Vigilância de professores(as) no Paraná
Na vanguarda do atraso, Paraná implantou vigilância de professores(as) anos antes de São Paulo
Observação de professores(as) foi uma das primeiras medidas de Renato Feder como secretário da Educação do Paraná
Tem causado furor nas escolas públicas de São Paulo e na imprensa nacional a determinação de que diretores(as) vigiem o trabalho de professores(as). A chamada “observação em sala de aula” foi uma das primeiras medidas do secretário da Educação de São Paulo, Renato Feder, quando trabalhou para Ratinho Junior.
Além do constrangimento causado aos(às) educadores(as), a política é responsável por mais de 300 horas de trabalho por ano letivo, sem incluir no cálculo a necessidade de dar retorno ao(à) professor(a) que foi observado(a). O critério de “acompanhar” uma aula por dia já levou, inclusive, ao afastamento de diretores(as) que não cumpriram a meta.
É o caso de Wilson Cabral de Godoy, retirado neste ano da direção do Colégio Estadual Bento Munhoz da Rocha, em Colombo, juntamente com a diretora auxiliar, Raquel Souza de Lima. Os motivos apresentados foram índices insatisfatórios de observação em sala de aula e de uso de plataformas digitais na escola.
Wilson conta que inicialmente resistiu à determinação de observar professores(as) em sala de aula, o que desagradou o Núcleo Regional de Educação. “Em junho de 2022 eu, a Raquel e a equipe pedagógica conversamos e tomamos a decisão de começar a fazer as observações. Cedemos às pressões, digamos assim”, relata.
No segundo semestre de 2022 foram feitas 120 observações em sala de aula no Colégio Estadual Bento Munhoz da Rocha, segundo Gomes. Mas o número não foi suficiente na avaliação do Núcleo Regional de Educação, que afastou a equipe apesar do excelente resultado no IDEB, que rendeu à escola um “Certificado Diamante”.
Resultados duvidosos
Não se sabe quais os resultados da observação para além de servir como instrumento de controle, coação e vigilância. Espionar professores(as) não melhorou em nada a educação no Paraná.
“Nós somos contra a observação em sala de aula porque é uma vigilância do trabalho pedagógico e não uma função de diretor(a) de escola, que tem que cuidar da gestão democrática, não pedagógica. É uma forma de controlar o(a) professor(a) e constranger a sua autonomia docente.”, afirma Margleyse dos Santos, secretária executiva Educacional da APP.
Segundo ela, nenhum diretor de escola do Paraná recebeu formação para fazer a observação em sala de aula, o que permite supor que a medida não teve objetivos pedagógicos, mas de vigilância em tempos de retrocessos e patrulhamento ideológico no governo do Paraná, aliado ao bolsonarismo.
A falta de resultados positivos da medida é atestada por educadores(as) como Aline Carissimi, doutora em educação e professora pedagoga da rede estadual do Paraná desde 2005. “Renato Feder implementou a observação com o discurso de que a prática pedagógica docente receberia um feedback qualificado sobre o trabalho em sala de aula. No entanto, essa tarefa desconsidera que a própria hora-atividade é o mecanismo de suporte ao trabalho docente e ao planejamento”, afirma.
Aline explica que as professoras pedagogas são as articuladoras da organização da hora-atividade, prestando todo os subsídios necessários para a melhoria da prática pedagógica, voltadas para metodologias, didática, gestão da sala de aula e avaliação da aprendizagem.
“É um engodo implementar um mecanismo de observação da sala de aula em detrimento de uma formação continuada sólida e da valorização profissional com vistas ao cumprimento de uma hora atividade de acordo com a lei nacional, a partir da hora-aula”, diz Aline.
Ao invés de cumprir a lei, o governo optou por inventar a observação, conclui a educadora: “ao implantar a observação de sala de aula a premissa do governo sempre foi a vigilância da prática educacional e o cerceamento da cátedra docente”.
Denúncia e repúdio
A APP denuncia desde 2019 o erro de impor a observação de professores em sala de aula. Em outubro daquele ano o Sindicato divulgou nota de repúdio contra uma então nova prática da gestão do empresário Renato Feder na Secretaria da Educação, o Protocolo de Observação de Aula.
“É necessário um basta a esta política de vigilância e controle, é inadmissível constranger as direções de escola, professores(as) e pedagogos(as) e reduzir o processo educacional a observações em salas de aula com planilhas superficiais e rasas”, diz a nota.
Para o Sindicato, além de determinar aos(às) pedagogos(as) uma função que não faz parte de suas atribuições, essa iniciativa buscava, já naquele momento, responsabilizar os(as) professores(as) e desviar a atenção para a falta de valorização dos(as) profissionais e de investimentos na educação.
“A educação do Paraná não cabe nesta e em outras planilhas absurdas com a finalidade de desacatar a autonomia dos profissionais da educação. A educação do Paraná precisa de respeito, investimentos, formação continuada, estrutura tecnológica e humanidade”, completa a nota.
Manifesto
Três anos depois da denúncia feita em 2019, em um Seminário Pedagógico realizado em 2022, a APP construiu um documento reafirmando o direito dos(as) educadores(as) a uma organização pedagógica democrática e autônoma.
O manifesto de 2022 reivindica a suspensão das atividades de planilhamento educacional, assim como as exigências de controle sobre as(os) professoras(es) como observação de sala de aula e controle da hora atividade.
“Queremos resgatar a autonomia do trabalho docente e da equipe pedagógica (…) Nossas escolas possuem professoras(es) e pedagogas(os) altamente capacitadas(os) para realizar o acompanhamento pedagógico que produz aprendizagens significativas. Vamos lutar e resistir contra práticas que visem à vigilância, sujeição, dependência e burocracia sem o exercício crítico da realidade e do conhecimento. Exigimos o fim da vigilância e das tutorias”, diz o manifesto de maio de 2022.
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