O castigo das professoras

O castigo das professoras

O castigo das professoras: o que era ou não aceitável como prática docente?

Carolina Cechella Philippi, Pedagoga da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Limeira, SP, Brasil.


Duas professoras primárias do Grupo Escolar Hercílio Luz, na pequena cidade de Tubarão, em Santa Catarina, trouxeram desassossego ao diretor da instituição, o professor Albano Espíndola. Isso porque uma delas apresentou faltas reincidentes sem que essas fossem devidamente justificadas ao passo que a outra, após ter sido repreendida por não impor a necessária disciplina à sua turma, passou a levar para a sala de aula uma vara para aplicação de castigos físicos aos alunos. Elas, cada uma à sua maneira, afrontaram aspectos específicos do Regimento Interno dos Grupos Escolares do Estado de Santa Catarina (1914) e, como consequência, foram penalizadas por isso.

É das interrogações sobre os procedimentos necessários para essas penalizações e sobre os sujeitos políticos que elas mobilizaram que se ocupou o artigo As operações e o mando: ensaio de análise de ofícios burocráticos (Santa Catarina, 1928), de autoria de Carolina Cechella Philippi. Para tanto, acessou uma série de ofícios expedidos pelo diretor da escola e endereçados ao Diretor do Ensino catarinense, Antônio Mâncio da Costa, na tentativa de entender os mecanismos disparados para a punição das professoras e as disputas mapeadas a respeito do que era aceitável ou não como prática docente. Como metodologia, ancorou-se na operação historiográfica tal qual proposta por Michel de Certeau e entendeu, sobretudo, as práticas lançadas pelos sujeitos como operações (1985).

 

Figura 1. Alunos do Grupo Escolar Hercílio Luz. Tubarão, 1940.

 

Figura 2. Fachada do Grupo Escolar Hercílio Luz (Déc. 1920).

 

Mais que entender os mecanismos de gerenciamento político do magistério primário, esse exercício de pesquisa permitiu perceber as representações em disputa a respeito do que era ser ou não ser uma boa professora em um momento de institucionalização da escola elementar no Brasil. Além disso, foi possível perceber as diferentes operações que o diretor escolar Albano Monteiro encampou para lidar com as professoras punidas de acordo com a gravidade da infração, tal qual prevista no Regimento dos Grupos Escolares do Estado. Também ele, no exercício da direção escolar, tentou mais de uma vez travar acordos e reportar fatos aos demais integrantes da burocracia de forma a, de acordo com sua vontade, diminuir uma desavença ou reportar uma denúncia.

Coube, portanto, mapear as desavenças e seus encaminhamentos, bem como a apropriação das leis que regeram o magistério e seu exercício no interior de uma unidade escolar específica. O artigo trata, pois, de um convite a um olhar curioso e aparelhado para as práticas de professoras que nem sempre se entenderam com as normas e leis que regeram seu exercício. Foi também nele possível perceber o uso que gestores, coletores e diretores fizeram dos mecanismos que estavam disponíveis para o controle, a emulação e o castigo do corpo docente estadual. Sendo assim, a pesquisa é uma forma de perceber as rusgas e os embates que povoam a instituição escolar há muito tempo, bem como as negociações que envolveram ser, estar e permanecer na escola.

Leia mais

CERTEAU, M. Teoria e método no estudo das práticas cotidianas. In: SZMRECSANYI, M.I. (org.). Cotidiano, cultura popular e planejamento urbano. São Paulo: USP, 1985.

SANTA CATARINA. Regimento Interno dos Grupos Escolares do Estado de Santa Catarina. Joinville: Tipografia Boehm, 1914.

Para ler o artigo, acesse

PHILIPPI, C.C. As operações e o mando: ensaio de análise de ofícios burocráticos (Santa Catarina, 1928). Educação e Pesquisa [online]. 2022, vol. 48, e239852 [viewed 6 May 2022] As operações e o mando: ensaio de análise de ofícios burocráticos (Santa Catarina, 1928). Available from: https://www.scielo.br/j/ep/a/YXNdHxTxBgdttyptMTQ8Mwx/

Como citar este post [ISO 690/2010]:

PHILIPPI, C.C. O castigo das professoras: o que era ou não aceitável como prática docente? [online]. SciELO em Perspectiva: Humanas, 2022 [viewed 28 June 2023]. Available from: https://humanas.blog.scielo.org/blog/2022/05/09/o-castigo-das-professoras-o-que-era-ou-nao-aceitavel-como-pratica-docente/ 

FONTE:
https://humanas.blog.scielo.org/blog/2022/05/09/o-castigo-das-professoras-o-que-era-ou-nao-aceitavel-como-pratica-docente/




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