Um encontro imprecionante

Um encontro imprecionante


Um encontro imprecionante

Vasculhando as agendas públicas dos ministros do Bolsonaro, o repórter Rafael Neves notou que Abraham “imprecionante” Weintraub recebeu anteontem lobistas de um método de ensino de matemática chamado Cingapura.

O método ficou famoso nos últimos tempos por ter sido adotado por Jeff Bezos, dono da Amazon. O problema não é o método, mas as pessoas envolvidas no lobby. Weintraub apagou o nome de um deles de sua agenda oficial (por quê?), mas nós vamos contar quem são ele e sua turma.

Otávio Fakhoury.

Sábado, 15 de fevereiro de 2020

O nome pode não te dizer nada até a gente contar que Fakhoury é da turma de milicianos virtuais do governo Bolsonaro. Ele entende tanto de educação quanto Weintraub de língua portuguesa. Fakhoury é bom mesmo em outra coisa: colaborador e conselheiro editorial dum site dedicado a implementar a agenda de extrema-direita chamado Crítica Nacional, ele já foi enrolado em CPI de noticias falsas.

O Crítica Nacional é um desses emanadores de lixo da internet. Seus links povoam os grupos de zap dedicados às mamadeiras de piroca de todos os dias, como o kit gay ou a mentira sobre ONGs tacando fogo na Amazônia. Em seus delírios supremos, o Crítica Nacional defende que existe um “poderosíssimo lobby pedófilo na ONU” alimentado, claro, pela esquerda (bu).

Fakhoury é o caso já clássico de nanico gestado pelo bolsonarismo em busca de um negócio com o poder público – porque ninguém é de ferro, claro. Ele foi financiador de campanhas de bolsonaristas. Em 2018, distribuiu R$ 108 mil a gente como Bia Kicis e Luiz Philippe de Orleans e Bragança, o príncipe sem reino.

Kicis, por exemplo, poderia ser redatora do Crítica Nacional: ela espalhou um vídeo claramente falso (parecia Hermes & Renato) que mostrava três guerrilheiros com vestes militares emoldurados por uma bandeira da Colômbia. Um cosplay de paramilitares das FARC ameaçando Bolsonaro e chamam Lula de “Comandante”. Um pastiche.

Mas alguém parece ter alertado Weintraub de que ter agenda pública com Fakhoury era dar muita bandeira. De um dia pro outro, seu nome foi retirado do ar.

Só que eles esqueceram de retirá-lo da agenda de uma assessora do MEC que também participou do mesmo encontro.

Quem são os outros participantes?

Uma candidata a deputada federal pelo PSL de São Paulo chamada Naomi Yamaguchi – foi ela quem pediu a reunião.

Uma empresária chamada Sílvia Fernanda Moura de Andrade, dona de uma fábrica de cosméticos em Itapetininga, interior de São Paulo – e de uma página de extrema direita no Facebook (que surpresa) chamada Adeus PT.

E um sujeito chamado Marcus Tadeu Quarentei Cardoso, vereador em Itapetininga pelo PSDB, que na urna usou a profissão de delegado para abocanhar votos da extrema-direita.

Ninguém, como se vê, com currículo de educador.

Yamaguchi, a responsável pelo encontro, fez parte da equipe de transição do ex-ministro Ricardo Vélez, mas é formada em administração de empresas. Em um simpósio sobre escolas cívico-militares sediado na Câmara dos Deputados, em abril passado, ela disse ter conhecido o Método Cingapura em 2014 e descoberto o que o governo do país asiático “quer para os seus alunos”: a lista inclui valores como disciplina, lealdade e orgulho patriótico. A bobajada de sempre.

Não encontramos, igualmente, nenhuma qualificação educacional de Silvia Andrade ou de Marcus Tadeu. O vereador virou notícia em setembro do ano passado por outro motivo: teria autorizado cultos religiosos noturnos em um cemitério de Itapetininga sem aval da prefeitura.

Perguntamos ao MEC, via Lei de Acesso à Informação, porque o nome de Fakhoury foi retirado da agenda do ministro, qual a qualificação e a documentação entregues pelos proponentes do Método Cingapura, toda e qualquer apresentação feita por eles e a ata da reunião. Queremos saber se as pessoas que estão vendendo métodos educacionais ao governo entendem de… métodos educacionais.

Enquanto a resposta não vem, vamos deixar a imaginação preencher nossos dias em pensar que essa gente desqualificada (literalmente desqualificada) está vendendo algo que não conhece para os amigos do governo. A mamata, senhores. A mamata.

Leandro Demori
Editor Executivo

Rafael Moro Martins
Editor Contribuinte Sênior

 

The Intercept Brasil

 

 




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