Um fardo no orçamento familiar
'Educação passa a ser um fardo no orçamento familiar com a alta na inflação', avalia economista
Com a diminuição da renda, as mensalidades escolares passam a pesar mais no orçamento doméstico, e a expectativa para 2023 é de um cenário preocupante
Karla Dunder, do R7 - 25/03/2022
TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL - 07.02.2022
A inflação registrada neste primeiro trimestre teve a maior alta desde 2015, de acordo com os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta sexta-feira (25). Os gastos com alimentos, combustíveis e educação aparecem como um dos principais vilões do orçamento familiar, e as "mensalidades escolares têm se tornado um fardo", como observou André Braz, economista do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
"Neste ano de 2022, o aumento das mensalidades foi maior em comparação aos anos anteriores, mas ainda assim foi menor que os 10% do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo)", explica Braz. "No entanto, é preciso lembrar que o gasto com a educação, de acordo com o IBGE, representa 5,5% do orçamento doméstico, um comprometimento alto se comparado ao aluguel, por exemplo, que é de 3,7%."
Marcelo Neri, diretor do FGV Social, explica que o aumento das mensalidades é sazonal, ocorre no início do ano. O contrato da mensalidade leva em conta o valor da inflação do ano anterior. Com isso, os pais devem preparar o bolso para os valores em 2023.
"A expectativa inicial para a inflação deste ano era de 5%, mas, com a guerra na Ucrânia e a alta do preço do petróleo, o número saltou para 7%, e este aumento deve ser repassado para as mensalidades em 2023, um cenário preocupante para as famílias", avalia Neri.
Além do valor da mensalidade, pesa no bolso o custo com alimentação, combustível e energia elétrica. Com o aumento dos preços, o poder de compra das famílias diminuiu. "De uma maneira geral, os salários não acompanham essa dinâmica dos preços", explica Braz.
"Com a livre negociação salarial, muitas empresas nem sequer deram algum reajuste aos funcionários ou o valor foi abaixo da inflação." Na prática, o resultado é a perda do poder de compra e o empobrecimento das famílias.
Outro ponto a ser considerado, segundo o economista, é a precarização do trabalho. "Muitas pessoas perderam o emprego durante a pandemia, outras tiveram redução salarial, o que diminui ainda mais a renda familiar."
Em um cenário de crise, os pais passam a olhar o valor da mensalidade, e não a qualidade do ensino oferecido. "As famílias tendem a cortar despesas com serviços e reduzir custos", explica.
Não existe um índice específico para o cálculo das mensalidades, mas a lei 9870/99 determina que as escolas particulares comprovem qualquer tipo de reajuste. "As escolas precisam apresentar planilhas que justifiquem os seus gastos, como água, luz, aumento de salários etc.", explica o advogado Alessandro Azzoni, especialista em direito econômico.
Como observa Azzoni, as escolas dividem o valor desses gastos pelo número de alunos. "O total por aluno é dividido em 12 parcelas, o que corresponde ao valor da mensalidade."
"As escolas sabem que no atual cenário econômico, se elas aumentarem muito o valor das mensalidades, haverá perda de alunos", observa Azzoni. "Para equilibrarem o orçamento, as instituições demitem professores mais antigos e contratam outros profissionais por um salário menor ou cortam funcionários e aumentam o número de alunos por sala."
Outro caminho é a migração de alunos para uma escola mais barata ou para a pública. "Os dados mostram que a cada ano tem aumentado o número de matrículas na rede pública; a grande questão é que, com a pandemia, essas escolas tiveram uma piora significativa na qualidade de ensino, em função do fechamento prolongado e isolamento social", diz Marcelo Neri, diretor do FGV Social.
No estado de São Paulo, por exemplo, a volta às aulas deixou 4.000 crianças sem vaga na rede pública. Segundo informações da Secretaria de Educação estadual, o déficit de vagas foi causado pelo aumento súbito da demanda pela rede pública, que viu o número de vagas preenchidas por alunos matriculados saltar de 65.666, no fim do ano letivo de 2020, para 71.035, no início de 2022. Para resolver o problema, o governo paulista aumentou o número de alunos por sala — de 30 para 33.