Por que ler Paulo Freire?

Por que ler Paulo Freire?

Por que ler Paulo Freire?

Por Vinício Carrilho Martinez

 

 É certo que cada leitura fará seu leitor, leitora, encontrar respostas as mais diversas, a depender da visão de mundo, dos interesses e motivações mais imediatas, da história de cada um/uma. No nosso caso, vamos sinalizar com quatro momentos ou, como chamamos, pensamentos:

- Em primeiro lugar, para que possamos nutrir a esperança enquanto práxis, ação transformadora da realidade social.

- Em segundo lugar, a fim de que a prescrição (alienação) não seja mais um verbo de ação a favor da proscrição (exclusão) da imensa maioria do povo brasileiro – especialmente o povo pobre, negro e oprimido.

- Em terceiro lugar, pensando-se enquanto Nação, para que o “atraso social” não mais se faça presente no “atraso educacional, econômico, tecnológico, científico”.

- Por fim, em quarto lugar, e a partir de uma Utopia possível (realizável), para que coletivamente tenhamos força e esperança destinadas à construção de uma Vontade de saber teleológica (libertária e emancipadora). 

Vontade de saber tem algo com "saber-fazer", orgânico, dinâmico (responsável) não sendo um saber por saber – um acúmulo de "outra forma de capital" ou poder, como "dominus" (dominação repressiva e não organizacional). Portanto, um saber-fazer inerente, desde a origem, com a “vontade de pensar” que efetivamente descomprima, que liberte, que nos faça sermos “mais humanos” – no que temos de melhor.

Essa Vontade de saber coincide com a necessidade transposta pela engenhosidade e curiosidade, e que são a própria síntese histórica da humanidade. Este é o nosso primeiro pensamento.

Por outro lado, muitas vezes (ou na maioria das vezes), tudo acaba se limitando ao instrumento: "saber é poder". Saberes e poderes instrumentalizados pelo Colonialismo, capitalismo, neoliberalismo.

Infelizmente, o atual estágio de desenvolvimento tecnológico (talvez seja uma "nova revolução industrial" – é preciso provar isso) não veio acompanhado por um novo Renascimento e por sua Renascença. Além do fato marcante de que os mitos da ciência atual não são grandiosos como fora Prometeu: o mito grego que trouxe ou revelou a importância do conhecimento para a humanidade.

O que leva a um saber-fazer que se institui sobre a precificação, prescrição (determinação para não-sermos) e proscrição (coisificação da realidade: entre o real e o virtual, há muito espaço para a ideologia e a reificação). Essa prescrição é a marca da formação social brasileira, que nos aliena acerca do que fomos, somos e (tendencialmente) seremos, se nada fizermos de mais significativo – como investirmos massivamente, maciçamente na educação pública. Esse “o que seremos”, se nada fizermos de relevante (enquanto país), por seu turno, indica-nos o que sempre fomos, isto é, proscritos (enquanto povo), alijados, banidos, excluídos/as das questões efetivamente relevantes ao povo e ao país.

De modo global, a insistência atual, especialmente no curso dado à Inteligência Artificial, não é de uma retificação dos atos de negação (vide as crescentes crises climáticas: Rio Grande do Sul é só um caso) e sim da ratificação (confirmação, reiteração) das ações em curso. Um exemplo simples disso está na Petrobrás extrair petróleo cru na bacia do Rio Amazonas, ao passo que poderia investir em fontes renováveis e muito mais baratas de energia, como a energia eólica. Esse é o segundo pensamento.

Por outro lado, o não saber-fazer provoca a desindustrialização do país, coroado pelo analfabetismo disfuncional (ou total) e na insistência pelo sistema de Plantation do agronegócio – altamente poluente e desagregador. A greve das universidades federais se justifica "só" por aqui, pois representamos (junto com as demais universidades públicas) mais de 90% da ciência produzida no país. Então, pode-se dizer com segurança que “quem pensa o país e o seu povo (pobre, negro e oprimido) somos nós”. Os demais pensam “novas e velhas” formas de dominação, novas reinvenções dos cabrestos antigos e atualizados. Este é o terceiro pensamento.

E ainda há um quarto pensamento, que é a superação dos três anteriores e que nos leva à afirmação do primeiro pensamento: a vontade de saber orgânica e crítica. Ou seja, como afirmação dialética da vontade de saber, como um saber-fazer teleológico: responsável pela natureza da qual a humanidade faz parte, na condição de mais um animal. Com a diferença de que somos responsáveis pelas demais espécies, da flora e da fauna, como seres sociais que se transformam em animais políticos.

         Portanto, é plausível afirmar que Paulo Freire (1985) pensa o povo pobre, negro e oprimido a partir desse saber-fazer teleológico, como Vontade de saber e de pensar dialética, transformadora, emancipadora, constituinte de outras formas de organização social que incluam e que desbastem toda forma de prescrição (negação) e de proscrição do povo pobre, negro e oprimido. É preciso muita Vontade de saber, de pensar e de fazer, para remover toda alienação dos significados mais profundos e relevantes. A prescrição da proscrição é o que mais conhecemos, pois prescrevem, definem que “não-somos” e, assim, nos excluem continuamente. Então, que façamos um saber-fazer que desfie toda prescrição da proscrição. 

 

Referencias

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

 

FONTE:

https://www.gentedeopiniao.com.br/politica/vinicio-carrilho/por-que-ler-paulo-freire?fbclid=IwZXh0bgNhZW0CMTEAAR2IhOBQe5g4P-NPDVLe2jPJw8EVPIG48PWRHEh3jVPIGeq5kmLP7xQOP1s_aem_AU6RJOdlfg1sAcLWqPh1xy_oCM3j
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