NEM, nome-fantasia da reforma educacional
Novo Ensino Médio (NEM) é o nome-fantasia da reforma educacional deflagrada em 2016 pela Medida Provisória 746.
A indigesta MP foi convertida na Lei n° 13.415/2017, a base daquilo que, hoje, o antiministério da educação propagandeia como imitação clichê de trailer cinematográfico e que as redes estaduais de ensino empurram a adolescentes de 15 anos com pesquisas de opinião fajutas e mensagens de incentivo ao exercício da liberdade de escolha e do protagonismo juvenil.
Projeto de vida, emprego dos sonhos, arquiteturas curriculares flexíveis, inovação, empreendedorismo, tecnologias digitais e um extenso menu de percursos de aprofundamento – a escola adaptada às necessidades de seus estudantes e conectada ao mundo contemporâneo.
É com essa linguagem a um só tempo vazia e sedutora, herdeira das novíssimas tradições do 'life coaching' e das empresas de facilitação, que os papagaios da reforma do ensino médio tentam desviar a atenção daquilo que o Novo Ensino Médio realmente opera e produz: uma ruptura com a universalidade da escola pública no Brasil.
É triste. É desolador.
Projeto de vida?
Que projeto?
Aquele de trabalhar até morrer ou morrer trabalhando?
Sim, porque a reforma da previdência não dá outra alternativa!
Emprego dos sonhos?
Qual?
Aquele em que o trabalhador não tem nenhum direito, mas é respeitosamente chamado de colaborador?
Nossa! Sempre sonhei com isso! Pesadelo o nome do sonho!
Empreendedorismo?
Chama-se de microempreendedor individual o desempregado que trabalha precariamente e não consegue nem pagar INSS.
Fundo de quintal produtivo que se diz.
Trabalhar de dia pra comer à noite.
"Tem que enfrentar a crise! se virar nos 30!"
Ranço profundo por essa romantização do sofrimento!
Educação Financeira?
Conformar-se que "na volta a gente compra". Fazer de conta que acredita. Repetir isso a si mesmo, aos filhos, aos netos.
Currículos flexíveis?
Não!
Não se pode chamar desigualdade de flexibilidade.
Estudantes de escolas públicas estão sendo privados do acesso à informação.
Criminoso isso. Desumano.
O acesso à universidade é, ainda, por meio de processo seletivo. Como responder e dissertar sobre o desconhecido?
No Novo Ensino Médio, Ciências Humanas e Sociais só se forem "Aplicadas". Ciências da Natureza, Linguagens e Matemática só em intersecção com "suas Tecnologias".
Se o mercado aponta, por exemplo, que designers de jogos ou operadores de planilhas eletrônicas estão em falta, o ensino médio público suprirá essa demanda por mão-de-obra.
Já se esses trabalhadores terão o repertório necessário para compreender a lógica das planilhas ou para criar o conteúdo artístico dos jogos e aplicativos, este problema não mais competirá à escola pública.
O negócio é despejar profissionais no mercado. Sem critério. Sem planejamento.
Sem respeito vocacional.
Sem sequer análise de demanda.
Nada. Nada. Nada.
A meta é o esvaziamento das universidades públicas.
É a pseudoelite brasileira incomodada em dividir espaços com os pobres.
É o ódio ao PT, que começou quando o filho da empregada virou doutor.
Esse mesmo ódio está a transformar engenheiro em uber.
Às vezes eu esqueço que ainda há um antiministério da educação no Brasil.
Mas quando me deparo com as declarações do pastor antiministro, lembro que não é por acaso tamanho descaso.
Aliás, no ápice de desprezo pela educação, Milton Ribeiro disse:
"Tem muito engenheiro dirigindo Uber."
A solução, para o limítrofe, é parar de estudar.
Surreal se qualquer pessoa dissesse isso.
Quando vem daquele que é responsável pela educação a nível federal, aí é desesperador!
"A universidade deveria, na verdade, ser para poucos."
RIBEIRO, Milton (2021)
...
"O Enem é uma prova caríssima. Não é para todo mundo. Não dá."
RIBEIRO, Milton (2021)
Pra não restar dúvidas quanto ao rancor, ele ainda afirmou que reitor de universidade não pode ser lulista nem 'esquerdista'.
A gente logo vê o nível de analfabetismo político de uma pessoa quando ela usa a expressão 'esquerdista'.
E a gente vê no aparelhamento ideológico das reitorias as garras do totalitarismo.
Há dias eu tenho tentado escrever sobre o absurdo sem tamanho que é ver um país que já teve os recursos do pré-sal destinados à educação, que teve a criação e a implementação de universidades como prioridade, que viu a pesquisa e a ciência receberem investimento... agora, refém do fascismo.
Inúmeras vezes eu comecei a escrever.
Parei.
Retomei...
A falta de concentração e o desânimo não me permitiam concluir o raciocínio...
É a desesperança querendo se apropriar de mim! Mas eu não permito!
Eu escrevo para realizar a informação.
Para processar os fatos.
Para me manter consciente.
Para não perder a capacidade de indignação.
Eu sempre digo que a educação é arquirrival do fascismo porque a educação destrói o totalitarismo e, portanto, tiranos têm a necessidade de aniquilar a educação.
Acabar com a educação e com a perspectiva de futuro que ela representa é um projeto do bolsonazifascismo.
Elitizar. Excluir. Segregar.
As falas de Milton Ribeiro vêm ao encontro do projeto de crise educacional que está sendo meticulosamente colocado em prática desde 2016.
O objetivo é aviltar as universidades públicas brasileiras e utilizar o ensino médio como ferramenta para a criação de mão-de-obra barata e obediente.
Ah... o antiministro disse também que não acha justa a lei das cotas.
Nas palavras do mentecapto antiministerial, são os pais dos filhinhos de papai que pagam os impostos que mantêm as universidades e que, portanto, eles não podem ser prejudicados.
[Pausa para chorar. E para entender por que eu custei tanto a escrever sobre isso. Dói!]
Os mais cínicos dirão que foram os próprios estudantes, no pleno exercício do seu protagonismo, que escolheram trocar a sua formação escolar geral por cursinhos profissionalizantes precários.
Eu sei que foi fascismo.
Massacre do futuro.
Destruição.
Crime.
Ter consciência é bom. Mas dói!
Colegas, professores!
Somos grãos de areia num tsunami!
Preparamos nossos alunos e alunas para ingressarem na universidade!
E para que usem o conhecimento acadêmico para fazer a diferença para melhor no mundo! No seu mundo...
Semeamos o sonho da transformação social através da educação!
Fazemos com que os estudantes acreditem que é possível! Que se é sonhável, é realizável!
Tudo isso em um sistema que boicota o nosso trabalho. Com que frequência? O tempo todo!
O que nos resta?
A utopia!
E para que serve a utopia?
... Ah, Galeano!
Sigamos! Rumo ao horizonte!
A Filosofia é perigosa para os fascistas.
Porque instiga a pensar.
E fascistas têm medo de quem pensa.
Porque quem pensa questiona.
E quem questiona muda o mundo!