Nova matriz curricular do EM

Nova matriz curricular do EM

Nota da APP-Sindicato critica nova matriz curricular proposta pelo governo Ratinho Jr. para o Ensino Médio

Posicionamento destaca que, ao desvalorizar disciplinas de humanidades, governo faz opção ideológica para agradar mercado e impedir que os(as) estudantes desenvolvam o pensamento crítico.


Foto: Favor OF God / Canva

A direção estadual da APP-Sindicato divulgou nesta sexta-feira (19) um posicionamento sobre conteúdo da Instrução Normativa Conjunta 15/2025 DEDUC/DPGE/SEED, que dispõe sobre a matriz curricular do Ensino Médio da rede estadual de ensino do Paraná, publicada ontem (18), pela Secretaria da Educação (Seed). O sindicato critica o documento e classifica a desvalorização das disciplinas de humanidades como uma opção política e ideológica do governo, para atender os interesses do mercado, favorecer interesses políticos, controle e vigilância e impedir a formação de cidadãos críticos. 

“Defendemos um currículo orientado para a Formação Humana Integral. Rejeitamos a manutenção de uma matriz que, mesmo após a Lei 14.945/2024, segue priorizando Matemática e Língua Portuguesa desproporcionalmente, como opção política e ideológica. Reivindicamos uma matriz curricular equilibrada, que valorize todas as áreas do conhecimento e promova uma formação humana, crítica e cidadã. Isso inclui a garantia de carga horária adequada para as disciplinas de Humanidades”, destaca a nota.

O posicionamento da APP-Sindicato também chama a atenção para outras questões preocupantes, como modalidade de ensino híbrido para o noturno – que é frequentado em sua maioria por estudantes que trabalham durante o dia e possuem maior necessidade de acompanhamento -, e com a oferta de Língua Espanhola com matrícula facultativa via CELEM, em contraturno, o que possibilita transformar o direito em cumprimento formal e não uma garantia. Leia abaixo a íntegra da nota.

POR UMA MATRIZ CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO QUE CONTEMPLE AS HUMANIDADES E QUE PROMOVA A FORMAÇÃO HUMANA, CRÍTICA, CIDADÃ E EMANCIPATÓRIA

Em julho de 2024, foi aprovada a Lei 14.945, que apresenta modificações à Lei 13.415/2024 (Novo Ensino Médio). Dentre as principais mudanças está a reorganização da carga horária mínima, redistribuindo as aulas entre formação integral (com 2.400 horas-aula) e itinerários formativos (com 600 horas-aula).

Essa mudança, ainda que esteja longe do que desejam os movimentos em defesa da educação pública, sindicatos e da CNTE, representou alterações significativas na oferta do Ensino Médio. Na forma original da lei, havia previsão de 1.800 horas-aula para Formação Geral Básica e, as demais, 1.200 horas-aula, para a oferta de Itinerários Formativos. A oferta dos Itinerários Formativos causou grande confusão nas redes. Disciplinas como Startups e Mentalidade Empreendedora e Liderança e Alta Performance foram implementadas nas redes públicas.

O aumento da carga horária geral e definição dos itinerários articulados com a Formação Geral Básica e com a área de aprofundamento representou um avanço em relação ao laissez-faire que virou a oferta dos itinerários formativos. O aumento da extensão da Formação Geral Básica abriu a possibilidade do aumento da oferta das disciplinas de Sociologia  e Filosofia.

No entanto, desde a implantação das BNCC, sob fortes críticas dos setores progressistas, sabíamos que o currículo estaria orientado para uma lógica neoliberal. Os conceitos de Competência e Habilidade, muito comuns nas décadas de 90, foram reativados pelos atuais reformadores educacionais e imprimem à Base Nacional a conformação à lógica atual do capital. 

A ênfase em Matemática e Português (ou língua materna) deve-se, entre outras razões, à possibilidade de serem conteúdos amplamente avaliados por testes de larga escala que servem de comparação entre os estados, como no caso do SAEB, ou entre nações – exemplo, o PISA. Isso permite às redes estabelecer rankings entre as escolas e metas de desempenho e cria-se um sistema de responsabilização (accountability). 

Os reformadores defendem que: o que não pode ser medido, não pode ser gerido. Além disso, o mercado, em muitos casos, atua numa lógica de empregabilidade mínima, na qual o letramento funcional em português e em matemática é suficiente para o desempenho profissional, e assim possam se adaptar a tarefas rotineiras e operar tecnologias básicas.

Para a administração das redes, como no caso da Seed, o currículo enxuto, o foco no que é necessário à atual forma de organização do capital e a redução de custos que a organização curricular oferece, permite a redução de contratação de professoras(as), concentra carga horária e facilita a reorganização de pessoal, se for necessário, mesmo que isso promova docentes polivalentes, responsáveis por disciplinas que nem sempre têm formação específica, que além de desqualificar o trabalho docente ainda fragiliza a identidade profissional e possibilita o aumento e controle pedagógico.

Assim, o controle pedagógico atrelado a um rígido sistema de metas e accountability, o foco curricular em Matemática e Português que estão presentes tanto na parte de Formação Geral como nos Itinerários Formativos de Aprofundamento e a adequação curricular promovida pela BNCC, fazem parte da recém-publicada matriz curricular para o Ensino Médio Regular. A Instrução Normativa 15/2025 (DEDUC/DPGE/SEED), publicada no dia 18 de dezembro de 2025, traz um conjunto de normas que dispõem sobre a organização da matriz curricular para o Ensino Médio e, em seus anexos, as matrizes propriamente ditas.

Os componentes curriculares de Matemática e Português são amplamente contemplados. Trata-se de uma opção política e ideológica deste governo. Valoriza-se o que é visto como produtivo para o mercado. Outros componentes como Educação Digital, Computação (Programação e IA), Robótica e Educação Financeira são incluídos na matriz, enquanto outros como Sociologia e Filosofia – talvez por serem críticos demais, ou ainda, Artes e Educação Física tratadas como acessórios culturais, atividades recreativas e não reconhecidas como conhecimento a ser apreendido, são deixadas de lado com uma carga horária ínfima ao propósito pedagógico que ensejam, de produção de aprendizagens críticas, qualitativas, processuais e expressivas – educam a criatividade, o olhar e o corpo. E agora, Química e Biologia aparecem no alvo da lógica reducionista. Ratinho Jr. e Roni Miranda estão empenhados em vender o estado do Paraná como o que tem a melhor educação do Brasil. Isso serve aos propósitos eleitorais de ambos. 

Além das questões que envolvem a matriz curricular em si, o texto da Instrução 15/2025 traz outros elementos que precisam ser observados:

- a previsão de transição para 2026 das 1as e 2as séries pode aumentar a complexidade escolar, com regras diversas entre as turmas;

- a falta de infraestrutura, equipamentos, internet, suporte e formação docente para disciplinas como Robótica, Educação Digital e Programação pode resultar em um aprofundamento das desigualdades entre quem tem estrutura e quem não tem e será usada como cobranças nas escolas;

- persiste a situação da oferta do Espanhol com matrícula facultativa via CELEM em contraturno e  tende a virar cumprimento formal e não direito efetivo, como previsto no § 9º do art. 179 da Constituição do Estado do Paraná, incluído pela EC 52/2022. São necessárias as condições de acesso com horário, abertura de turma, professora/professor presencial para que se configure como um direito;

- a oferta de carga horária híbrida no noturno talvez não seja a melhor solução, mas se apresenta como viável diante da exigência do cumprimento das 3.000 horas-aula. É preciso um acompanhamento cuidadoso da oferta das disciplinas em EAD – serão no total de cinco horas-aulas por semana – justamente por ser um turno no qual as(os) estudantes são trabalhadoras(es) e têm dificuldades maiores no acompanhamento de aulas híbridas ou em EAD;

- a rede do Paraná é diversa pela escolha política que se fez. Convivem escolas de tempo integral, escolas Paraná Integral, militarizadas, privatizadas, além das escolas indígenas, quilombolas, do campo e das ilhas e, por fim, as escolas regulares. Evidencia-se uma diversidade de matrizes que podem promover as desigualdades entre as escolas para além do que é hoje e, no caso, das escolas militarizadas, uma cultura de controle e disciplinamento que interfere e desloca o foco do pedagógico. A ausência de debate prévio com as comunidades escolares – em especial debate com as(os) professoras(es) – reduz a autonomia real da escola e a gestão democrática do currículo, porque a comunidade escolar vira uma executora de um projeto pedagógico determinado pela SEED.

Nesse sentido, defendemos um currículo orientado para a Formação Humana Integral. Rejeitamos a manutenção de uma matriz que, mesmo após a Lei 14.945/2024, segue priorizando Matemática e Língua Portuguesa desproporcionalmente, como opção política e ideológica. Reivindicamos uma matriz curricular equilibrada, que valorize todas as áreas do conhecimento e promova uma formação humana, crítica e cidadã. Isso inclui a garantia de carga horária adequada para as disciplinas de Humanidades. É necessário garantir a oferta de Língua Espanhola como componente curricular obrigatório presencial em todas as escolas da rede.

Defendemos o fim de conteúdos sem densidade pedagógica, que se mostram orientados para cumprir a vontade do mercado e que não dialogam com uma formação sólida que conteúdos historicamente produzidos pela humanidade, como Sociologia e  Filosofia, possuem.

Exigimos o acompanhamento sistemático das cinco horas semanais híbridas propostas no noturno, para que as(os) estudantes trabalhadoras(es) não sejam prejudicadas(os) e a EAD não substitua o ensino presencial de forma precarizada.

Por fim, que nossas escolas não sejam mera executoras de uma matriz curricular que não passou por nenhum debate prévio com as(os) trabalhadoras(es). Reafirmamos a autonomia escolar, a gestão democrática e um currículo humano, crítico e emancipador.

O que desejamos não são somente ajustes técnicos, mas uma mudança de orientação política do currículo, rompendo com a lógica neoliberal, de controle, mensuração e redução de custos, reafirmando a educação pública como direito social.

>> Instrução Normativa Conjunta 15/2025 DEDUC/DPGE/SEED – Dispõe sobre a Matriz Curricular do Ensino Médio da rede estadual de ensino do Paraná.

Curitiba, 19 de dezembro de 2025
Direção Estadual da APP-Sindicato

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FONTE:

https://appsindicato.org.br/nota-da-app-sindicato-critica-nova-matriz-curricular-proposta-pelo-governo-ratinho-jr-para-o-ensino-medio/ 

 

 




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