seleção e fizerem só sorteio para as vagas, aí poderão dizer que têm o melhor desempenho. Enquanto isso não for feito, eles só pegam a nata da nata

JUCA GIL   -  Professor de políticas educacionais da UFRGS

— No caso dos colégios militares e federais, a principal diferença não é a bobajada de metodologia pedagógica ou valores morais. Quando eles abolirem os exames de seleção e fizerem só sorteio para as vagas, aí poderão dizer que têm o melhor desempenho. Enquanto isso não for feito, eles só pegam a nata da nata. Não entra filho de desempregado nem de analfabeto. Para além disso, os Tiradentes não têm vagas para todos os filhos de brigadianos, então entra quem, dentre os brigadianos, dá maior estrutura para os filhos. É a seleção da seleção, só lidam com chantilly, nada de bolo — afirma.

Clarice Traversini, professora de Educação na UFRGS, destaca que as melhores condições de partida trazem frutos mais adiante, na formatura do Ensino Médio.

— A seleção escolhe aqueles que estão mais preparados para fazer um Ensino Médio. Entra um sujeito mais preparado e que quer estar naquele lugar, então está motivado. Aí, ele passa a estudar com foco no futuro e é mobilizado pelos professores a olhar para frente — diz.

 

https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2020/07/por-que-os-colegios-tiradentes-tem-as-maiores-medias-do-enem-no-rs-ckcf9z9g100270147uj1028bz.html?fbclid=IwAR05yXLzj9aDGMbKANJSD2RMTeqnGnKRn2ZKjnCXin07xVQah5tCO4CzVZo 

 




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