Novo EM: implicações
Reflexões do Coletivo da AE Sindical - MUDA CPERS:
“NOVO” ENSINO MÉDIO: IMPLICAÇÕES DESSE RETROCESSO
“Contra as ideias da força, a força das ideias!”
Florestan Fernandes
Qual é a proposta do Novo Ensino Médio e os impactos na formação das juventudes e da educação brasileira, regulamentado e em implementação nos estados? Quais as principais alterações curriculares? Isso dialoga com a educação socialmente justa referenciada para as juventudes? A escolha de dois itinerários educativos pelos estudantes garantem aprendizagem dos estudantes? Sabendo-se que serão obrigatórias apenas três disciplinas: Português, Matemática e Língua Inglesa, quais os prejuízos que essa redução de obrigatoriedade traz a estudantes e educadores? Quais as implicações do notório saber e parcerias público-privadas em relação aos recursos humanos? Se nem estudantes, nem comunidade escolar, nem educadores são beneficiados pelo Novo Ensino Médio, ele atende e está a serviço de que interesses?
São algumas questões relativas à Lei nº 13.415/2017 e suas implicações que precisamos discutir entre educadores, estudantes e comunidade escolar e acadêmica para balizar a análise e debate urgente, para resistir a esse atentado nessa etapa escolar. Cabe inicialmente destacar a origem dessa Reforma por meio de Medida Provisória, na esteira da Emenda Constitucional nº 95, a qual congela investimentos nas áreas sociais por vinte anos e no bojo das Reformas da Previdência, Trabalhista e fomento à Reforma Administrativa. O cenário é de retrocessos no que tange ao direito à educação das juventudes, especialmente do ensino público, marcado pela ausência de investimentos e falta de projeto articulado para a Educação Básica. A Reforma do Ensino Médio dá-se neste processo de amplas reformas anti povo, autoritárias e sintonizadas com interesses mercadológicos, que reduzem direitos sociais, atingindo especialmente a classe trabalhadora.
É notório e sempre esteve no nosso horizonte a necessidade de mudanças na formação juvenil, dadas as dificuldades de acesso, permanência e qualidade na formação, especialmente de filhos e filhas da classe trabalhadora. Todavia esse processo não aconteceu com a participação de todos os envolvidos no Ensino Médio. A comunidade escolar não foi ouvida em nenhum momento na definição da referida reforma, tampouco houve formação para educadores que atuam diretamente nessa etapa de formação educacional.
A intensidade e o enfoque da propaganda do MEC para a Reforma do Ensino Médio “vende” a ideia de o Novo Ensino Médio que irá qualificar a formação da juventude e respeitar suas escolhas. A publicidade escamoteia o real interesse desse projeto educacional, a privatização da educação pública e uma formação de competências e habilidades de jovens que atende a meros interesses do mercado. Uma reforma que legaliza uma escola diferente para cada classe social: uma formação para trabalho simples e mão de obra barata e uma formação para dirigentes.
A Constituição Federal de 1988 estabelece como um dos direitos sociais, o direito à educação, portanto essa universalização é dever do estado garanti-la aos cidadãos. A Lei de Diretrizes e Bases estabelece a etapa do ensino médio como parte da educação básica.
A implementação do “Novo” Ensino Médio acontece num contexto em que mais de 5 milhões de estudantes da educação básica não teve acesso à educação neste período de pandemia; o MEC não exerce seu papel na coordenação da educação nacional, por isso as Metas do PNE, PEE e PME não são atingidas conforme previsto nestes planos; o MEC inviabilizou o repasse de R$3,5 bilhões da União a Estados, Distrito Federal e municípios para garantir ações imediatas de acesso à internet, aos alunos e professores das redes públicas de ensino; o Governo investe em escolas Cívico – Militares, escola Sem Partido e Ensino Domiciliar; o Ensino Híbrido: com alternativa no período da pandemia, agora tem proposta de alteração da LDB - com uso das tecnologias digitais, inovação tecnológica, Brasil conectado.
Em setembro de 2016, o professor e filósofo Dr. Gaudêncio Frigotto publicava sua posição em relação à Medida Provisória da Reforma do Ensino Médio pelo bloco de poder oriundo do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, decretou uma escola para ricos e outra escola para pobres. Estamos diante da histórica dualidade do ensino: escola que prepara os jovens capazes de exercer liderança, comandar, pensar os rumos da sociedade (elites) e a escola para pobres, aqueles que vivem da sua força de trabalho diário. Nesta visão, estes não precisam desenvolver o pensamento crítico, nem se prepararem para assumir cargos de liderança, devem contentar-se em serem dirigidos, executar ordens e submeter-se à lógica da precarização crescente de sua mão-de-obra.
A fragmentação e flexibilização são aspectos centrais dessa reforma, desorganizando o desenvolvimento sequencial da formação integral dos jovens, no intuito de preparar para a vida, cidadania e mundo do trabalho. Os jovens não terão oportunidade de convivência com o mesmo grupo durante todo nível médio. Seguirão trajetórias individuais, isoladas, portanto tornam-se responsáveis pelas “suas escolhas”, melhor dizendo, dentre aquelas que lhe são ofertadas, assim se tornarão “empreendedores” de seu próprio futuro pessoal e profissional.
Neste sentido aparece a desigualdade de condições, os mais favorecidos economicamente farão escolha por maior número de itinerários, organizarão seu projeto de vida considerando a continuidade de sua formação em nível superior, no entanto, as classes populares serão levadas a saídas intermediárias, na busca de sua sobrevivência. A obrigação de oferta de apenas três disciplinas dialoga com a exclusão de boa parte da juventude de uma formação integral, pois em não sendo obrigatória a oferta de demais disciplinas, o acesso ao pensamento científico, às artes e formação crítica, passam a ser privilégio de poucos.
Tanto a desobrigação da oferta das disciplinas, quanto o notório saber e a possibilidade de boa parte das aulas serem à distância acarretam na diminuição de recursos humanos tanto de professores como de funcionários de escola, especialmente de formação e licenciaturas para atuação específica na educação. Sinaliza para ataque ainda maior sobre a carreira de educadores e a não realização de concurso público.
As Parcerias, nada mais são do que abrir caminho para o avanço do mercado empresarial na educação. Uma fatia importante dos recursos públicos pode ser abocanhada pela iniciativa privada via convênios de cooperação para oferta de trilhas de aprendizagem, práticas de ensino, aprofundamento em alguma área de conhecimento, grande parte dessa oferta poderá se efetivar por meio da EaD, portanto projetos prontos, pensados longe da realidade daquela comunidade, de forma padronizada, visando atender a avaliações de larga escala ( SAEB) e cumprir o estrito previsto na BNCC. Assim, as diretrizes do Banco Mundial seguem em execução no Brasil, em sintonia à avaliação externa internacional e nacional e caracterizadas pelo ranqueamento da educação básica.
Queremos para as nossas juventudes uma educação que respeita e valoriza a diversidade, que seja capaz de criar as condições de desenvolvimento da capacidade de cada um/a, independentemente das condições socioeconômicas, atenta às mudanças que ocorrem no mundo, com garantia de escolas equipadas com materiais didáticos, laboratórios, bibliotecas, espaços físicos adequados para a convivência sadia, uma escola inserida na comunidade, promotora da cultura e lazer, articulando toda a comunidade no planejamento e desenvolvimento de uma educação de qualidade social, laica, democrática, inclusiva.
Não ao retrocesso dessa reforma, o que precisamos é de espaços coletivos de debate e construção, mais recursos para o financiamento da educação, com processo de formação inicial e continuada dos trabalhadores/as em educação, gestão democrática, com justos salários, carreira e condições de trabalho dignas.
É hora de reagir de forma organizada para retomar a autonomia da escola e o protagonismo dos/as educadores/as, sujeitos com formação adequada para pensar a educação, elaborar o Projeto Político Pedagógico e pelo desenvolvimento do projeto educativo junto às comunidades escolares.
“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção” Paulo Freire