Nada a comemorar

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Nada a comemorar: educadores(as) relembram atrocidades da ditadura

 

“Estávamos dando aula quando ouvimos o barulho de um jipe do exército entrando. Sem falar nada, levaram o secretário da escola. Ele foi e não retornou. Só fomos vê-lo novamente um ano depois. Sofreu abuso e foi torturado. Não era mais a mesma pessoa. Era tanto medo que sequer tínhamos coragem de comentar a situação entre nós”, recorda Rosemari Faria Silva, à época professora de História e Francês da rede estadual, além de alfabetizadora.



Controle, ameaças, repressão, intimidação, tortura. O regime autoritário iniciado em 64, que assassinou e prendeu ilegamente cerca de 20 mil brasileiros(as), também instaurou o medo e a censura nas escolas e salas de aula da rede pública.

O autoritarismo contaminava, também, o processo pedagógico e censurava o conteúdo trabalhado em sala de aula e disponível nos livros adotados. “Eles pegavam os meus cadernos na sexta-feira e só entregavam na segunda. Era a forma de controlar o conteúdo ensinado. Havia muita pressão. Diariamente a ameaça de demissões com alegações infundadas pairava sobre nós ”, recorda a ex-professora de História, atualmente aposentada, Rita Sanco.



Além da forte repressão e violência física contra os(as) educadores(as) durante as manifestações, havia a autocensura e a pressão psicológica contra aqueles que participavam das ações do Sindicato.

“Nos chamavam na CRE e diziam, tentando falar em tom de orientação amistosa, que não deveríamos participar das mobilizações do Sindicato porque isso poderia ser considerado um ato subversivo. Nos mostravam claramente que vigiavam todos os nossos passos. Era assustador”, relata Rosemari.



“Colegas eram orientados a não conversarem com professores que participavam de manifestações. Eu era muito jovem e não vinha de uma família com maior consciência política, então no começo não entendia o que estava ocorrendo”, lembra Rita.

Em 1976, professores(as) começam a discutir publicamente suas reivindicações, veiculando notas na imprensa para conclamar a classe a posicionar-se sobre a pautas salariais e a luta por valorização profissional.  Hermes Zaneti, presidente do CPERS de 1975 a 1979, fala das dificuldades do período.

“A conjuntura era de repressão e foram utilizadas todas as formas de intimidação para desestimular quem tentasse organizar-se em sindicato, em associações. Do ponto de vista do enfrentamento para o fim do regime militar no Brasil, o movimento de professores prestou uma grande contribuição”, afirma Zanetti.

O CPERS foi o carro chefe das grandes mobilizações realizadas na época, que reuniam milhares de educadores(as). O magistério foi a primeira categoria do estado e a segunda do Brasil a entrar em greve após o golpe militar. Em 1979, durante o governo de Amaral de Souza (ARENA), foi realizada a primeira greve, que durou 13 dias e teve grande adesão da categoria.

Em 1982, o Sindicato chegou a sofrer ameaça de intervenção, recurso utilizado pela Ditadura para controlar organizações trabalhistas. A professora Zilah Totta, então presidente do CPERS, articulou-se com a bancada federal e a proposta de intervenção foi engavetada. “Eles queriam acabar com os sindicatos, principalmente com o CPERS, que era a principal frente contra a exploração e a dominação da Ditadura”, observa o diretor do CPERS, professor Enio Manica.

Ele ressalta que, na época, as direções eram todas indicadas, pois eram cargos escolhidos para vigiarem as ações dos(as) educadores(as). “Na escola em que eu atuava, a direção impedia que a gente comunicasse aos colegas as decisões das assembleias do Sindicato. Foi então que um colega nos ofereceu um galpão que ele tinha e passamos a fazer daquele local o nosso comitê para fortalecer o movimento”, relembra.

Ao recordar o passado, Rosemari, Rita e Manica destacam o papel fundamental que o Sindicato exerceu para impedir o avanço das atrocidades do Regime Militar. “Foi no CPERS que entendi e aprendi a importância da luta. Foi a minha base para seguir na luta pelos nossos direitos até hoje”, avalia Rita.



“Lembro que vinham educadores(as) de todo o estado para as mobilizações em Porto Alegre. Um Sindicato combativo e forte, que não se rendeu diante dos absurdos praticados pela Ditadura”, afirma Rosemari.

“A gente passava nas escolas e percebia a consciência de que era fundamental o papel do sindicato. A criação dos 42 núcleos também ajudou a fortalecer a entidade. Mesmo diante da ditadura, tivemos a capacidade de unificar os educadores e conseguimos ter conquistas”, afirma Manica.

 

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