Redução salarial no STF
STF: Anamatra pede ingresso em ação que questiona Medida Provisória relativa à redução salarial e suspensão de contrato por acordo individual
ADI 6363 está sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) solicitou ingresso, na condição de Amicus Curiae, na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6363, na qual são questionados dispositivos da Medida Provisória (MP) 936/2020, que instituiu o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, tendo em vista o cenário da pandemia coronavírus (COVID-19).
A MP, entre outras medidas, permite, com o uso de acordo individual, dispor sobre redução de salário e suspensão de contrato de trabalho. Em seu pedido, a Anamatra também pugna pela procedência da ação, bem como pela suspensão da eficácia das normas e dos dispositivos impugnados, visando a assegurar a observância das normas constitucionais e garantir a salvaguarda dos direitos e conquistas históricas dos trabalhadores nesse momento de crise.
Na última segunda-feira (6), o ministro Ricardo Lewandowski, relator da ADI, deferiu em parte medida cautelar para determinar que apenas terão validade os acordos individuais de redução de jornada com redução salarial ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, se houver anuência dos sindicatos de trabalhadores em até dez dias, a partir da notificação. Caso o sindicato não se manifeste na forma e nos prazos estabelecidos na legislação trabalhista, o acordo individual estará validado. Em sua decisão, Lewandowski citou nota técnica da Anamatra e da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT).
“As críticas dessas conhecidas associações, que congregam membros de importantes categorias funcionais - juízes e procuradores do trabalho - abstraída a sua compreensível contundência - não podem deixar de ser levadas em consideração. Sim, porque as incertezas do momento vivido não podem permitir a adoção acrítica de quaisquer medidas que prometam a manutenção de empregos, ainda que bem intencionadas, sobretudo acaso vulnerem - como parecem vulnerar - o ordenamento constitucional e legal do País”.
Para a Anamatra, as previsões da MP 936/2020 subvertem a lógica do sistema constitucional de proteção ao trabalhador no atual momento de crise, precisamente quando a negociação coletiva se mostra mais necessária do que nunca, bem como afrontam a previsão constitucional da vedação ao retrocesso social.
Na visão da entidade, em que pese o país estar vivendo um momento de crise sem precedentes, o que está em discussão é a possibilidade de violação de uma norma constitucional expressa em razão desse cenário. Para a Anamatra, as normas constitucionais, sobretudo as que tratam de diretos e garantias fundamentais, não podem sucumbir nos momentos em que a preservação do equilíbrio nas relações interpessoais subjacentes são mais necessárias do que nunca.
“Deixar que os empregados hipossuficientes negociem sozinhos com os empregadores acerca da redução dos seus salários, sobretudo em um momento como esse, quer dizer, sob a ameaça de perda do emprego, implica em subverter toda a lógica da proteção que a constituição lhes assegurou a partir da diretriz do art. 7º, inciso VI. Essa mesma diretriz consta do art. 4º, da Convenção 98 e art. 5º, da Convenção 154, da OIT”, ressalta a Associação no pedido de ingresso.
Redução salarial só terá efeito se for validada por sindicatos
A mera previsão contida na MP 936 de que os acordos deverão ser
comunicados pelos empregadores ao sindicato "aparentemente não supre
a inconstitucionalidade apontada", entendeu Lewandowski.
Por César Fraga / Publicado em 7 de abril de 2020
Ministro Ricardo Lewandowski defende participação de sindicatos na aplicação da
MP 936
Foto: Nelson Jr / SCO / STF
No final da tarde da última segunda-feira, 6 de abril, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu parcialmente medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6363.
A cautelar estabelece que os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário, assim como a suspensão temporária de contrato de trabalho previstos na Medida Provisória (MP) 936/2020 somente serão válidos se os sindicatos de trabalhadores forem notificados em até 10 dias e se manifestarem sobre sua validade. Segundo a decisão de Lewandowski, que será submetida a referendo do Plenário do STF, a não manifestação do sindicato, na forma e nos prazos estabelecidos na legislação trabalhista, representará anuência com o acordo individual.
A ADI foi ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade contra dispositivos da MP 936/2020, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e introduz medidas trabalhistas complementares para enfrentar o estado de calamidade pública decorrente da pandemia do novo coronavírus. Entre elas está a possibilidade de redução salarial e a suspensão de contratos de trabalho mediante acordo individual.
No exame preliminar da ação, o ministro salienta que a celebração de acordos individuais com essa finalidade sem a participação das entidades sindicais parece afrontar direitos e garantias individuais dos trabalhadores que são cláusulas pétreas da Constituição Federal. Ele destaca que o constituinte originário estabeleceu o princípio da irredutibilidade salarial em razão de seu caráter alimentar, autorizando sua flexibilização unicamente mediante negociação coletiva.
Segundo Lewandowski, a assimetria do poder de barganha que caracteriza as negociações entre empregador e empregado permite antever que disposições legais ou contratuais que venham a reduzir o equilíbrio entre as partes da relação de trabalho “certamente, resultarão em ofensa ao princípio da dignidade da pessoa e ao postulado da valorização do trabalho humano” (artigos 1º, incisos III e IV, e 170, caput, da Constituição). “Por isso, a norma impugnada, tal como posta, a princípio, não pode subsistir”.
O ministro ressalta que, diante das graves proporções assumidas pela pandemia da Covid-19, é necessário agir com cautela, visando preservar resguardar os direitos dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, evitar retrocessos. Sua decisão, assim, tem o propósito de promover a segurança jurídica de todos os envolvidos na negociação, “especialmente necessária nesta quadra histórica tão repleta de perplexidades”.
Para Lewandowski, o afastamento dos sindicatos das negociações, com o potencial de causar sensíveis prejuízos aos trabalhadores, contraria a lógica do Direito do Trabalho, que parte da premissa da desigualdade estrutural entre os dois polos da relação laboral. Ele explica que é necessário interpretar o texto da MP segundo a Constituição Federal para que seja dada um mínimo de efetividade à comunicação a ser feita ao sindicato na negociação e com sua aprovação.