Pesquisas do impacto da pandemia
Pesquisas mostram o impacto da pandemia em diferentes áreas da educação
Levantamentos no Brasil e no exterior fazem um raio X das aulas remotas e mostram como estudantes, professores e famílias analisam o momento
por Vinícius de Oliveira 14 de julho de 2020
A educação não é mais a mesma depois da pandemia do coronavírus (COVID-19). E isso fica claro a partir de uma série de pesquisas no Brasil e em outros países que já conseguiram dimensionar o impacto da paralisação das aulas presenciais.
Em comum, professores e alunos passaram a adotar tecnologias educacionais de maneira mais constante (quando a infraestrutura permite) durante esse período, manifestam problemas emocionais para lidar com o dia a dia em casa e a preocupação com o que ficará para trás em termos de aprendizagem.
Abaixo, você encontra mais detalhes de como a pandemia afetou a rotina de estudantes e professores, além de pesquisas que tiveram a participação de familiares, mantenedores de escolas e empreendedores.
Situação das redes
Para mapear os desafios enfrentados pelas secretarias de educação, a Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação) e o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), com apoio do CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira), Fundação Itaú Social, Fundação Lemann e Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), identificaram que 79% dos alunos dizem ter acesso à internet, no entanto, 46% acessam apenas por celular, o que limita tanto o trabalho do professor como a experiência de aprendizagem dos alunos.
“Educação não presencial”, realizada pelo Datafolha, a pedido do Itaú Social, Fundação Lemann e Imaginable Futures, mostrou que, em maio, 74% dos estudantes das redes municipais e estaduais estavam recebendo algum tipo de atividade para fazer em casa. Entre os alunos do ensino médio, esse número chegava a 85%.
Naquele momento, as atividades e o conteúdo pedagógico foram ofertados, para 37% dos respondentes, por meio de algum equipamento tecnológico, como internet pelo celular ou computador, TV ou rádio, para 34%, por meio de equipamentos tecnológicos e material impresso; e apenas 3% recebiam somente material impresso.
O que dizem os estudantes
Com 33 mil participantes, “Juventudes e a Pandemia do Coronavírus”, pesquisa realizada pelo CONJUVE (Conselho Nacional da Juventude) em parceria com Em Movimento, Fundação Roberto Marinho, Mapa Educação, Porvir, Rede Conhecimento Social, Unesco e Visão Mundial faz um sério alerta para gestores educacionais: quase 30% dos jovens pensam em deixar a escola e, entre os que planejam fazer o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), 49% já pensaram em desistir. Isso tudo porque a maioria sente grande dificuldade de estudar em casa. O que atrapalha não é só de computador e internet rápida para acessar conteúdos e acompanhar as aulas, mas o próprio equilíbrio emocional e a capacidade de organização para estudar.
Sentimento dos professores
Assim como os estudantes, professores também estão se sentindo mais ansiosos e manifestam uma sobrecarga de trabalho. O tempo até a próxima transmissão ao vivo parece correr muito mais rápido do que caminhar da sala dos professores. O Instituto Península ouviu 2.400 professores da educação básica, das redes pública e privada, para entender como estavam se sentindo desde o início da paralisação.
O quadro emocional chama a atenção. Docentes pedem apoio para lidar com questões emocionais e demonstravam ansiedade (67%), cansaço (38%) e tédio (36%). Compilados em maio, esses números podem ter aumentado, uma vez que o período de aulas remotas tem sido maior do que o inicialmente previsto. Dar aulas a partir de casa era situação inédita para a maioria (88%), tanto é que 83,4% não se sentiam preparados.
A Nova Escola também fez uma pesquisa online com 9 mil professores. De modo geral, os participantes relatam baixo índice de participação de alunos e famílias nas atividades a distância, atraso no calendário letivo, falta de apoio da rede e saúde mental dos professores comprometida. A educação infantil é a etapa com menor participação.
Famílias no Brasil e no exterior
A mesma sondagem “Educação não presencial”, mencionada acima, também ouviu 1.028 pais ou responsáveis de diferentes regiões do país. Entre os respondentes, 84% disseram que os alunos se dedicam mais de uma hora por dia aos estudos em casa, sendo que 29% passam mais de três horas diárias. E 82% estão fazendo a maioria das atividades enviadas pela escola. Entre as principais dificuldades das atividades não presenciais estão: acesso à internet (23%), dificuldade com conteúdo (20%), falta de equipamentos (15%) e falta de interesse no conteúdo (15%).
Uma pesquisa da Pearson com mil participantes nos Estados Unidos e um número equivalente no Reino Unido indica que famílias estão confiantes de que o aprendizado pode continuar online ao mesmo tempo que temem seus filhos podem ficar para trás com o conteúdo escolar. Os britânicos estão mais preocupados que os americanos com a perda de testes e provas importantes para a entrada nas faculdades e universidades, ou no progresso acadêmico.
Há pessimismo em torno da abertura de escolas em setembro e em torno da acessibilidade à tecnologia: 9 a cada 10 dizem que nem todos tem acesso a tecnologia necessária para poder estudar online de forma efetiva. Nos países do Reino Unido e nos EUA, mais de 8 em cada 10 pessoas acreditam que o ensino online será mais comum no futuro.
Educação inclusiva
A educação inclusiva foi tema de um estudo realizado pelo Instituto Rodrigo Mendes, que analisou as medidas tomadas por 23 países. O trabalho foi feito a partir de informações divulgadas pelos governos na internet e também por análises feitas por organismos internacionais.
Na Itália, por exemplo, estudo com 3.170 professores identificou que menos da metade dos estudantes com deficiência das classes dos respondentes estavam participando no ensino a distância de uma maneira considerada por eles como boa.
Como apoio de uma rede de 45 especialistas ao redor do mundo, a parte final do estudo do Instituto Rodrigo Mendes detalha a estratégia de diferentes países para o retorno, bem como o tamanho das turmas nas escolas e recomendações para atender crianças com deficiência.
“Especialistas estrangeiros consultados consideram que, apesar de certas crianças e adolescentes com deficiência pertencerem a grupos de risco da covid-19, o laudo médico de deficiência não deve ser aceito como justificativa para que esses estudantes sejam deixados para trás. É importante esclarecer que não existe correlação automática entre deficiência e risco”, aponta uma das conclusões do estudo, ainda reforça que “a preservação do direito à educação deve ser a premissa prioritária para a criação de quaisquer medidas e procedimentos”.
Edtech
O momento de dificuldades também faz com que empresas do setor de tecnologia educacional coloquem o pé no freio. Em “Impacto no Cenário Brasileiro de Inovação na Aprendizagem: COVID-19“, a consultoria Future Education ouviu 114 integrantes desse ecossistema, entre mantenedores, diretores e coordenadores pelo lado das instituições, além de fundadores de startups educacionais.
O pessimismo de mantenedores no curto prazo é acompanhado pelos responsáveis pelas edtechs, que veem acordos sob ameaça diante do fluxo de investimento menor proveniente de escolas privadas. Por mais que o mundo da educação tenha feito da videoconferência uma ferramenta essencial, as portas físicas fechadas nas escolas têm dificultado a abertura de novas negociações.
Impactos econômicos
Um estudo do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) sobre o impacto da perda de aprendizado neste ano ao longo da vida dos estudantes aponta que os jovens podem perder R$ 42,5 mil de renda se os conteúdos não forem repostos e eles seguirem para o mercado de trabalho com esses déficits. “Não foi planejado, não houve transição para esse novo modelo. Então, houve perdas e precisamos olhar agora para elas”, disse o economista Ricardo Paes de Barros, que elaborou o estudo, à Folha de S. Paulo.
Outra pesquisa também feita pelo Insper, ao lado da Fundação Roberto Marinho, projeta que o país perde R$ 214 bilhões por ano por deixar 17,5% dos jovens sem concluir o ensino médio. Isso significa dizer que o país tem hoje 575 mil adolescentes de 16 anos que não vão completar a educação básica, se nada mudar, mostra o estudo “Consequências da violação do direito à educação”. O cálculo leva em consideração mudanças no mercado de trabalho, com a queda de empregabilidade e de remuneração dos jovens, os efeitos dessa renda mais baixa para a sociedade e a longevidade menor.
Nos Estados Unidos, o maior sindicato de educadores do país estima que um em cada cinco profissionais da educação deve perder o emprego se o governo Trump não ampliar o pacote de ajuda financeira.