MPF pede esclarecimentos ao Inep
MPF pede esclarecimentos ao Inep sobre comissão que vai fiscalizar o conteúdo do Enem
Em ofício encaminhado nesta quinta-feira ao Inep, a procuradora federal Deborah Duprat solicitou documentos comprovando que o Inep seguiu as regras sobre a avaliação do processo de aplicação do Enem que constam em portaria de 2017. Inep diz que responderá dentro do prazo estipulado.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal (MPF), enviou nesta quinta-feira (21) ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) um ofício pedindo esclarecimentos sobre a comissão criada nesta semana para fazer uma "leitura transversal" das questões que compõem o Banco Nacional de Itens do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
O objetivo da comissão, segundo o Inep, é "verificar a sua pertinência com a realidade social". O resultado do trabalho não será divulgado. A procuradora determinou um prazo de cinco dias para que o Inep envie a resposta e "toda a documentação pertinente".
Procurado pelo G1, o Inep afirmou que "recebeu o ofício da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e o responderá tempestivamente, dentro do prazo estipulado de cinco dias". A autarquia também afirmou que a comissão já deu início à análise das questões nesta quinta e encaminhou links para a portaria publicada na quarta (20) e a nota técnica que detalha as regras.
No ofício, a procuradora federal Deborah Duprat usa uma regra que consta em portaria publicada pelo próprio Inep em 2017 para solicitar esclarecimentos a respeito das motivações para a criação da comissão.
Duprat considerou a "leitura transversal" do banco de itens um "propósito extremamente vago" para verificar se os itens são pertinentes com "a realidade social, de modo a assegurar um perfil consensual do exame". E ainda citou uma jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre "abuso de poder", na qual o STF afirma que "o Estado não pode, no desempenho de suas atribuições, dar causa à instauração de situações normativas que comprometam e afetem os fins que regem a prática da função de legislar".
Trecho do ofício enviado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do MPF, ao Inep, sobre a comissão de fiscalização das questões do Enem — Foto: Reprodução
Ela também afirma que, segundo uma portaria do próprio Inep, a autarquia deve realizar avaliações contínuas do processo de realização do Enem, com articulação permanente com especialistas em avaliação educacional e instituições de educação superior, mas que essa mesma portaria determina que "a avaliação do Enem se dá a partir dos seus resultados anteriores".
No documento, a procuradora solicita quatro informações ao presidente do Inep, Marcus Vinicius Carvalho Rodrigues:
- Quais foram as avaliações realizadas em relação ao Enem 2018 "que levaram à conclusão da necessidade de adoção da etapa técnica de revisão de itens da BNI denominada 'leitura transversal'";
- Quais foram profissionais especialistas em avaliação educacional e quais instituições de educação superior participaram dessa avaliação;
- Quais os critérios sugeridos nessa avaliação para análise da pertinência dos itens da BNI "com a realidade social, de modo a assegurar um perfil consensual do Exame";
- Qual é a qualificação técnica e profissional dos membros da comissão instituída nesta semana.
Nota técnica do Inep
Na nota técnica divulgada pelo Inep nesta quinta, assinada por Paulo Cesar Teixeira, diretor Avaliação da Educação Básica, o órgão diz que a leitural transversal dos itens do Enem faz parte de uma "rotina fundamental para a construção do exame", e que ela "pode acontecer previamente à montagem do instrumento, com vistas a diminuir os riscos de se promover alterações na prova após o término de sua montagem".
Ainda segundo o Inep, "alterações que decorram depois do instrumento montado e itens escolhidos podem modificar todo o desenho psicométrico da prova, o que implica em retrabalho técnico".
A nota diz também que "a leitura transversal é uma etapa técnica de revisão de itens, cujo objetivo é identificar abordagens controversas com teor ofensivo a segmentos e grupos sociais, símbolos, tradições e costumes nacionais".
"Tal leitura deve ser realizada pela equipe técnica que elabora o instrumento. Recomenda-se, ainda, que avaliadores externos atuem no processo de validação de conteúdo dos itens, de forma que a análise não perpasse aspectos formais e pedagógicos, mas temáticas que não se coadunam com os objetivos do exame", continua o diretor. "Quando a leitura transversal é realizada por comissão externa, a equipe técnica responsável pelo instrumento deve oferecer subsídios que garantam a montagem do teste, esclarecendo os parâmetros psicométricos, o desenho esperado da prova e garantindo ao atendimento do rege a legislação e matriz de referência do exame".
Entenda o caso
A comissão criada pelo Inep é uma resposta a críticas feitas no ano passado pelo então candidato Jair Bolsonaro, que, já eleito para a Presidência, disse que tomaria conhecimento das questões antes da prova.
De acordo com o documento publicado nesta quarta-feira (20) no "Diário Oficial da União", "a leitura transversal é uma etapa técnica de revisão de itens". Em nota, o Inep informou que nenhum item será descartado já que o processo de elaboração das questões é "longo e oneroso". Ainda de acordo com o Inep, as questões consideradas "dissonantes" serão "separadas para posterior adequação, testagem e utilização, se for o caso".
Três pessoas foram destacadas para trabalhar na leitura dos itens:
- Marco Antônio Barroso Faria (secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior do MEC);
- Antonio Maurício Castanheira das Neves (diretor de estudos educacionais do Inep);
- Gilberto Callado de Oliveira (procurador de justiça de Santa Cataria, representante da sociedade civil).
Eles terão dez dias, a partir desta quarta (20), para concluir a avaliação e emitir uma recomendação sobre o uso ou não dos itens na montagem do exame. Depois, o diretor da Avaliação Básica fará outro parecer sobre as considerações da comissão. A decisão final ficará a cargo do presidente do Inep, Marcus Vinícius Rodrigues.
Segundo a portaria, "todas as atividades serão realizadas em Ambiente Físico Integrado Seguro (AFIS) do Inep", que fica em Brasília, dentro da sede do Inep. Eles assinarão um termo de confidencialidade e sigilo.