NEM com 746 novas disciplinas

NEM com 746 novas disciplinas

Novo Ensino Médio conta com 746 novas disciplinas, só 4% de educação midiática

Em janeiro deste ano, circulou no X (antigo Twitter) a grade curricular de um estudante da rede estadual do Rio de Janeiro. Títulos como “O que rola por aí?”, “Vamos jogar?” e “Ação! Está em suas mãos” em disciplinas ao lado de Matemática e Português trouxeram estranhamento nos seguidores que reagiram alegando uma precarização do ensino com o Novo Ensino Médio.

A proposta de reformulação do segmento prevê maior flexibilização do currículo com uma parte comum, a Formação Geral Básica, e os itinerários formativos que seriam da escolha dos alunos. É nesta última parte que cada rede de ensino passou a criar disciplinas. Lupa fez um levantamento inédito nos currículos dos 27 estados e no Distrito Federal e mostra que foram criadas 746 disciplinas e somente 34 abordam educação midiática e desinformação.

O dado é alarmante, já que um dos pontos principais dos defensores da reforma do ensino médio é que ela permitiria a criação de disciplinas mais relacionadas com o tempo presente. Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 67% dos jovens brasileiros não sabem diferenciar fato de opinião e, recentemente, a Prefeitura do Rio de Janeiro levantou um debate ao proibir o uso de celulares em sala de aula. Neste cenário, a criação de componentes curriculares que abordem o uso das mídias é fundamental. 

Lupa analisou todas as centenas de ementas para identificar o conteúdo que está por trás de nomes apelativos como os apresentados. O ensino médio é de responsabilidade dos governos estaduais, e alguns tiveram posicionamentos mais conservadores na elaboração de seus currículos, enquanto outros trouxeram mais inovações. 

O Distrito Federal, por exemplo, é recordista e criou 231 disciplinas, cerca de 30% do montante nacional. A rede na capital federal dividiu os itinerários por áreas do conhecimento (Humanas, Ciências da Natureza, Matemática e Linguagens). A área que aborda predominantemente educação midiática e desinformação é a de Linguagens, com cursos como “Introdução à análise do discurso” e “Tecnologias Digitais” dividindo o leque de possibilidades com “Mandala Florística” e “Oficina de Slackline”. Uma das disciplinas, inclusive, faz referência ao “Fato ou Fake”, serviço de checagem do Grupo Globo.

São Paulo é o estado que promoveu mudanças mais conservadoras: fez aprofundamentos nas disciplinas tradicionais como Matemática e Português com inclusão de temas como Educação Financeira e Robótica.

Evidente que, com tantas criações, surgem temáticas curiosas como “Relaxamento, Yoga e Mindfulness”, em Minas Gerais; o “Apiário”, no Distrito Federal; “Qual é o mesmo valor de X?” na Bahia; “Saia da Bolha”, no Mato Grosso e “Semioses do Olhar”, em Pernambuco. Ainda assim, muitas iniciativas mostram a relevância da educação midiática e desinformação como “Leitura e Compartilhamento no Mundo Virtual”, em Minas Gerais; “Cidadania Digital”, no Distrito Federal, “Juventude Conectada em Ação”, no Mato Grosso e “Cibercultura” em Pernambuco. 

Quanto à “Ação! Está em suas mãos”, citada no início do texto, a ementa mostra que a disciplina é bem mais profunda do que o nome apresenta e quer elaborar um “núcleo de estudos para a produção de mídias, utilizando diversos gêneros (reportagens, podcasts, roteiros, notícias, campanhas, gamificação etc), considerando o protagonismo dos estudantes”. 

O levantamento mostra uma outra lição da educação midiática: tal como não se deve julgar um livro pela capa, um título pode não conter toda a informação necessária; é preciso pesquisar e ir além das palavras apelativas. 

Raphael Kapa
Coordenador de Educação

FONTE:

lupa@lupa.news 




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