Meritocracia

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Bilionários, empresários e diversos outros sujeitos detentores de grandes fortunas se dizem unidos por um atributo: esforço; mas será que a acumulação de capital e riqueza realmente dependem apenas disso? Existe mesmo uma real possibilidade de ascensão social apenas pelo suor e trabalho? No presente artigo, buscar-se-á compreender o fenômeno da acumulação não a partir de seus mitos, mas de suas possibilidades concretas de realização. 

A ideia de mérito, apesar de amplamente difundida e reproduzida pelos mais diversos meios de comunicação, não esteve presente em toda história da humanidade. Ela, assim como qualquer outro conceito que permeia a vida humana, é produto de processos históricos específicos. 

Figura reproduzida do site: https://marcelopintodarocha.jusbrasil.com.br/artigos/139219306/meritocracia-e-os-5-principais-mitos-utilizados-para-sua-objecao


O nascimento da meritocracia está inserido em um processo mais amplo de negação e superação da estrutura feudal e aristocrática, na qual a riqueza, o prestígio e a posição social ocupada, decorriam de privilégios hereditários dos nobres e aristocratas. Neste sentido, o advento do capitalismo e sua consolidação como modo de produção, traz consigo, ao instituir a igualdade formal entre todos os sujeitos, uma suposta possibilidade de ascensão social, pois, teoricamente, todos são iguais e livres para ir atrás de seus sonhos e conquistar seus objetivos. Com isso, a riqueza e a posição ocupada na divisão do trabalho, passam a ser produto não de heranças e títulos, como na época do feudalismo, mas da soma de habilidades e esforços individuais realizados por cada um

A organização social baseada em valores meritocráticos é tratada como uma grande conquista da modernidade, uma vez que rompeu com a desumanização formal das classes subalternas, retirando do vocábulo jurídico a desigualdade explícita, através da institucionalização da igualdade. Certamente, tal mudança foi importante às camadas exploradas da sociedade, como os escravos, as mulheres e os povos racializados, pois possibilitou a conquista de direitos; todavia, sua existência não resolveu a questão social. A desigualdade concreta e a acumulação de riqueza continuam as bases do modo de produção capitalista, logo, os privilégios decorrentes de heranças não foram extintos. Os indivíduos que nasceram em famílias abastadas continuam tendo mais condições de “sucesso” do que os indivíduos provenientes de famílias pobres. 

A competição, celebrada pelos liberais, não acontece em termos justos a todos. Uma pessoa, nascida em uma família pobre, que precisou começar a trabalhar com 13 anos, não possui as mesmas possibilidades de ascensão do que uma pessoa, filha de pais ricos, que podia se dedicar apenas aos estudos. Apesar da disparidade da realidade de ambos, a sociedade acha justo que eles entrem em uma competição, pela mesma vaga de emprego ou na universidade, e atribui o sucesso ou fracasso obtido como resultado do simples esforço e dedicação. A meritocracia não leva em consideração os marcadores sociais que recaem sobre os indivíduos, enxerga apenas os resultados sem atentar-se ao ponto de partida.  

A individualização das questões sociais responsabiliza o indivíduo por sua condição. Sem o pano de fundo histórico-social o indivíduo passa a ser culpado pela vida que possui e sua miséria passa a ser fruto de sua falta de esforço, e não da estrutura social que o aprisiona em ínfimas possibilidades de sobrevivência e do Estado, o qual desde a década de 1970, com o avanço do neoliberalismo, é cada vez mais isento de suas responsabilidades sociais.

Outro fator que mascara o caráter predatório do sistema é o fato de alguns poucos sujeitos terem conseguido algum tipo de sucesso. Para defender a meritocracia são comuns os argumentos: “mas o Obama era negro e foi presidente dos Estados Unidos.”; “a Dilma era mulher e foi presidente do Brasil”; ou ainda “existem médicos e advogados negros, se eles chegaram lá, outros podem chegar”. É claro que a representatividade desses grupos marginalizados é importante, uma vez que abre espaço para que outros cheguem lá, porém esses são casos específicos. 

A grande maioria dos indivíduos racializados ainda vivem em áreas periféricas e ocupam subempregos, justamente porque não tiveram condições sociais viáveis para desenvolver suas potencialidades. Muitas mulheres, apesar de extremamente competentes, ainda são silenciadas e recebem salários menores do que os homens. Os pequenos exemplos de sucesso não podem apagar a realidade da maior parte da população. Não se pode fazer uma análise de qualidade se pautando apenas em particularidades e negligenciando a totalidade da realidade social.  

Evidencia-se, portanto, que a meritocracia não passa de um mito moderno, responsável por apenas culpabilizar os indivíduos por suas tragédias, sem, no entanto, permiti-los questionar as origens das profundas desigualdades sociais que assolam os países.

 

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