O algoritmo do Avestruz
O Ministério da Economia e o algoritmo do Avestruz
Bem, é este resumo que aqui mais nos interessa. Enfiar a cabeça e fingir que não há nenhum problema. O governo federal, através do Ministério da Economia, ao editar os decretos de redução de IPI desde fevereiro de 2022, tendo insistido no mês de abril e agora no mês de julho, criou um grande problema de insegurança jurídica para todo o Brasil.
Por Farid Mendonça Júnior
Dentre as diversas vantagens de estudar diversas áreas do conhecimento está a possibilidade de usar determinados conceitos, fundamentos e exemplos de uma área para exemplificar outra.
Nesta semana, aprendi que na ciência da computação existe o algoritmo do avestruz, que nada mais é que uma estratégia de ignorar problemas potenciais com base no fato de que eles podem ser extremamente raros. E que esta estratégia se resume em “enfie a cabeça na areia e finja que não há nenhum problema”, como se fosse um avestruz.
Bem, é este resumo que aqui mais nos interessa. Enfiar a cabeça e fingir que não há nenhum problema.
O governo federal, ao editar os decretos de redução de IPI desde fevereiro de 2022, tendo insistido no mês de abril e agora no mês de julho, criou um grande problema de insegurança jurídica para todo o Brasil.
O governo, como já se sabe, ignorou o direito constitucional da Zona Franca de Manaus. E mesmo depois da primeira liminar/cautelar em favor da Zona Franca de Manaus, resolveu ligar o botão do foda-se (pegando emprestado a expressão do Min. Paulo Guedes) e decidiu novamente atacar a ZFM, desrespeitando frontalmente a decisão cautelar do Supremo Tribunal Federal.
A estratégia do Min. Guedes parece mesmo ser a do algoritmo do avestruz, pensar que nada vai acontecer, enfiar a cabeça na areia e fingir que não há nenhum problema.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante entrevista coletiva no Palácio do Planalto. foto: Marcelo Camargo
A situação só piora, pois as diversas empresas Brasil afora, representadas pelas associações e federações das indústrias de seus Estados, com a desculpa de “não saberem ao certo qual alíquota de IPI utilizar na hora de recolher seus tributos”, tradução para “burlar na cara dura a decisão cautelar”, resolveram ligar a artilharia e bombardear Manaus, especialmente na Ação Direta de Inconstitucionalidade 7153.A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – FIESP e a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro – FIRJAN ingressaram com pedido de Amicus Curiae, que de amizade não tem nada. A FIESP pediu desde já a suspensão das medidas cautelares, e a FIRJAN chegou ao absurdo de concluir que os decretos de redução do IPI não prejudicavam a ZFM (ou é burrice ou é má-fé descarada!).
E no dia 11 de agosto, tivemos uma manifestação conjunta de diversas federações de todo o Brasil, a CNI e dezenas de associações. Todas contra “a maior vilã da economia do Brasil”, ou “a culpada por todas as mazelas da economia brasileira”, para ser irônico, a Zona Franca de Manaus.
Enfim, nós já sabemos da falta de respeito e compreensão, além da falta de conhecimento e do grande preconceito que possuem em relação ao nosso modelo econômico. Mas o que o Ministério da Economia fez foi jogar o “catolé” no ventilador e sair correndo, tipo menino de 5 série. Além de se esconder (enfiar a cara na areia) e fingir que não há nenhum problema. Bando de irresponsáveis. Pois tal conduta só prejudica todo o Brasil e cria insegurança jurídica para todos!
Ontem, 12 de agosto, o Min. Paulo Guedes, o “respeitado” Ministro da Economia, deu uma declaração bem desrespeitosa em relação à França. Disse: “Vocês [França] estão ficando irrelevantes para nós. É melhor vocês nos tratarem bem porque senão vamos ligar o foda-se para vocês” (https://www.google.com/amp/s/economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2022/08/09/guedes-critica-a-franca-e-usa-palavrao-para-se-referir-ao-pais.amp.htm).
É este o modus operandi deste governo, age de forma desrespeitosa, unilateral e sem pensar nas consequências. É assim com praticamente tudo, e não foi diferente com a Zona Franca de Manaus.
E também não é diferente com os 33,1 milhões de brasileiros que estão passando fome (dados do início de 2022), devendo levar em consideração que no final de 2020 (já na pandemia) o número de brasileiros passando fome era em torno de 19,1 milhões. Portanto, tivemos um aumento de 14 milhões de pessoas. Tiveram tempo de planejar e não deixar a situação piorar, mas não fizeram.
Mas o Ministério da Economia também finge que isso não é com ele, e prefere enfiar a cara na areia e fingir que isso não está acontecendo.
Retornando ao tema Zona Franca de Manaus, vejo que chegou o momento de começarmos a refletir de forma mais profunda.
O Estado do Amazonas é um Estado superavitário em relação à União. Arrecadamos e enviamos para a União mais do que recebemos. Os incentivos fiscais que a ZFM goza não são um peso para o Brasil, pois contribuem de forma superavitária para a União e para a redução das importações que o Brasil faria se ela não existisse.
Não temos grandes investimentos aqui por parte do governo federal faz tempo. A BR-319 nunca se viabiliza, não consta nem mesmo no Plano Plurianual. A União e os Estados não reconhecem o nosso valor. Somos tratados como um peso para eles. Se o custo Brasil diminuiu (como duvidosamente alega o Min. Economia), o custo amazônico só aumentou. Ou por acaso o nosso interior deixou de ser abastecido por diesel que demora dias e semanas para chegar? Além de termos uma das contas de energia mais caras do Brasil, tendo que enfrentar o rigoroso verão amazônico. Ou por acaso as grandes distâncias entre as cidades do Amazonas não existem mais?
Os Estados da Federação, nossos “irmãos”, não se esforçam para compreender nossas necessidades. Não querem respeitar o prazo constitucional da ZFM que foi ampliado no legislativo federal pelos representantes de todos os Estados (não foi algo feito na mesa de bar). Os nossos “irmãos” não nos enxergam como um ativo para o Brasil, mas apenas como um obstáculo ao desenvolvimento, e muitos ainda chegam a nutrir o sonho da velha prática realizada na ditadura, qual seja, passar o trator e abrir as vias do desenvolvimento, em flagrante desrespeito ao meio ambiente equilibrado e sustentável. E este é o pensamento também do governo federal.
A União (representada pelo governo federal, e pelo Ministério da Economia) não “cumpre” um papel harmônico de um “pai” da federaçao. Pelo contrário, instiga a discórdia, a briga, a insegurança jurídica, a judicialização.
É chegada a hora de rever as cláusulas do casamento federativo. Afinal, o que ganhamos com isso?
O avestruz do Ministério da Economia vai ficar com a cara enterrada até quando, fingindo que nada está acontecendo?
Farid Mendonça Júnior é economista, advogado e administrador
https://brasilamazoniaagora.com.br/2022/ministerio-da-economia-avestruz/?fbclid=IwAR0cOUKEeK5QlwKETeURXLc1g3gqJrGDia71FxP56JQwY_d6J-2nubvaYOE