ONU e o Direito à Educação publica
Relatora Especial da ONU para o Direito à Educação publica relatório-síntese de 25 anos de trabalhos – parte deles contou com a colaboração da Campanha Brasileira
Privatização do ensino, novas tecnologias, austeridade e diversidades culturais foram alguns dos temas que tiveram sugestões da Campanha incorporadas ao texto; este é o primeiro relatório da nova Relatora, Farida Shaheed
O direito à educação precisa ser a espinha dorsal da transformação dos modelos educacionais. Significando, assim, que a defesa intransigente da educação pública, livre, de qualidade e com objetivo ao desenvolvimento pleno de todas as pessoas deve ser garantida com financiamento totalmente público e adequado – com a atuação de atores privados sendo rigorosamente regulada pelo Estado.
Essa é uma síntese do que está apresentado no primeiro relatório da nova Relatora Especial da ONU para o Direito à Educação, Farida Shaheed, publicado em sessão de junho do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Shaheed revisa evidências que jogam luz em como o direito à educação é entendido atualmente, e apresenta as obrigações dos países para a garantia universal desse direito.
O texto de Shaheed incorpora diversas colaborações feitas pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação à Relatoria nos últimos anos. Veja algumas delas abaixo.
Privatização
A defesa da educação pública de qualidade é feita pela Campanha brasileira há anos com ênfase na adoção dos Princípios de Abidjan para a robusta regulação dos atores privados na educação, documento global com o qual, ao lado de dezenas de outras organizações, a Campanha colaborou em sua construção. A Relatoria destacou a relevância do marco regulatório internacional.
“A Relatora Especial reitera a recomendação feita pelo anterior titular do mandato [Dra. Koumbou Boly Barry] no sentido de os Estados utilizarem os Princípios de Abidjan (...). [O documento] sublinha que os Estados devem impor obrigações aos atores privados no setor da educação, a fim de garantir que estes contribuam para a realização do direito à educação, de modo a que as instituições implementem uma educação coerente com a legislação e os direitos humanos”, diz o relatório.
Em 2019, o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou por nova resolução sobre o direito à educação em um reconhecimento histórico de Estado dos Princípios de Abidjan.
Tecnologias
“O crescimento de escolas privadas pode minar os direitos humanos e a coesão social. É motivo de preocupação, com a crescente utilização de tecnologias digitais na educação e a influência dessas tecnologias na educação (EdTech), cada vez mais urgente. [A Relatoria] dedicou quatro relatórios a esta questão, alertando para o perigo de a privatização ‘suplantar o ensino público em vez de o complementar’”, ressalta Shaheed.
Veja aqui uma das colaborações da Campanha à Relatoria Especial da ONU para o Direito à Educação quanto ao tema da tecnologia.
Contra a austeridade
“[A] ajuda internacional não deve conduzir a uma influência indevida dos atores internacionais ou de outros Estados sobre as preocupações nacionais em matéria de política educacional, particularmente no que diz respeito às medidas de austeridade e à privatização da educação. As medidas de austeridade exacerbam a desigualdade, incluindo na educação, e conduzem previsivelmente a um aumento exponencial da privatização e comercialização da educação”, afirma Shaheed.
Em 2020, recomendações da Relatoria, com sugestões incorporadas da Campanha brasileira, salientaram que políticas de austeridade enfraqueceram a resposta brasileira à pandemia de COVID-19.
Diversidades
A ênfase da diversidade cultural na garantia do direito à educação, principalmente nas perspectivas afrodescendentes e indígenas, foi mencionada em 2021 como exemplo de passos na direção certa para contemplar a dimensão cultural do direito à educação no Brasil, segundo a Relatoria Especial da ONU para o Direito à Educação.
Na ocasião, e a exemplo das outras colaborações aqui mencionadas, Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha, teve sugestões incorporadas ao texto, após participar de grupo de experts que se reuniu em Genebra para a elaboração do relatório com tal ênfase, em 2020.
Shaheed, por sua vez, enfatiza a “vitalidade da garantia dos direitos culturais, assegurando que ninguém pode invocar a diversidade cultural para violar os direitos humanos garantidos pelo direito internacional ou para limitar o seu alcance”.
“Os Estados devem dar prioridade ao financiamento de um ensino público gratuito e de qualidade e garantir que este seja verdadeiramente inclusivo. (...) A proteção e a promoção das diversidades culturais, e em particular as proteções devidas às minorias, apoiam fortemente tais medidas”.
(Foto: Tânia Rego/Agência Brasil)