O Pai Natal
O Pai Natal desceu da chaminé...
Poisou o saco com os presentes e comeu duas bolachas saídas do forno que ainda fumegavam.
Acompanhou as bolachas, recheadas com frutas cristalizadas e pinhões, com leite morno com sabor a canela. Depois, já com a barriga cheia, recostou-se no sofá da sala e dormitou!!!
Acordou alguns minutos depois com um gato rechonchudo, de pêlo branco e olhos azuis, que lhe saltou, repentinamente, para o colo...
O Pai Natal acordou aborrecido, triste, pensativo e muito cansado...
Cansado de todos os anos lhe pedirem bens materiais...
Cansado de casas repletas de bolas, bicicletas, jogos, bonecas, carrinhos... Brinquedos com os quais as crianças brincavam apenas durante uns breves segundos... O Pai Natal estava cansado de todos os anos ver brinquedos oferecidos por ele abandonados nos cantos das casas e de no dia 25 de dezembro ver os caixotes de lixo a abarrotarem com papéis de embrulho e caixas rasgadas...
O Pai Natal estava verdadeiramente cansado de mensagens de Natal a desejar Boas Festas... quando nos restantes meses do ano as pessoas esqueciam-se de somente perguntar: "estás bem?"
O Pai Natal estava cansado da poluição, da corrupção mundial, da hipocrisia dos políticos, da desigualdade social, das guerras e das balas perdidas em corpos inocentes...
O Pai Natal estava cansado da falsidade, das mentiras, dos bajuladores e dos sorrisos doces e angelicais nesta época do ano...
O Pai Natal estava cansado dos jantares de trabalho natalícios onde reinavam as trocas de presentes, os abraços e beijos de pessoas que se criticavam o ano inteiro...
O Pai Natal estava triste... Verdadeiramente triste pois algumas casas eram fartas de perus, bacalhau, couves, batatas assadas, chocolates e filhoses... e noutras não havia nada para comer...
O Pai Natal estava triste por ver crianças que choravam por não terem um brinquedo ou simplesmente um prato com batatas e bacalhau cozido...
O Pai Natal estava triste por ver crianças que choravam por não terem o colo dos pais mortos na guerra...
O Pai Natal estava triste por ver que algumas pessoas demonstravam solidariedade e compaixão para com os mais necessitados apenas nesta época do ano...
O Pai Natal estava triste por ver idosos abandonados pelos filhos...
O Pai Natal estava triste por ver os espaços verdes a serem destruídos em função do lucro...
O Pai Natal estava triste por ver pessoa a "mutilarem-se" com cigarros, álcool e drogas...
O Pai Natal estava triste por ver crianças e adultos a morrerem em camas de hospitais por padecerem de doenças para as quais não foi encontrada uma cura...
O Pai Natal estava triste, verdadeiramente triste com o Mundo!!!
O Pai Natal decidiu então suspender os presentes... Pela primeira vez seria ele a pedir um presente!!! Pela primeira vez seria o Pai Natal a ser presenteado!!!
O Pai Natal pegou no saco dos presentes... Saiu pela chaminé e sentou-se no trenó... Enquanto voava pelo céu estrelado pegou na sua máquina de escrever e redigiu uma carta pedindo fervorosamente a Deus, como presente, que salvasse o Homem e o Mundo onde este habita.
E é Isto...
Ilustração de @Vasco Gargalo
https://www.facebook.com/vasco.gargalo
Texto- Mamã Sofia Pinto, Entre Tachos, Fraldas e Livros, 24 de dezembro de 2023.
Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão, amigo, és meu irmão.
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão, amigo, és meu irmão.
Natal é em Dezembro
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce
Uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto
Que há no ventre da Mulher
Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e comboios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão, amigo, és meu irmão.
E tu que vês na montra a tua fome, que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão, amigo, és meu irmão
Ary dos Santos.
Quando Um Homem Quiser. In. As Palavra das Cantigas