Proposta de reestruturação do IPE/Saúde
IPE Saúde: discussão envolve baixa transparência e deficiências em controles
Governo do Estado prepara proposta de reestruturação do sistema de assistência à saúde de servidores
Flavia Bemfica
IPE Saúde: discussão envolve baixa transparência e deficiências em controles | Foto: Guilherme Almeida
No conselho de administração do IPE Saúde, a possibilidade de aumento de alíquotas em um contexto no qual há apenas compensação do crescimento vegetativo da folha de pagamento do funcionalismo, sem reajustes de fato, vem sendo rechaçada com intensidade por representantes dos segurados. Ao grupo, formalmente, ainda não chegou qualquer proposta sobre aumento de alíquotas. Nos debates, é recorrente o argumento de que, primeiro, é necessário que aconteçam os resultados da série de medidas de ajuste implementadas desde o ano passado.
As ações foram divididas em três eixos (reestruturação da despesa, modernização institucional e fortalecimento da receita), com execução prevista em cinco ciclos, ou etapas, que incluem desde as novas tabelas de medicamentos e diárias que acabaram com os sobrepreços até a revisão dos credenciamentos dos prestadores, passando por recontratualizações de contratos globais. O processo, contudo, está atrasado, e o IPE enfrenta pressões em sentidos diversos: de natureza política, dentro do próprio governo; de entidades de servidores, que temem uma ‘privatização’ e defendem a busca de alternativas sem perdas financeiras para os segurados; e de entidades representativas de prestadores de serviços, que solicitam urgência nas recontratualizações e na atualização de valores, e sinalizam, de forma recorrente, com a suspensão de atendimentos.
Na semana passada a Federação RS, que representa Santas Casas e hospitais sem fins lucrativos e a Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do RS (Fehosul) enviaram ofício ao presidente do conselho de administração cobrando “céleres providências” para que sejam efetivadas as recontratualizações “com todos os prestadores de serviços, garantindo um modelo remuneratório justo, com margem mínima de resultado operacional”. Nesta quinta-feira o assunto será pauta da reunião do colegiado.
Além da complexidade da situação financeira, pesam sobre o instituto questionamentos sobre a transparência dos dados, o que também tende a "travar" reformulações envolvendo majoração nas contribuições. Em comunicado de auditoria datado de 27 de dezembro, a Controladoria e Auditoria Geral do Estado (Cage) concluiu que o IPE Saúde “precisa comunicar à população informações relevantes sobre fatos que impactam seu patrimônio, como é o caso das diversas dívidas cujo devedor é o próprio Estado, seus poderes e demais órgãos da administração indireta.”
Os apontamentos tratam, entre outros pontos, das dívidas do próprio Executivo com o IPE, como a conta relativa às contribuições da saúde incidentes sobre RPVs e precatórios; da necessidade de maior controle sobre os chamados procedimentos gerenciados e sobre cobranças feitas por prestadores; e da inexistência de acompanhamento adequado sobre os imóveis do Fundo de Assistência à Saúde (FAS) transferidos ao Estado.
Os auditores assinalam que as notas explicativas do Instituto não estão publicizadas nos seus canais de comunicação, mas apenas consolidadas no Balanço Geral do Estado, “o que dificulta o acesso à informação pela sociedade, em efetivo prejuízo do controle social.” No documento, há a recomendação para que seja mantido o registro contábil tempestivo das variações ocorridas ao longo do exercício, e que a contabilidade evidencie os fatos ligados à administração orçamentária, financeira e patrimonial, “gerando informações que permitam o conhecimento da composição patrimonial e dos resultados econômicos financeiros.”
Os trabalhos da auditoria constantes no comunicado são referentes ao exercício de 2021 e ao período entre 2 de janeiro e 5 de outubro de 2022.
Reestruturação do IPE Saúde já causa polêmica no RS
Governo ainda não detalhou proposta, mas informações sobre mudanças nas alíquotas alimentam debates internos e vão movimentar início do ano no Legislativo
Flavia Bemfica
O governo do Rio Grande do Sul prepara para março a apresentação da proposta de reestruturação do IPE Saúde, o sistema de assistência à saúde dos servidores públicos estaduais (por vezes, também de parte de municipais), e tem tentado filtrar as informações que circulam tanto sobre as possibilidades em análise como sobre dados da autarquia. Internamente, contudo, o tema já está inflamando os debates. E a tendência é de que, quando chegar à Assembleia Legislativa, em formato de projeto para promover as mudanças, gere muita polêmica.
As controvérsias acontecem principalmente porque, desde pelo menos o mês de dezembro, o governo ventila a tese de que a reestruturação passará por revisão de alíquotas (hoje de 3,1%) para o todo ou para pelo menos uma fatia dos usuários (com corte por faixa etária, faixa salarial ou uso do sistema). Também são avaliadas possibilidades de cobrança para dependentes, ou parcela deles. Os dados existentes indicam que o chamado plano principal tem um déficit de aproximadamente R$ 400 milhões/ano, com um índice de sinistralidade de 130%.
O índice de sinistralidade estabelece a relação entre o que os usuários dão de despesa e quanto pagam ao plano. Grosso modo, um índice de 100% significa que tudo o que é arrecadado é gasto. Superior a isso, há déficit. Entre planos privados, o índice ideal fica na faixa dos 75%, e nunca deve passar de 85%.
O argumento de lideranças do Executivo é conhecido: o de que, sem uma reestruturação, o IPE vai falir. Todas as partes envolvidas concordam que é necessário melhorar o sistema, aumentando as receitas, de forma a que ele não acumule déficits. Mas há muitas divergências a respeito de como isto deva ser levado a cabo, alavancadas por uma ainda baixa transparência dos números e pela necessidade de incrementar mecanismos de controle, apesar das providências adotadas pela atual gestão.
No déficit do plano principal, por exemplo, não estão contabilizados os números do Plano de Assistência Médica Complementar, o PAC (destinado a algumas classes de dependentes), e do Plano de Assistência Médica Suplementar, o Pames (que prevê internação hospitalar em classe privativa), ambos superavitários. Também ficam de fora os resultados dos contratos com prefeituras, câmaras de vereadores e outros órgãos. Conforme dados do final de dezembro, os contratos abrangem 191.652 usuários, em um universo de 982.626 pessoas (9% da população do RS) atendidas pelo IPE Saúde.