Psicólogos e assistentes sociais em escolas

Psicólogos e assistentes sociais em escolas

Lei que prevê psicólogos e assistentes sociais em escolas não deve ser implementada no RS em 2024, avaliam especialistas 

Sancionada em janeiro, política nacional busca promover a saúde mental nas comunidades escolares

14/02/2024            SOFIA LUNGUI

 

Daniel Conzi / Agencia RBS

Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei 14.819/2024 busca promover
a saúde mental na comunidade escolar.  
Daniel Conzi / Agencia RBS


Desde 2019, a legislação brasileira exige que as escolas ofereçam serviços de Psicologia e Serviço Social. O novo desafio será a implementação da Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares, sancionada em janeiro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Lei 14.819/2024 ampliou a legislação já vigente para promover a saúde mental de alunos, professores, demais profissionais que atuam nas escolas, pais e responsáveis. 

Entre os objetivos da nova política também estão garantir o acesso da comunidade escolar à atenção psicossocial, promover a intersetorialidade entre os serviços educacionais, de saúde e assistência social, informar a sociedade sobre a importância da saúde mental nas instituições de ensino e promover a formação continuada de gestores e de profissionais. O texto menciona a divulgação de informações "cientificamente verificadas" sobre o tema.  

A execução da Política Nacional ocorrerá em articulação com o Programa Saúde na Escola (PSE) e o desenvolvimento das ações ficará a cargo dos Grupos de Trabalho Intersetoriais, com a participação obrigatória de representantes da área da saúde e da comunidade escolar.

A Lei nº 13.935, em vigor desde o final de 2019, depois de 20 anos de tramitação, já determinava a contratação de psicólogos e assistentes sociais para atuarem nas escolas. Apesar do texto estabelecer que os sistemas de ensino dispunham de um ano para tomar as providências necessárias, somente 85 municípios brasileiros regulamentaram a lei, conforme levantamento divulgado em agosto de 2023 pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP).

A pandemia de covid-19 dificultou a implantação da legislação, período em que cresceu a discussão sobre saúde mental e o papel das escolas na conscientização dos jovens a respeito da questão. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 2010 e 2020, o número de casos de depressão em crianças de 6 a 12 anos subiu de 4,5% para 8%. No mundo, 13% dos adolescentes entre 10 e 19 anos apresentam diagnóstico de algum transtorno mental.  

Novos desafios 

No Rio Grande do Sul, embora já existam iniciativas alinhadas à legislação, a política ainda não foi regulamentada. Agora, com essa ampliação, será necessário planejamento e recursos para viabilizar a proposta, segundo as entidades e especialistas ouvidos por GZH

— O Estado implementou de forma muito precária a legislação de 2019. São poucos profissionais, que atendem a uma rede muito ampla, com escolas muito distantes uma da outra. Foram definidos polos que atendem determinadas regiões, com um psicólogo responsável pelo atendimento. A lei sugere trazer psicólogos e assistentes sociais para as escolas. O processo de regulamentação é muito lento. Esperamos que, com essa nova lei, possamos avançar mais — diz Rafael Carneiro, que é presidente da Comissão de Educação do Conselho Regional de Psicologia do RS. 

A entidade enxerga a nova política como algo muito positivo, por trazer essa articulação entre três áreas que são um “tripé fundamental no âmbito da qualidade de vida das pessoas”: saúde, educação e assistência social. Segundo Rafael, já existem políticas ligadas a essas áreas nas escolas, mas elas não costumam dialogar entre si.

O Estado implementou de forma muito precária a legislação de 2019. São poucos profissionais, que atendem a uma rede muito ampla, com escolas muito distantes uma da outra.
RAFAEL CARNEIRO  Presidente da Comissão de Educação do Conselho Regional de Psicologia do RS

— O ideal é que tenhamos profissionais para atender a todo o contexto escolar, toda a comunidade, como essa lei coloca. Não podemos ter profissionais só para apagar incêndios — destaca o psicólogo. Segundo ele, a sanção da nova lei foi uma surpresa para o CRP. Ainda não havia expectativas a respeito, como o projeto estava tramitando desde 2021.  

O mesmo aconteceu com o Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do RS (Cpers), que recebeu com surpresa a notícia da sanção da lei. A entidade afirma que, para implementar a lei, o governo precisará investir cada vez mais recursos para contratar profissionais de qualidade. 

— Hoje, temos problemas nas escolas por falta de especialistas, educadores, supervisores, em termos pedagógicos. Imagina para conseguir psicólogos em cada escola? É uma política importante, que pode contribuir também com o problema do adoecimento de profissionais da educação. Mas não podemos tirar recursos da educação — diz Rosane Zan, diretora do Cpers. 

Para a professora Vilene Moehlecke, do curso de Psicologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a nova lei vai demandar investimentos da gestão pública, mas também um olhar para ações que já existem, embora sejam isoladas, muitas vezes.  

— É justamente isso que a lei propõe, pensar em soluções conjuntas. Será um trabalho coletivo, que envolve a articulação de serviços que já existem, mas também pensar em novos projetos. Tem muito trabalho pela frente, mas precisamos trabalhar em rede, para que não seja algo fragmentado. É o início de algo maior — explica. 

Conforme a pesquisadora, que já atuou em projetos com esse caráter na Secretaria de Educação de São Leopoldo, também é preciso propor iniciativas permanentes, especialmente quando se trata do combate à violência. 

— Só vamos conseguir prevenir a violência nas escolas propondo espaços de diálogo, debates e trocas entre os diferentes sujeitos que fazem parte do contexto escolar. Precisamos estimular o respeito à diversidade. Temos que envolver nos debates questões como bulliying, racismo, homofobia, discriminação — ressalta a docente. 

O que diz o poder público

A Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre informou, por meio de nota, que, no momento, atua junto à Secretaria Municipal de Saúde, e demais órgãos da administração municipal, “na construção de estratégias e ações que atendam às orientações previstas na lei”, tendo em vista o caráter intersetorial da pauta. Conforme a pasta, as ações serão realizadas em conjunto.  

Em outubro de 2023, por exemplo, foi anunciado pela prefeitura de Porto Alegre o programa Incluir+POA, iniciativa em parceria com órgãos públicos, que visa a contratação de 421 novos profissionais para atender aos mais de 3.391 alunos com deficiência intelectual matriculados na rede municipal.  

O programa possibilitou a chegada de 27 psicólogos, 16 assistentes sociais, oito fonoaudiólogos, oito psicopedagogos, cinco coordenadores e 357 agentes de Educação Inclusiva. Os profissionais dão apoio aos professores durante o contraturno nas salas de aula. Mas ainda não há previsão de ações especificamente voltadas à nova legislação. 

Em âmbito estadual, a nova lei também está sendo estudada. Serão aproveitados programas já existentes para operacionalizar e articular a Lei n° 14.819, segundo a Secretaria da Educação do RS (Seduc), vinculados ao Núcleo de Cuidado e Bem-estar Escolar. Entre eles, estão o Programa Saúde na Escola (PSE), a Equipe de Assistentes Sociais e Psicólogas e as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipave+). 

As ações do núcleo buscam garantir a promoção e sensibilização referente a indicadores positivos de saúde mental nas comunidades escolares, bem como a articulação intersetorial dos equipamentos e serviços das redes de saúde, educação e assistência social a partir de assessoramento técnico às equipes escolares e eliminar e prevenir a violência, entre outros.  

Segundo a Seduc, a promulgação da lei “é imprescindível para que as diretrizes propostas sejam implementadas, melhor investidas e continuadas nos âmbitos federal, estadual e municipal. Sobretudo, no que tange a articulação e o protagonismo coletivo das políticas da saúde, assistência social e educação”. A Seduc classifica a lei como “importante marco para que a articulação intersetorial e a comunidade escolar estejam em permanente diálogo rumo a construção de uma educação democrática, equitativa e de qualidade”. 

Ações nas escolas particulares

Conforme o Sindicato do Ensino Privado do RS (Sinepe/RS), as instituições particulares contam equipes multidisciplinares, incluindo profissionais da Psicologia, para acompanhar a saúde mental dos alunos e auxiliar em projetos de prevenção. Segundo o presidente da entidade, Oswaldo Dalpiaz, esse trabalho foi ampliado após a pandemia de covid-19.  

"As escolas estão investindo mais em projetos e programas de prevenção e de acompanhamento para minimizar os impactos que o isolamento social provocou nos últimos anos. Além de ações pontuais como palestras para pais e alunos, muitas instituições possuem programas permanentes em que oferecem espaços de escuta e diálogo aos estudantes, além de projetos de prevenção que valorizam o relacionamento interpessoal, o respeito, a diversidade" informou o presidente em nota.

Para a entidade, a nova lei vem a somar e reforçar o trabalho já existente nas escolas particulares do RS. Dalpiaz também destacou o programa "Rede de apoio em... luz, câmera, protagonismo e ação!", do Colégio Santa Clara, de Getúlio Vargas, vencedor do Prêmio Inovação Sinepe/RS 2023, que se alinha ao que propõe a Lei n° 14.819.

FONTE:

https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao/educacao-basica/noticia/2024/02/lei-que-preve-psicologos-e-assistentes-sociais-em-escolas-nao-deve-ser-implementada-no-rs-em-2024-avaliam-especialistas-clsf0ifwk00770196g62908zb.html 

 

Lei nº 13.935, de 11/12/2019

 

Vide Lei nº 14.819, de 2024

Dispõe sobre a prestação de serviços de psicologia e de serviço social nas redes públicas de educação básica.

 

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu promulgo, nos termos do parágrafo 5º do art. 66 da Constituição Federal,  a seguinte Lei: 

Art. 1º  As redes públicas de educação básica contarão com serviços de psicologia e de serviço social para atender às necessidades e prioridades definidas pelas políticas de educação, por meio de equipes multiprofissionais.

§  1º  As equipes multiprofissionais deverão desenvolver ações para a melhoria da qualidade do processo de ensino-aprendizagem, com a participação da comunidade escolar, atuando na mediação das relações sociais e institucionais.

§  2º  O trabalho da equipe multiprofissional deverá considerar o projeto político-pedagógico das redes públicas de educação básica e dos seus estabelecimentos de ensino.

Art. 2º  Os sistemas de ensino disporão de 1 (um) ano, a partir da data de publicação desta Lei, para tomar as providências necessárias ao cumprimento de suas disposições.

Art. 3º  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília, 11 de dezembro de 2019; 198o  da Independência e 131o  da República. 

JAIR MESSIAS BOLSONARO

Este texto não substitui o publicado no DOU de 12.12.2019 

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13935.htm

 

 

 

Lei nº 14.819, de 16/01/2024

(DOU de 17/1/2024)

  Institui a Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares.

 

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º  Esta Lei institui a Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares.

§ 1º A política de que trata ocaputdeste artigo constitui estratégia para a integração e a articulação permanente das áreas de educação, de assistência social e de saúde no desenvolvimento de ações de promoção, de prevenção e de atenção psicossocial no âmbito das escolas.

§ 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se integrantes da comunidade escolar:

I – alunos;

II – professores;

III – profissionais que atuam na escola;

IV – pais e responsáveis pelos alunos matriculados na escola.

Art. 2º São objetivos da Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares:

I – promover a saúde mental da comunidade escolar;

II – garantir aos integrantes da comunidade escolar o acesso à atenção psicossocial;

III – promover a intersetorialidade entre os serviços educacionais, de saúde e de assistência social para a garantia da atenção psicossocial;

IV – informar e sensibilizar a sociedade sobre a importância de cuidados psicossociais na comunidade escolar;

V – promover a formação continuada de gestores e de profissionais das áreas de educação, de saúde e de assistência social no tema da saúde mental;

VI – promover atendimento, ações e palestras direcionadas à eliminação da violência; e

VII – divulgar informações cientificamente verificadas e esclarecer informações incorretas relativas à saúde mental.

Art. 3º São diretrizes para a implementação da Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares:

I – participação da comunidade escolar e da comunidade na qual a escola está inserida;

II – abordagem multidisciplinar e intersetorialidade das ações;

III – ampla integração da comunidade escolar com as equipes de atenção primária à saúde e de serviços de proteção social do território onde a escola está inserida;

IV – garantia de oferta de serviços de atenção psicossocial para a comunidade escolar;

V – não discriminação e respeito à diversidade;

VI – participação dos alunos como sujeitos ativos no processo de construção da atenção psicossocial oferecida à comunidade escolar;

VII – exercício da cidadania e respeito aos direitos humanos;

VIII – articulação com as diretrizes da Política Nacional de Saúde Mental, por meio da rede de atenção psicossocial e da Política Nacional de Atenção Básica.

Art. 4º A execução da Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares dar-se-á em articulação com o Programa Saúde na Escola (PSE), o modelo de assistência em saúde mental, o Sistema Único de Assistência Social e a rede de atenção psicossocial, e sua governança ficará a cargo dos Grupos de Trabalho Intersetoriais do PSE, que serão responsáveis pelo desenvolvimento das ações nos territórios, com a participação obrigatória de representantes da área da saúde e da comunidade escolar.

§ 1º O regulamento desta Lei disporá sobre os requisitos do plano de trabalho a ser elaborado pelos Grupos de Trabalho Intersetoriais do PSE, de forma a promover os objetivos e as diretrizes especificados nos arts. 2º e 3º desta Lei, que conterá, no mínimo:

I – descrição das ações e das atividades a serem desenvolvidas no ano letivo, com especificação das metas de consecução;

II – estratégia de execução das ações e das atividades referidas no inciso I deste parágrafo, com previsão de equipes envolvidas em cada ação ou atividade;

III – distribuição e detalhamento de competências dos atores envolvidos na consecução do plano de trabalho.

§ 2º Ao final do ano letivo, os Grupos de Trabalho Intersetoriais do PSE apresentarão relatório com avaliação das ações previstas no plano de trabalho e dos objetivos previstos nesta Lei.

§ 3º O plano de trabalho e o relatório a que se referem os §§ 1º e 2º deste artigo serão mantidos em formato interoperável e estruturados para o uso compartilhado, com vistas à execução de políticas públicas e à prestação de serviços públicos, em consonância com as disposições daLei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018(Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).

§ 4º As escolas darão publicidade ao plano de trabalho previsto neste artigo, na forma do regulamento.

Art. 5º Caberão à União o fomento e a promoção de ações para a execução dos objetivos e das diretrizes desta Lei, bem como para subsidiar as ações dos Grupos de Trabalho Intersetoriais do PSE, na forma do regulamento.

Parágrafo único. A União deverá priorizar territórios vulneráveis e com mais dificuldade para alcançar os objetivos desta Lei.

Art. 6º A implementação da Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares dar-se-á em articulação com o disposto na Lei nº 13.935, de 11 de dezembro de 2019.

Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 

Brasília, 16 de janeiro de 2024; 203o da Independência e 136o da República.


LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA

Silvio Luiz de Almeida

Flávio Dino de Castro e Costa

Swedenberger do Nascimento Barbosa

Este texto não substitui o publicado no DOU de 17.1.2024.

FONTE:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2024/Lei/L14819.htm 




ONLINE
53