Professores sobrecarregado, desmotivados
Metade dos professores da educação básica está sobrecarregada, desmotivada, ansiosa e cansada, diz pesquisa
Rodrigo Magalhães, de 32 anos, é professor de geografia no Colégio AZ
Foto: Maria Isabel Oliveira/ Agência O Globo
Metade dos professores de educação básica do país está desmotivada (49%), sobrecarregada (55%), ansiosa(47%) e cansada (46%), segundo pesquisa do Instituto Península obtida com exclusividade pelo EXTRA. Esse é o impacto da pandemia nos educadores, que aguardam avidamente pela rotina de reencontros seguros com seus alunos e o fim da necessidade de protocolos. Hoje, o país celebra o Dia do Professor.
— A educação se dá na relação duradoura entre professor e aluno. Se uma das partes está doente, como vimos na pesquisa, essa relação não vai produzir os resultados que precisa — analisa Heloisa Morel, diretora executiva do Instituto Península. — Neste momento, é preciso acolher. Aceitar que está acontecendo e que os professores estão cansados.
O levantamento chamado “Desafios e Perspectivas da Educação: uma visão dos professores durante a pandemia” ouviu 2.500 docentes e gestores escolares de todas as etapas de ensino da educação básica (educação infantil, ensino fundamental e médio) das redes municipais, estaduais e privada na primeira quinzena de setembro desse ano.
— Mas mesmo exausto, o professores falam que escolheriam o ofício. Existe um vinculo com a profissão e os alunos assustador — afirma Morel, diretora do instituto que fez diversas pesquisas com docentes ao longo da pandemia. — Mesmo com o auge do medo com medo de ser contaminado e de toda a preocupação de se reinventar, eles falavam que continuavam gostando da profissão.
Neste momento, o Brasil está voltando plenamente para as salas de aula na maior parte do país no modelo híbrido — na qual parte das aulas é feita à distância, e parte presencial — e nove estados já estão com 100% das crianças nas turmas.
Felipe Nobrega, de 34 anos, é um dos desmotivados. Professor de História de escolas estaduais na periferia de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, ele conta que a falta de continuidade pedagógica é o principal fator para esse cenário.
— A minha falta de motivação está muito ligada a não conseguir engrenar um trabalho. Não conseguimos vislumbrar um projeto de médio prazo. O rompimento de um projeto pedagógico é o que nos joga no chão — avalia Nobrega.
Para ele, no entanto, há luz no fim do túnel: reencontrar os estudantes diariamente.
— Melhoro a cada dia que eu volto para a sala de aula e tive alunos para conversar. Esse estado anímico melhora pela escola, pelo encontro, por saber que vou estar com os alunos na turma e ter algo para conversar com eles. E vai ser melhor a cada dia — afirma o professor.
Para sair dessa situação, a maior parte dos professores ouvidos pelo Instituto Península (57%) pede apoio psicológico e emocional para lidar com as diversas condições emocionais apresentadas durante a pandemia. Esse é o principal suporte requisitado pela categoria, segundo a pesquisa. Maior até do que formação continuada (43%).
— É preciso dar recursos para o professor tratar a doença e acolher os que ainda não a desenvolveram para prevenir que também sejam afetados. Esse olhar integral, para o professor como ser humano, era tratado de forma periférica no pré-pandemia e ganhou relevância na crise sanitária. Mas não podemos perder isso de novo com a quantidade de problemas que estamos enfrentando — avalia Morel, do Instituto Península.
Ainda de acordo com a pesquisa, professores avaliam que este é um momento crucial para acolher as crianças e também entender os impactos da aprendizagem durante o período de ensino remoto. O levantamento também aponta que uma das estratégias mais adotadas, citada por 89% dos professores ouvidos, é preparar aulas que permitam ensinar estudantes com níveis de aprendizagem muito diferentes, um resultado direto do período de escolas fechadas.
Reinvenção
Rodrigo Magalhães, de 32 anos, é professor de geografia do Colégio AZ, no Rio de Janeiro. Após um ano de aulas híbridas, a escola ainda trabalha para reduzir as desigualdades de aprendizagens perdidas durante o período remoto.
— Hoje temos uma esperança, uma ansiedade, de um retorno completo sem revezamento. A gente percebeu que alguns se adaptaram mais rapidamente e outros não se adaptaram ao modelo. Então a gente precisa preparar as aulas levando em consideração essa desigualdade na sala. É um desafio — conta Magalhães.
Magalhães conta que, mesmo o colégio já tendo antes da pandemia uma plataforma estruturada com aulas on-line e atividades voltadas para o ensino remoto, a pandemia trouxe uma sobrecarga de trabalho.
— Tive principalmente cansaço mental de replanejar tudo. Todas as escolas tiveram um trabalho muito intenso. Me peguei replanejando aulas que funcionam muito bem no modelo presencial, mas que precisavam ser alteradas no on-line — explica Magalhães.
Apesar de 79% dos professores acreditarem que os estudantes estão felizes em retornar às aulas, 53% sentem que os jovens estão desmotivados para a aprendizagem. Para mudar esse cenário, na visão dos professores, é preciso criar estratégias que motivem os estudantes.
58% deles sinalizam a importância de pensar no acolhimento dos alunos e promover maior participação da família, assim como 51% destacam as tecnologias para apoiar o uso de diferentes metodologias de ensino de modo que auxiliem no processo de recuperação da aprendizagem.
A pesquisa também destaca que 59% dos professores reconhecem os formatos híbridos de ensino como alternativa para personalizar e potencializar o desenvolvimento dos alunos e também como uma estratégia de inovação. 62% afirmam que o ensino híbrido melhora a autonomia dos estudantes e 58% entendem que é uma ferramenta que estimula a curiosidade.
— Este é um momento que traz a oportunidade do engajamento de todos os atores envolvidos no processo de aprendizagem: Estado, gestores, sociedade e famílias. Diversas Secretarias de Educação pelo Brasil se prepararam para o retorno às aulas presenciais, ofertando materiais pedagógicos e formação continuada para os professores, porém, atenção à saúde mental e mobilização das famílias seguem sendo parte fundamental deste processo — diz Morel.